sexta-feira, 11 de agosto de 2017

EDUCAÇÃO É UM ECOSSISTEMA CULTURAL

NANOTESES 1

Por Raimundo Palhano


        Embora muitos saibam que a responsabilidade com o desenvolvimento da educação na sociedade brasileira cabe a três segmentos sociais estratégicos, no caso o governo, a escola e a família, volta e meia estão culpando os governos pelo fracasso educacional e deixando incólumes os outros corresponsáveis pelo processo.


        Não é que estejamos atenuando ou mesmo eximindo e retirando as responsabilidades e o peso do poder público com a efetividade das políticas públicas educacionais. Começamos desse modo porque entendemos que ajuda a compreender melhor que a educação é um ecossistema cultural intimamente ligado com o desempenho dos governantes, dos educadores e, seguramente, com a atuação dos pais ou responsáveis familiares.


        Não se trata de frase pronta ou a recorrência a um senso comum, que muitos entendidos verbalizam à exaustão. Trata-se de uma assertiva que tem a ver, inexoravelmente, com uma estratégia pedagógica que possui altíssimo grau de comprovação e eficiência operacional. Basta ver o resultado em muitos países de educação desenvolvida, em que a base de tudo está no aprofundamento das ligações orgânicas entre os três pilares acima referidos e dentro de cada um deles, em especial.


        Fugindo do eminentemente retórico, no Brasil e nos estados de um modo geral, ainda não conseguimos integrar e harmonizar os vínculos que enlaçariam a tríade pedagógica aludida, em um sentido único, pela assimilação da ideia de que a educação é para a vida, fundamental para romper o estado de fracasso que impera no país, em favor do emergir de um desejado estágio de aprendência, sobretudo na educação básica e, mais ainda, na educação básica municipal.


        Com efeito, a qualidade da educação depende de pelo menos dois outros fatores: recursos financeiros e infraestrutura física e material. Além da tríade descrita acima, esses outros componentes são insubstituíveis.


        O principal problema não é disponibilidade de finanças. É importante elevar o percentual de investimento em educação comparativamente ao tamanho do PIB. Se, no entanto, o montante de dinheiro não for aplicado no lugar certo, o maior volume de moeda só interessa às corporações mercantis que “cercam” as verbas da educação e que, em geral, ficam com boa parte dos recursos disponíveis. Defendemos que se reveja o modelo do Fundeb. A pulverização de recursos é uma faca de dois gumes. Se o município for fraco e o sistema de educação incapacitado, as corporações mercantis partem para controlar o Fundo, que em muitos lugares e maior que o FPM e se encontram “privatizados”.


        Creio que o maior desafio é instituir um sistema de educação em que governos, escolas e famílias assumam papéis corretos e concretos no planejamento e gestão da educação das crianças e jovens do Brasil inteiro. Para isso acontecer, a desigualdade social representa uma ameaça poderosa.


         É essencial substituir a atual governança, em que o governo determina e domina de forma vertical, por uma outra, horizontal, em que os três componentes estratégicos do processo educacional desenvolvam competências para elevar a qualidade educacional.


        A escola tem um papel primordial. É o lugar no qual se constrói a educação formal, culta, técnica e versátil, capaz de promover competências e cidadanias. A família é a comunidade de afetos, de respeito aos legados individuais e familiais, o espaço das heranças históricas, de convivência pessoal e fortalecimento de vínculos humanos.


       O que se vê hoje é um profundo despreparo das famílias, tanto das ancestrais, como das provenientes das novas gerações, em geral extremamente incapacitadas para o trabalho educacional dos filhos e filhas.


        A influência do domínio vertical de muitos governos leva o poder público a investir em projetos puramente midiáticos, sem a menor capacidade de mudar a estrutura educacional vigente. Chegará um tempo em que será proibido fazer propaganda de políticas públicas de estado, sob pena de responsabilidade penal para que fizer propaganda enganosa.


        Por outro lado, escolas faz-de-conta são muitas nesse mundo afora e no Brasil horrorizam. Verdadeiros depósitos de crianças, esses são lugares em que se oficializa o desperdício e se queimam dinheiros à vista de todos. Escola é um mix envolvendo infraestrutura e projeto pedagógico. Um ou outro sozinhos também não dão conta do problema. Não esquecer que educação é sistema.


        Síntese de tudo: a horizontalização na produção, circulação e distribuição dos atributos e conteúdos educacionais, construídos e desenvolvidos numa perspectiva ecossistêmica e cultural, é que, em última análise, fornecerão as bases materiais e culturais para a superação das estruturas educacionais atrasadas que inviabilizam o Brasil como uma civilização bem sucedida no mundo, abrindo caminhos efetivos para o fim das desigualdades sociais, as quais, até agora, permanecem invencíveis.