segunda-feira, 15 de abril de 2013

O FIM DO MARANHÃO


(Para não esquecer Jackson Lago e o Golpe de 17 de Abril de 2009)

por Raimundo Palhano

Já era a madrugada do dia seguinte à cassação e o sono me faltava. Sendo abril, o vento permanecia escasso. Havia desconforto fora e dentro dos meus pensamentos. As imagens da dura realidade não me abandonavam. Vi-me em São Paulo, diante da internet, buscando notícias sobre a posse de Rosa, a nova governadora.

Na medida em que as lembranças me vinham chegando era como se estivessem me transportando em um túnel do tempo, a um lugar que me apavorava. Vi fantasmas saindo do sepulcro e dândis impecáveis surgindo entre os poros do tempo para celebrar o retorno da princesa.

Mais perplexo fiquei ao tomar conhecimento dos seus dois primeiros atos administrativos: o primeiro, mudando em definitivo o nome do Maranhão para Marderosas, lei esta que já havia sido promulgada em 1966 pelo Chefe do Clã; e o segundo, retirando do seu próprio nome o gentílico Alexei.

Rosa, a guerreira, vinha de fato predestinada a decretar o fim do Estado da Mentira e extirpar do seu próprio nome o que soava falso e duvidoso. Com sua espada invencível, forjada em um sem número de batalhas espetaculares, como anunciavam as suas trombetas, e usando uma nova máscara de zorro, de um só golpe, decretava a morte de uma província que já não prestava para nada e instituía o seu próprio reinado, procurando convencer aos súditos que dispensara a proteção do Rei, pai e guardião de toda hora, então sob fogo cerrado e fortíssimos ataques da mídia nacional.

        Para alguém como eu, que havia retirado um órgão precioso do corpo e estava ali na paulicéia para ver se os outros estavam em ordem, ler aquelas notícias foi como levar mais um soco no estômago, agora muito mais dolorido, pois ainda estava com as marcas vivas das costuras cirúrgicas.

Na cabeça de Rosa a solução dos problemas maranhenses finalmente estava dada: apeado do trono JL, ficara mais fácil decretar, agora para valer, o fim do Maranhão, pondo em seu lugar Marderosas.

Vi aparecerem em minha frente aqueles bonecões da Rosailude, muito usados pelo movimento balaiada em seus atos de protesto e vigília cívica em frente ao palácio do governo, durante o processo de julgamento de JL pelo Tribunal Superior Eleitoral de Brasília.

        Levantei-me da cama às quatro da madrugada e fui à janela. As ruas que me saltavam aos olhos estavam desertas, preenchidas apenas pelos silenciosos motores dos poucos veículos insones que cruzavam suas artérias. Do sexto andar do meu prédio ouvia a ritmada cadência da maré e notava as luzes apagadas dos edifícios do bairro.

Vendo aquele cenário cheguei mesmo a admitir que o Maranhão havia acabado e que eu estava realmente em Marderosas: tudo parecia falsamente harmonioso, o silêncio sem alarme e alma, as linhas de uma arquitetura cristalizada ou em decomposição.

Aos poucos fui percebendo que o cansaço físico estava me deixando fora do contexto. Precisava imediatamente de um travesseiro para dormir o pouco da noite que ainda restava. Fechei os olhos e com medo de novos pesadelos e da escuridão, adormeci por quatro anos.