por Raimundo Palhano
Foi com muito entusiasmo e alegria que tomei conhecimento da decisão do Tribunal Superior Eleitoral de Brasília, proferida 30 de setembro passado, julgando improcedente o recurso que pretendia impugnar a candidatura do Dr Jackson Lago ao governo do Maranhão, impedindo que concorresse nas eleições do dia 3 de outubro próximo, com base na Lei da Ficha Suja.
A boa nova certamente aumentou a esquizofrenia dos que atualmente ocupam o Palácio dos Leões, mas, sobretudo teve um sentido restaurativo, ao refazer a tessitura biográfica de um dos mais dignos homens públicos da história política do Maranhão.
Havia na sociedade maranhense o temor de que o TSE repetisse a insanidade cometida em abril de 2009, quando retirou o mandato legitimamente conquistado por Jackson, com base em uma engenharia jurídica que muitos especialistas preferiram denominar de golpe pela via judicial.
Com a decisão, aquele Tribunal repara o primeiro dos dois danos impingidos ao ex-governador: o primeiro, que manchou a sua imagem pública com a pecha de “Ficha Suja” e o segundo, que deverá ser restaurado no segundo turno das eleições de outubro, que cassou o seu mandato de governador legitimamente eleito pelo povo do Maranhão.
Os Tribunais Superiores precisam estar cada vez mais onde a vida acontece, para que possam ajudar na construção de um mundo sem chaves, grades e algemas, conforme repete sempre a sabedoria popular. Por não estarem em sintonia com esses princípios, muitos magistrados não colocam a dignidade humana como uma das prioridades da vida. Só assim se explica a tentativa de sujarem uma das mais dignas personalidades deste Estado.
Defendo, como muitos, a idéia de que caberá à cidadania ativa e consciente do Maranhão fazer a segunda restauração dos danos causados ao ex-governador, justamente retornando-lhe o mandato injustamente tomado em abril de 2009. Sei que o tempo é curto para uma campanha como esta, mas não custa lutar com toda a garra do mundo.
Sinto que o processo eleitoral em curso tende a se agudizar nos próximos dias e horas, à medida em que as eleições vão se aproximando. Não se pode desperdiçar mais esta oportunidade de mudar as estruturas arcaicas da política e de suas instituições, focando plenamente as questões educacionais e econômicas. Reconheço que não foram suficientemente abordadas pelos postulantes, mas boa parte de nós sabe realmente quem reúne as melhores condições éticas e de coerência pessoal para levá-las a cabo no contexto da atual encruzilhada histórica maranhense.
Percebo que cada vez mais fica difícil o trabalho dos marqueteiros, justamente porque conseguiram despolitizar a política e, com isso, as “mercadorias” que buscam vender aos eleitores perdem a validade cedo, ou pela fadiga do poder ou por inexistência de talento pessoal. O jornalista Daniel Mendes desenvolveu uma boa tese sobre isso.
Esta circunstância, ainda que trágica, pode também ser vista como uma oportunidade de acelerar mudanças. O caso maranhense é típico na recorrência deste fenômeno. Não há renovação de quadros políticos e a política virou um picadeiro para exibicionistas e oportunistas. Reinventar e por ética na política passa a ser o maior dos desafios da sociedade inclusiva. Uma escolha consciente em outubro poderá colocar nos cargos do executivo e do legislativo uma camada dirigente com melhores condições de operar mudanças.
O Maranhão está vivendo, com toda certeza, uma transição, ainda que silenciosa para muitos. Não falo inspirando-me em quaisquer dessas fantasias ilusionistas que cairão dos céus ou de Brasília: refinaria, petróleo, gás natural, estrada de ferro e o que mais couber no saco de presentes.
Refiro-me à redescoberta do próprio torrão maranhense, que está deixando de ser visto apenas pelas lentes angulares de São Luís e começa a ser percebido como uma totalidade territorial complexa, projetando um interior cada vez mais consciente do seu peso para o desenvolvimento do Estado, e uma cultura de raiz que procede das suas entranhas, esquecidos e desprezados por décadas e que agora despertam e passam a incomodar.
A sonhada mudança política aqui tratada passará com certeza pelo enfrentamento dessa questão. Não é por outra razão o peso estratégico hoje atribuído à Região Tocantina, por exemplo. A velha política praticada pelas oligarquias de “apagar” os municípios já não se sustenta mais.
Por tudo isso, creio que a restauração ética, pessoal e pública, de Jackson Lago deve ser entendida como a vitória da dignidade na política, sobretudo na atual conjuntura vivida pelo país e pelo Maranhão, quando o voto consciente, que deveria se materializar na esfera pública é transformado, de forma grotesca, em arrastões puxados por trios elétricos.
sábado, 2 de outubro de 2010
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
MIRANTE DO DEBATE
por Raimundo Palhano
Confesso que valeu a pena assistir ao debate promovido pela televisão Mirante/Rede Globo com os cinco mais fortes candidatos ao governo do Estado do Maranhão.
O cenário desolador da atual campanha política no Maranhão, marcada de forma grotesca pelo flagrante abuso de poder das oligarquias, pelo baixo nível dos candidatos, pelo hereditarismo na oferta de candidaturas e pelas afrontas à democracia e à esfera política, indicavam um final melancólico para o referido processo eleitoral.
Grata foi a surpresa da noite de ontem, ao brindar o eleitorado maranhense, tão espezinhado pelos políticos profissionais, com um debate televisivo corajoso e provocador, quando os candidatos apresentaram de forma lúcida as suas propostas para tirar o Maranhão do extravio.
Pudemos assistir a um Marcos Silva sereno e amadurecido, com amplo domínio dos indicadores sociais e econômicos maranhenses, argumentando de forma irrefutável sobre as causas que levaram o Maranhão a aprofundar suas desigualdades e ao mesmo tempo apresentando propostas para mudar radicalmente o atual modelo de governo, segundo ele ( e muitos de nós) principal responsável pelo quadro de pobreza que atinge a maioria do povo deste Estado.
Viu-se o desempenho surpreendente do jovem candidato Saulo Arcangeli, com certeza um quadro promissor para a carcomida política maranhense, exuberante em seus arroubos revolucionários e na crítica direta aos erros cruciais cometidos pela oligarquia no presente e no passado. Não é relevante agora criticá-lo pelo erro estratégico de ter mirado sua artilharia em todas as direções, inclusive em alvos equivocados, pois o destemor e a coragem com que se posicionou no evento deram a ele um peso marcante no processo de evidenciar as fortalezas e os artificialismos de cada um e cada uma dos candidatos participantes.
Flávio Dino mostrou-se mais sereno e despojado de certos ares que davam a ele, em ocasiões semelhantes, uma atmosfera de arrogância e superioridade intelectual, potencializando ao máximo sua capacidade reconhecida de lidar bem com o discurso e com as idéias. A forma dura e direta com que criticou o governo no trono denota o emergir de um ator mais ousado em sua crítica aos donos do poder no Maranhão, o que era insistentemente cobrado por setores da oposição. Ao superar posicionamentos públicos anteriores, nos quais afirmava que dar nomes aos oligarcas não era importante e sim combater as práticas oligárquicas, no debate Dino se superou e deu, com toda a ênfase, os nomes dos que comandam a oligarquia maranhenses.
E por último, que beleza reencontrar o missionário Dr. Jackson Lago, profeta calejado pelas lutas para libertar este Estado, ali firme e decidido, coração e mente pulsando fortes, oferecendo-se generosamente, mais uma vez, ao povo deste Estado para concluir a sua obra injustamente interrompida, vítima que foi de um golpe pela via judicial, condenado por um crime que hoje, pela intensidade com que é praticado aqui e no país, não deixa dúvida sobre a sua brutalidade.
Claro que o debate entre os postulantes ao governo não se limitou apenas ao que esta sendo apreciado. Procurei ater-me ao que considero relevante para o bem comum do povo maranhense e para o nosso desenvolvimento social e político.
Julgo firmemente que o debate televisivo deste final de campanha, a despeito dos céticos, dos pessimistas, das limitações dos candidatos, da falta de substância em muitas questões e da rigidez das suas regras, pela primeira vez, deixou explícita, com base na veemência analítica dos quatro candidatos, o apodrecimento e a repulsa ao sistema de poder que governa o Estado, comprovado pelo gigantismo sem precedentes da campanha eleitoral desses grupos, que buscam desesperadamente continuar dominando a política maranhense.
Por fim, para que o debate realmente venha a ser esse marco divisor na história política deste Estado, dependerá dos eleitores maranhenses, que farão as suas escolhas no próximo dia 3 de outubro. O debate em si, obviamente, não terá força suficiente para definir o resultado das eleições. Deve ser visto como expressão do amadurecimento da vontade coletiva de mudar o Maranhão, o seu sistema político, promover a alternância de poder, romper com métodos atrasados e condenáveis de gestão pública. Claro que tudo isso não é fácil de ocorrer e muito menos de fazer de uma hora para outra.
Não tenho a menor dúvida, todavia, de que o debate contribuiu para engrossar a marcha dos inconformados, que deverão caminhar unidos empunhando a bandeira da libertação do nosso Estado. Disposição esta, aliás, muito bem sinalizada pelas lideranças políticas que enriqueceram o debate na televisão.
Confesso que valeu a pena assistir ao debate promovido pela televisão Mirante/Rede Globo com os cinco mais fortes candidatos ao governo do Estado do Maranhão.
O cenário desolador da atual campanha política no Maranhão, marcada de forma grotesca pelo flagrante abuso de poder das oligarquias, pelo baixo nível dos candidatos, pelo hereditarismo na oferta de candidaturas e pelas afrontas à democracia e à esfera política, indicavam um final melancólico para o referido processo eleitoral.
Grata foi a surpresa da noite de ontem, ao brindar o eleitorado maranhense, tão espezinhado pelos políticos profissionais, com um debate televisivo corajoso e provocador, quando os candidatos apresentaram de forma lúcida as suas propostas para tirar o Maranhão do extravio.
Pudemos assistir a um Marcos Silva sereno e amadurecido, com amplo domínio dos indicadores sociais e econômicos maranhenses, argumentando de forma irrefutável sobre as causas que levaram o Maranhão a aprofundar suas desigualdades e ao mesmo tempo apresentando propostas para mudar radicalmente o atual modelo de governo, segundo ele ( e muitos de nós) principal responsável pelo quadro de pobreza que atinge a maioria do povo deste Estado.
Viu-se o desempenho surpreendente do jovem candidato Saulo Arcangeli, com certeza um quadro promissor para a carcomida política maranhense, exuberante em seus arroubos revolucionários e na crítica direta aos erros cruciais cometidos pela oligarquia no presente e no passado. Não é relevante agora criticá-lo pelo erro estratégico de ter mirado sua artilharia em todas as direções, inclusive em alvos equivocados, pois o destemor e a coragem com que se posicionou no evento deram a ele um peso marcante no processo de evidenciar as fortalezas e os artificialismos de cada um e cada uma dos candidatos participantes.
Flávio Dino mostrou-se mais sereno e despojado de certos ares que davam a ele, em ocasiões semelhantes, uma atmosfera de arrogância e superioridade intelectual, potencializando ao máximo sua capacidade reconhecida de lidar bem com o discurso e com as idéias. A forma dura e direta com que criticou o governo no trono denota o emergir de um ator mais ousado em sua crítica aos donos do poder no Maranhão, o que era insistentemente cobrado por setores da oposição. Ao superar posicionamentos públicos anteriores, nos quais afirmava que dar nomes aos oligarcas não era importante e sim combater as práticas oligárquicas, no debate Dino se superou e deu, com toda a ênfase, os nomes dos que comandam a oligarquia maranhenses.
E por último, que beleza reencontrar o missionário Dr. Jackson Lago, profeta calejado pelas lutas para libertar este Estado, ali firme e decidido, coração e mente pulsando fortes, oferecendo-se generosamente, mais uma vez, ao povo deste Estado para concluir a sua obra injustamente interrompida, vítima que foi de um golpe pela via judicial, condenado por um crime que hoje, pela intensidade com que é praticado aqui e no país, não deixa dúvida sobre a sua brutalidade.
Claro que o debate entre os postulantes ao governo não se limitou apenas ao que esta sendo apreciado. Procurei ater-me ao que considero relevante para o bem comum do povo maranhense e para o nosso desenvolvimento social e político.
Julgo firmemente que o debate televisivo deste final de campanha, a despeito dos céticos, dos pessimistas, das limitações dos candidatos, da falta de substância em muitas questões e da rigidez das suas regras, pela primeira vez, deixou explícita, com base na veemência analítica dos quatro candidatos, o apodrecimento e a repulsa ao sistema de poder que governa o Estado, comprovado pelo gigantismo sem precedentes da campanha eleitoral desses grupos, que buscam desesperadamente continuar dominando a política maranhense.
Por fim, para que o debate realmente venha a ser esse marco divisor na história política deste Estado, dependerá dos eleitores maranhenses, que farão as suas escolhas no próximo dia 3 de outubro. O debate em si, obviamente, não terá força suficiente para definir o resultado das eleições. Deve ser visto como expressão do amadurecimento da vontade coletiva de mudar o Maranhão, o seu sistema político, promover a alternância de poder, romper com métodos atrasados e condenáveis de gestão pública. Claro que tudo isso não é fácil de ocorrer e muito menos de fazer de uma hora para outra.
Não tenho a menor dúvida, todavia, de que o debate contribuiu para engrossar a marcha dos inconformados, que deverão caminhar unidos empunhando a bandeira da libertação do nosso Estado. Disposição esta, aliás, muito bem sinalizada pelas lideranças políticas que enriqueceram o debate na televisão.
domingo, 12 de setembro de 2010
MARANHÃO DEMOCRÁTICO
por Raimundo Palhano
Esta é a primeira das doze macro-diretrizes do novo plano de desenvolvimento para o Maranhão do candidato Jackson Lago ao governo estadual, que teve o seu mandato interrompido em abril de 2009 por força de um golpe judicial, arquitetado pela oligarquia e grupos de interesse que em torno dela gravitam.
Retomar o governo tendo como premissa essencial a democratização da sociedade maranhense, em todas as sua esferas, é uma conquista inadiável, mesmo se sabendo tratar-se de uma opção extremamente ousada, pois voltada ao enfrentamento do maior dos desafios políticos do Maranhão: reacender na população a crença em futuro no qual a equidade seja possível e a convicção de que o fundamento concreto da política deverá ser a conquista do bem comum do povo.
Democracia e república continuam sendo miragens no contexto social e político maranhense. No Brasil a república foi implantada de modo artificial, vinda de um sistema imperial centralista, o qual produziu um federalismo surrealista, flagrantemente centrífugo. No torrão maranhense a construção democrática e da república nem artificialmente se instituíram, pois os institutos formais de suas existências continuam letras mortas, sepultadas em sarcófagos de barro, enterrados em palácios e castelos medievais.
Como agir, estando no comando de um governo democrático, para que a sociedade inclusiva volte a acreditar na sua força e na sua capacidade de romper todos os grilhões e amarras que, por anos a fio, comprometeram sua liberdade e seus sonhos? Como criar uma nova mística social, em contextos como o maranhense, determinados por falsas verdades, na qual o povo acredite e sinta verdadeiramente que valerá a pena ter amanhecido?
Enquanto obra da filosofia e da engenharia política, a democracia continua sendo a mais desafiadora das utopias humanas, principalmente na era atual, marcada pela quebra de paradigmas e princípios que valorizavam a vida social e o sistema político.
Permanece atual porque lida com uma das questões mais difíceis, que é justamente como tornar real as crenças democráticas que informam a idéia de justiça, equidade e bem comum do povo, pilares da idéia republicana.
Olhando-se atualmente o trono, a espada e o altar, para não falar da cornucópia, vê-se o quanto são impermeáveis à vivenciação democrática, permanecendo ainda, cada um com suas latitudes e especificidades, bem distantes da interferência direta da grande maioria da população.
A presença da democracia no contexto maranhense ainda representa uma aspiração distante. É o Estado brasileiro que está no extravio há muito tempo. O próprio nome Maranhão em si mesmo já é insólito. Foi dado à capitania de João de Barros e Fernão Álvares de Andrade, iniciada no século XVII. César Marques afirmava que provinha de um nome indígena e significa brigar e correr. “Uma briga das águas correndo”. O arguto e provocador Antonio Vieira preferiu traduzir o termo como falsificação, uma grande mentira, sobretudo influenciado pelo que presenciou na vida social e política da colônia, durante o período em que aqui esteve.
O certo é que o torrão padece de uma espécie de síndrome do atraso, a ponto de ainda hoje continuar sob o manto de donatários, a despeito dos avanços materiais e da modernização induzida pelo movimento de expansão capitalista em seu território. Se no Brasil a supremacia da Constituição é fracamente reconhecida e a soberania popular muito menos ainda, no Maranhão são termos inexistentes na linha do tempo.
Vive-se ainda uma espécie de era das trevas neo-medieval, na qual se misturam formas feudais de organização política, pré-capitalistas de produção, imperiais e plutocráticas de governo, sob o domínio de um sistema oligárquico travestido de modernizador e salvacionista, que se reproduz pelas vinculações orgânicas com os grupos políticos dominantes no país e com os grandes projetos econômicos do moderno capitalismo brasileiro e internacional. A atual campanha eleitoral, que se assiste diariamente nos municípios, na capital e na mídia, é a prova mais eloqüente deste quadro de absurdos inimagináveis.
A realidade internacional aponta que há uma nova situação em curso em que o poder de fazer a política escapa cada vez mais dos políticos, da cidadania e do Estado. Quem faz a grande política hoje são as empresas, sobretudo as empresas grandes, as que atuam no mundo globalizado. O poder oligárquico é forte e duradouro no Maranhão porque sempre permaneceu atrelado aos grupos de interesse dominantes no país, os quais não se insurgem contra as determinações desta nova ordem de coisas.
Por estes motivos o Maranhão tem sido caricatura e esqueleto de formas e conteúdos produzidos em porões de laboratórios que impõem sobre este contexto modos de vida e modos de ser que não mudam qualitativamente a realidade social e humana.
A continuidade desta trama é garantida pela presença de um poder público que engendra políticas públicas em favor dos grupos de interesse aliados seus, colocando em último plano aquelas que poderiam realmente libertar o povo das carências e necessidades básicas.
O descaso histórico com a política de educação pública, sempre em situação crítica de desempenho, reforça a estratégia de dominação. Florestan Fernandes dizia que feita a revolução nas escolas, mais fácil seria fazê-la nas ruas.
Para a democratização da sociedade brasileira, e da maranhense em particular, o Estado é indispensável. O grande Saramago, um dos mais brilhantes homens da cultura lusófona, dizia, em tom jocoso e, ao mesmo tempo, profundamente sério que tudo se discute neste mundo. Só uma coisa, dizia, não se discute para valer: a democracia.
No Maranhão, pode-se dizer, nos últimos cinqüenta anos, um dos raros políticos que não só discutiu, mas levou a sério a democracia foi Jackson Lago, tanto em suas três gestões à frente da Prefeitura Municipal de São Luís, como durante o período do governo interrompido, quando chefe do executivo estadual.
Ficará para a história do povo maranhense a experiência interrompida dos fóruns do governo com a sociedade civil e movimentos sociais. Em tais ocasiões, o comandante do governo, completamente despojado de seus aparatos institucionais, se colocava como parceiro dos movimentos sociais das várias regiões maranhenses para diagnosticarem e programarem ações voltadas à melhoria das condições e da qualidade de vida do povo.
A estratégia de construção do Maranhão Democrático como política pública de estado fundamenta-se no fortalecimento e ampliação dos mecanismos de democracia direta e participativa; no fortalecimento e aperfeiçoamento da democracia representativa e na reestruturação dos órgãos e instituições do Estado para o desenvolvimento sustentável e em escala humana.
O maior dos crimes perpetrado no Brasil, sem a menor dúvida, foi o instituto da escravidão. No Maranhão a grande maioria do povo ainda permanece escravizada, pois privada de condições materiais de sobrevivência dignas e, sobretudo do maior de todos os bens: a liberdade de sonhar e realizar uma vida plena. Pena que o processo eleitoral aí instalado se baseie na substituição da política pelo circo, tornando mais difícil retirar as vendas que impedem o povo de enxergar com clareza as forças que lutam a seu favor, daquelas que querem o seu eterno cativeiro.
Esta é a primeira das doze macro-diretrizes do novo plano de desenvolvimento para o Maranhão do candidato Jackson Lago ao governo estadual, que teve o seu mandato interrompido em abril de 2009 por força de um golpe judicial, arquitetado pela oligarquia e grupos de interesse que em torno dela gravitam.
Retomar o governo tendo como premissa essencial a democratização da sociedade maranhense, em todas as sua esferas, é uma conquista inadiável, mesmo se sabendo tratar-se de uma opção extremamente ousada, pois voltada ao enfrentamento do maior dos desafios políticos do Maranhão: reacender na população a crença em futuro no qual a equidade seja possível e a convicção de que o fundamento concreto da política deverá ser a conquista do bem comum do povo.
Democracia e república continuam sendo miragens no contexto social e político maranhense. No Brasil a república foi implantada de modo artificial, vinda de um sistema imperial centralista, o qual produziu um federalismo surrealista, flagrantemente centrífugo. No torrão maranhense a construção democrática e da república nem artificialmente se instituíram, pois os institutos formais de suas existências continuam letras mortas, sepultadas em sarcófagos de barro, enterrados em palácios e castelos medievais.
Como agir, estando no comando de um governo democrático, para que a sociedade inclusiva volte a acreditar na sua força e na sua capacidade de romper todos os grilhões e amarras que, por anos a fio, comprometeram sua liberdade e seus sonhos? Como criar uma nova mística social, em contextos como o maranhense, determinados por falsas verdades, na qual o povo acredite e sinta verdadeiramente que valerá a pena ter amanhecido?
Enquanto obra da filosofia e da engenharia política, a democracia continua sendo a mais desafiadora das utopias humanas, principalmente na era atual, marcada pela quebra de paradigmas e princípios que valorizavam a vida social e o sistema político.
Permanece atual porque lida com uma das questões mais difíceis, que é justamente como tornar real as crenças democráticas que informam a idéia de justiça, equidade e bem comum do povo, pilares da idéia republicana.
Olhando-se atualmente o trono, a espada e o altar, para não falar da cornucópia, vê-se o quanto são impermeáveis à vivenciação democrática, permanecendo ainda, cada um com suas latitudes e especificidades, bem distantes da interferência direta da grande maioria da população.
A presença da democracia no contexto maranhense ainda representa uma aspiração distante. É o Estado brasileiro que está no extravio há muito tempo. O próprio nome Maranhão em si mesmo já é insólito. Foi dado à capitania de João de Barros e Fernão Álvares de Andrade, iniciada no século XVII. César Marques afirmava que provinha de um nome indígena e significa brigar e correr. “Uma briga das águas correndo”. O arguto e provocador Antonio Vieira preferiu traduzir o termo como falsificação, uma grande mentira, sobretudo influenciado pelo que presenciou na vida social e política da colônia, durante o período em que aqui esteve.
O certo é que o torrão padece de uma espécie de síndrome do atraso, a ponto de ainda hoje continuar sob o manto de donatários, a despeito dos avanços materiais e da modernização induzida pelo movimento de expansão capitalista em seu território. Se no Brasil a supremacia da Constituição é fracamente reconhecida e a soberania popular muito menos ainda, no Maranhão são termos inexistentes na linha do tempo.
Vive-se ainda uma espécie de era das trevas neo-medieval, na qual se misturam formas feudais de organização política, pré-capitalistas de produção, imperiais e plutocráticas de governo, sob o domínio de um sistema oligárquico travestido de modernizador e salvacionista, que se reproduz pelas vinculações orgânicas com os grupos políticos dominantes no país e com os grandes projetos econômicos do moderno capitalismo brasileiro e internacional. A atual campanha eleitoral, que se assiste diariamente nos municípios, na capital e na mídia, é a prova mais eloqüente deste quadro de absurdos inimagináveis.
A realidade internacional aponta que há uma nova situação em curso em que o poder de fazer a política escapa cada vez mais dos políticos, da cidadania e do Estado. Quem faz a grande política hoje são as empresas, sobretudo as empresas grandes, as que atuam no mundo globalizado. O poder oligárquico é forte e duradouro no Maranhão porque sempre permaneceu atrelado aos grupos de interesse dominantes no país, os quais não se insurgem contra as determinações desta nova ordem de coisas.
Por estes motivos o Maranhão tem sido caricatura e esqueleto de formas e conteúdos produzidos em porões de laboratórios que impõem sobre este contexto modos de vida e modos de ser que não mudam qualitativamente a realidade social e humana.
A continuidade desta trama é garantida pela presença de um poder público que engendra políticas públicas em favor dos grupos de interesse aliados seus, colocando em último plano aquelas que poderiam realmente libertar o povo das carências e necessidades básicas.
O descaso histórico com a política de educação pública, sempre em situação crítica de desempenho, reforça a estratégia de dominação. Florestan Fernandes dizia que feita a revolução nas escolas, mais fácil seria fazê-la nas ruas.
Para a democratização da sociedade brasileira, e da maranhense em particular, o Estado é indispensável. O grande Saramago, um dos mais brilhantes homens da cultura lusófona, dizia, em tom jocoso e, ao mesmo tempo, profundamente sério que tudo se discute neste mundo. Só uma coisa, dizia, não se discute para valer: a democracia.
No Maranhão, pode-se dizer, nos últimos cinqüenta anos, um dos raros políticos que não só discutiu, mas levou a sério a democracia foi Jackson Lago, tanto em suas três gestões à frente da Prefeitura Municipal de São Luís, como durante o período do governo interrompido, quando chefe do executivo estadual.
Ficará para a história do povo maranhense a experiência interrompida dos fóruns do governo com a sociedade civil e movimentos sociais. Em tais ocasiões, o comandante do governo, completamente despojado de seus aparatos institucionais, se colocava como parceiro dos movimentos sociais das várias regiões maranhenses para diagnosticarem e programarem ações voltadas à melhoria das condições e da qualidade de vida do povo.
A estratégia de construção do Maranhão Democrático como política pública de estado fundamenta-se no fortalecimento e ampliação dos mecanismos de democracia direta e participativa; no fortalecimento e aperfeiçoamento da democracia representativa e na reestruturação dos órgãos e instituições do Estado para o desenvolvimento sustentável e em escala humana.
O maior dos crimes perpetrado no Brasil, sem a menor dúvida, foi o instituto da escravidão. No Maranhão a grande maioria do povo ainda permanece escravizada, pois privada de condições materiais de sobrevivência dignas e, sobretudo do maior de todos os bens: a liberdade de sonhar e realizar uma vida plena. Pena que o processo eleitoral aí instalado se baseie na substituição da política pelo circo, tornando mais difícil retirar as vendas que impedem o povo de enxergar com clareza as forças que lutam a seu favor, daquelas que querem o seu eterno cativeiro.
sábado, 17 de julho de 2010
QUEDAS E PASSOS DE DANÇA
por Raimundo Palhano
Ingressei no governo Jackson Lago no início de 2007, próximo de sua posse no primeiro dia daquele ano. Saí logo depois de sua cassação, que ocorreu em instância final no dia 16 de abril de 2009, cumpridos dois anos e três meses de gestão emblemática.
Era tarde de 20 daquele mês, chegara de São Paulo no dia anterior e após breve reunião com os funcionários administrativos e técnicos, para as palavras finais de despedida e entrega do pedido de exoneração, tomei o rumo do elevador que me levaria até o estacionamento do Centro Administrativo localizado no Calhau.
Na curta distância percorrida entre a sede do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos, no qual atuei como presidente, até a ascensorista atenciosa de todos os dias, procurava consolo em Fernando Pessoa, o ombro a quem recorro sempre nos momentos de angústia: ...”de tudo ficam três coisas: a certeza de que estamos começando, a certeza de que é preciso continuar e a certeza de que podemos ser interrompidos antes de terminar. Fazer da interrupção um novo caminho, da queda um passo de dança, do medo uma escola, do sonho uma ponte, da procura um encontro. E assim terá valido a pena.”
Estava abalado e confuso para concentrar-me no significado dos versos pessoanos. Acabara de me submeter a uma cirurgia para a retirada da vesícula biliar e ainda estava sob o efeito dos medicamentos e, principalmente, do golpe frontal da cassação do mandato do governador. “Teria realmente valido a pena passar por tantos revezes?”, perguntava-me sem cessar.
Muitas lembranças vieram-me à cabeça. A experiência interrompida no ano de 1999, em Caxias, igualmente por uma cassação inesperada. O discurso apoteótico de Jackson na Praça Maria Aragão ao receber a faixa das mãos do governador dissidente José Reinaldo. A crença de que estava começando uma nova história para o meu Estado. A emoção quase infantil do historiador Leandro Oliveira, que, do meu lado, vibrava intensamente, acompanhando aquela cerimônia inesquecível e única, sob os acordes sensíveis de Arthur Moreira Lima e os olhares, entre vagos e esperançosos, do povo ali presente.
Já fora do elevador que me transportava diariamente para o trabalho, o Maranhão e os seus desafios não me saiam da cabeça, além de mais perguntas inquietantes: ... “em que medida o governo satisfez as expectativas de seus mais de seis milhões de maranhenses?” “Será que se indignarão com a queda ou ficarão indiferentes?”
Jackson Lago assumiu o governo para libertar o Maranhão da opressão e do poder oligárquico, principal responsável pelo seu atraso social, econômico e político. Estado que carrega em sua história social um emaranhado de problemas sem solução imediata, pois jamais foram priorizados pela oligarquia: analfabetismo, saneamento básico, infraestrutura social e pobrezas as mais diversas, incluindo-se a mais danosa de todas, a decorrente do atraso político.
Esses atributos políticos fizeram do Maranhão um Estado bem peculiar no Brasil. Quase sempre o último em tudo, ou quase tudo. A palidez dos seus indicadores sociais e econômicos, sempre entre as três piores posições no contexto nacional, virou cordel entre os cantadores e palavra de ordem dos contadores de estatísticas.
Cassado em plena metade do caminho, no momento em que tudo que havia sido pensado, formulado e programado parecia que ia dar certo, o governador Lago viu-se abruptamente afastado do cargo para o qual se preparara por toda vida. E, mais patético ainda, tendo que passá-lo às mãos daquela a quem derrotara nas eleições de 2006, Roseana Sarney, a reinvenção mais acabada do donatarismo tardio da província.
Ao deixar o estacionamento perguntava-me atônito como seria possível transformar aquela queda descomunal em um passo de dança. Olhei para trás e para os lados e não via Pessoa. Uma brisa suave me fez calmo por alguns instantes...
Agora, retornando da longa viagem existencial, passados tanto tempo, vejo o sofrido torrão maranhense aparentemente incólume a tudo que houve e foi interrompido, sintomaticamente desmemorizado, como se o tempo tivesse parado, a despeito da ampliação dos problemas e desafios e da volta dos fantasmas apavorantes.
Impressiona ver o resistente Jackson Lago novamente cercado de armadilhas ameaçando sua nova postulação, dando a impressão de que se perderam as referências históricas de um dos mais importantes momentos de nossa vida política, certamente sufocado pelo retorno da ideologia oligárquica tradicional, modernizada pela expertise dos marqueteiros profissionais, magos do engenho ilusionista.
Velhas práticas travestidas de novas, processos de cooptação os mais inacreditáveis, alianças políticas completamente absurdas e fisiológicas ao extremo, métodos de governo muitas vezes mais condenáveis do que aqueles que levaram à guilhotina o antigo governo, são fenômenos que transbordam o cotidiano político do Estado, justificados pela falsa inexorabilidade salvacionista de novo ciclo de investimentos privados e federais, na magia dos novos “grandes projetos” e na camuflagem de uma velha elite dirigente que se comporta como neófita na arte de governar, sem atribuir-se a menor responsabilidade nos destinos do Estado nas últimas cinco décadas.
A despeito da força descomunal dos poderosos, das minhas inseguranças e tormentos pessoais, continuo firmemente acreditando que seremos capazes de transformar tudo isso em um passo de dança. Mesmo sabendo das dificuldades de fazer previsões seguras sobre a resposta da população nas eleições de outubro, uma brisa anuncia que a resposta virá. Paira na atmosfera uma música que certamente levará o povo a sair da indiferença. Já não são poucos os que se livraram da cegueira.
O maior dos enigmas é saber o que resultará desse complexo processo político, que em tudo ficou muito velho, apodrecido, e, ao mesmo tempo, parece agora que está acabando de nascer. Insisto, algo muito forte diz que o povo não assistirá a tudo isso de modo indiferente. Há sinais de que a estratégia dos donatários desta vez não funcionará. Já é possível ver a presença inexorável da morte em tudo que parecia eterno. E, se assim for, terá valido a pena.
Ingressei no governo Jackson Lago no início de 2007, próximo de sua posse no primeiro dia daquele ano. Saí logo depois de sua cassação, que ocorreu em instância final no dia 16 de abril de 2009, cumpridos dois anos e três meses de gestão emblemática.
Era tarde de 20 daquele mês, chegara de São Paulo no dia anterior e após breve reunião com os funcionários administrativos e técnicos, para as palavras finais de despedida e entrega do pedido de exoneração, tomei o rumo do elevador que me levaria até o estacionamento do Centro Administrativo localizado no Calhau.
Na curta distância percorrida entre a sede do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos, no qual atuei como presidente, até a ascensorista atenciosa de todos os dias, procurava consolo em Fernando Pessoa, o ombro a quem recorro sempre nos momentos de angústia: ...”de tudo ficam três coisas: a certeza de que estamos começando, a certeza de que é preciso continuar e a certeza de que podemos ser interrompidos antes de terminar. Fazer da interrupção um novo caminho, da queda um passo de dança, do medo uma escola, do sonho uma ponte, da procura um encontro. E assim terá valido a pena.”
Estava abalado e confuso para concentrar-me no significado dos versos pessoanos. Acabara de me submeter a uma cirurgia para a retirada da vesícula biliar e ainda estava sob o efeito dos medicamentos e, principalmente, do golpe frontal da cassação do mandato do governador. “Teria realmente valido a pena passar por tantos revezes?”, perguntava-me sem cessar.
Muitas lembranças vieram-me à cabeça. A experiência interrompida no ano de 1999, em Caxias, igualmente por uma cassação inesperada. O discurso apoteótico de Jackson na Praça Maria Aragão ao receber a faixa das mãos do governador dissidente José Reinaldo. A crença de que estava começando uma nova história para o meu Estado. A emoção quase infantil do historiador Leandro Oliveira, que, do meu lado, vibrava intensamente, acompanhando aquela cerimônia inesquecível e única, sob os acordes sensíveis de Arthur Moreira Lima e os olhares, entre vagos e esperançosos, do povo ali presente.
Já fora do elevador que me transportava diariamente para o trabalho, o Maranhão e os seus desafios não me saiam da cabeça, além de mais perguntas inquietantes: ... “em que medida o governo satisfez as expectativas de seus mais de seis milhões de maranhenses?” “Será que se indignarão com a queda ou ficarão indiferentes?”
Jackson Lago assumiu o governo para libertar o Maranhão da opressão e do poder oligárquico, principal responsável pelo seu atraso social, econômico e político. Estado que carrega em sua história social um emaranhado de problemas sem solução imediata, pois jamais foram priorizados pela oligarquia: analfabetismo, saneamento básico, infraestrutura social e pobrezas as mais diversas, incluindo-se a mais danosa de todas, a decorrente do atraso político.
Esses atributos políticos fizeram do Maranhão um Estado bem peculiar no Brasil. Quase sempre o último em tudo, ou quase tudo. A palidez dos seus indicadores sociais e econômicos, sempre entre as três piores posições no contexto nacional, virou cordel entre os cantadores e palavra de ordem dos contadores de estatísticas.
Cassado em plena metade do caminho, no momento em que tudo que havia sido pensado, formulado e programado parecia que ia dar certo, o governador Lago viu-se abruptamente afastado do cargo para o qual se preparara por toda vida. E, mais patético ainda, tendo que passá-lo às mãos daquela a quem derrotara nas eleições de 2006, Roseana Sarney, a reinvenção mais acabada do donatarismo tardio da província.
Ao deixar o estacionamento perguntava-me atônito como seria possível transformar aquela queda descomunal em um passo de dança. Olhei para trás e para os lados e não via Pessoa. Uma brisa suave me fez calmo por alguns instantes...
Agora, retornando da longa viagem existencial, passados tanto tempo, vejo o sofrido torrão maranhense aparentemente incólume a tudo que houve e foi interrompido, sintomaticamente desmemorizado, como se o tempo tivesse parado, a despeito da ampliação dos problemas e desafios e da volta dos fantasmas apavorantes.
Impressiona ver o resistente Jackson Lago novamente cercado de armadilhas ameaçando sua nova postulação, dando a impressão de que se perderam as referências históricas de um dos mais importantes momentos de nossa vida política, certamente sufocado pelo retorno da ideologia oligárquica tradicional, modernizada pela expertise dos marqueteiros profissionais, magos do engenho ilusionista.
Velhas práticas travestidas de novas, processos de cooptação os mais inacreditáveis, alianças políticas completamente absurdas e fisiológicas ao extremo, métodos de governo muitas vezes mais condenáveis do que aqueles que levaram à guilhotina o antigo governo, são fenômenos que transbordam o cotidiano político do Estado, justificados pela falsa inexorabilidade salvacionista de novo ciclo de investimentos privados e federais, na magia dos novos “grandes projetos” e na camuflagem de uma velha elite dirigente que se comporta como neófita na arte de governar, sem atribuir-se a menor responsabilidade nos destinos do Estado nas últimas cinco décadas.
A despeito da força descomunal dos poderosos, das minhas inseguranças e tormentos pessoais, continuo firmemente acreditando que seremos capazes de transformar tudo isso em um passo de dança. Mesmo sabendo das dificuldades de fazer previsões seguras sobre a resposta da população nas eleições de outubro, uma brisa anuncia que a resposta virá. Paira na atmosfera uma música que certamente levará o povo a sair da indiferença. Já não são poucos os que se livraram da cegueira.
O maior dos enigmas é saber o que resultará desse complexo processo político, que em tudo ficou muito velho, apodrecido, e, ao mesmo tempo, parece agora que está acabando de nascer. Insisto, algo muito forte diz que o povo não assistirá a tudo isso de modo indiferente. Há sinais de que a estratégia dos donatários desta vez não funcionará. Já é possível ver a presença inexorável da morte em tudo que parecia eterno. E, se assim for, terá valido a pena.
segunda-feira, 24 de maio de 2010
DESENVOLVIMENTO LIBERTADOR
por Raimundo Palhano
A história do desenvolvimento do Maranhão, nos últimos cinqüenta anos, é demarcada por duas grandes variantes: de um lado, a progressiva inserção de sua economia na divisão nacional e internacional do trabalho, decorrência da expansão do capitalismo brasileiro e da globalização e, de outro, o predomínio e hipertrofização do poder público estadual, sob domínio absoluto de reduzidíssimos grupos de interesse, hegemonizados por um clã familiar.
A subordinação progressiva do Maranhão ao núcleo capitalista nacional e ao internacional em menor escala, produzindo uma nova especialização da sua economia, acelerou a ruptura da antiga base econômica, então dominada pelo capital mercantil e fundiário local, impondo um novo ordenamento ao aparelho produtivo, centrado na grande propriedade agrícola e pecuária, no setor minero-metalúrgico, no agronegócio e nos grandes projetos exportadores de “commodities”.
Isto fez com que as camadas dominantes locais passassem a reforçar alianças com estes setores hegemônicos do poder econômico e político, sobretudo o nacional, colocando o poder público estadual a serviço da reprodução ampliada desses novos ciclos de investimentos, recebendo em troca o apoio à ocupação intensiva e extensiva dos aparelhos de hegemonia do Estado, no que fortaleceram de modo desproporcional seus domínios sobre os demais segmentos da sociedade, camuflados por um poderoso sistema de comunicação midiática.
Decorre desse processo de conjugação de interesses entre elites políticas e econômicas a razão lógica que informa a concepção de desenvolvimento do Maranhão adotada pelas oligarquias que se apoderaram do setor público estadual nas últimas cinco décadas: um desenvolvimento elitista, focado e dependente dos grandes projetos, voltado para o mercado exterior de produtos primários e de “commodities”, responsável, em última instância, pela baixa capacidade do sistema econômico local em agregar valores aos produtos, gerar empregos e ampliar e distribuir rendas. A conseqüência material dessa estratégia de dominação é o fortalecimento da inoperância do poder público estadual e de suas políticas públicas de desenvolvimento no atendimento das preferências e necessidades da grande maioria da população maranhense.
A Frente de Libertação que governou o Estado, sob a liderança de Jackson Lago, entre 2007 e abril de 2009, teve como uma de suas muitas virtudes a iniciativa de superar essa concepção oligárquica e plutocrática de desenvolvimento. Propôs, no seu lugar, um conteúdo e uma prática capazes de libertar a sociedade e o povo maranhense dos grilhões do passado, baseando-se nos princípios da economia solidária, na democratização do estado, na busca da prosperidade, no respeito à vida e na dignidade humana. Entrava em cena, pela primeira vez, a construção de uma nova governança, na qual as diferenças não mais seriam resolvidas pela força bruta e pela exclusão. Uma nova subjetividade visceralmente fundada na democracia e na construção de uma sociedade livre de feitores, felinos insaciáveis e tubarões famintos, em que a diversidade e as diferenças sociais teriam seus direitos e prerrogativas reconhecidos e respeitados.
Com efeito, a concepção oligárquica e plutocrática de desenvolvimento, por seu elitismo, arrogância e centralismo, cultiva por décadas a falsa idéia de que só são viáveis, modernos e dinâmicos os empreendimentos densos de capital, vindos de fora, os denominados “grandes projetos”, no que se aproveitam para criar esperanças ilusórias de empregos e eldorados fictícios que, por isso mesmo, pouco impactam na economia local e muito menos atingem a vida cotidiana da população, a não ser pelo aumento da precarização dos serviços públicos de consumo coletivo.
O PPA 2008-2011 do governo interrompido é cristalino ao apontar o que precisava ser feito para a conquista do desenvolvimento libertador: modernização da gestão pública, elevação da produtividade sistêmica das políticas públicas, descentralização adminstrativa, regionalização do desenvolvimento, democratização e transparência do governo, densidade e disseminação de informações, tudo isso visando “deselitizar” o poder público e redefinir o seu papel como indutor do desenvolvimento.
Estava em construção também a idéia de um novo municipalismo, em substituição ao que vigora por décadas, que se caracteriza por um modelo de governança autoritário, no qual o poder público estadual deixa de ser um parceiro do desenvolvimento e assume o papel de principal neutralizador e inibidor dos municípios. O elitismo da política dominante jamais poderia admitir o município como parceiro horizontal, daí a costumeira recorrência ao clientelismo, coronelismo e assistencialismo, estratégias eficazes para cooptar vontades, que retornam com toda força sob a idéia de que “governar é cuidar das pessoas”.
Esta maneira com a qual os grupos de interesse dominantes engendram o desenvolvimento do Maranhão leva a uma situação paradoxal, em que os conhecimentos dos “experts”, e não a participação da sociedade, é que fundamentam e definem a essência das políticas públicas. A concepção do desenvolvimento libertador, por seu turno, chocava-se de frente com tais orientações doutrinárias e metodológicas, pois sua premissa básica era democratizar a sociedade e devolver o estado ao povo.
O que está na ordem do dia agora é encontrar a saída do labirinto maranhense. Ladislau Dowbor tem repetido sempre que não há possibilidade de desenvolvimento sem participação e muito menos participação sem informação farta e democraticamente acessível. São dois ingredientes insubstituíveis no processo de elaboração de concertações efetivas para políticas públicas concretas. Até quando o modelo oligárquico e plutocrático de desenvolvimento continuará se reproduzindo no Maranhão dependerá fatalmente da vitória da democracia sobre estas formas anacrônicas de monopolização do poder político e econômico.
Hanna Arendt afirma que não nascemos para morrer; nascemos para recomeçar. Significa dizer que precisamos elaborar centralidades no processo de reinvenção e reelaboração histórica do Maranhão. Não seremos mais pobres caricaturas das imposições de um sistema de dominação que envelheceu e perdeu as condições éticas de dirigir os destinos de um povo lutador como o maranhense.
As camadas dominantes deste Estado não querem direitos, buscam apenas o fortalecimento dos seus privilégios. Superar o estado de contemplação pelo estado de ação é vital para a vitória das concepções que entendem o desenvolvimento como meio de libertação do anacronismo. Mais do que em qualquer época da história recente do Maranhão é preciso que os setores mais intelectualizados e ilustrados da sociedade, despojadamente, ajudem a esclarecer o povo a respeito do que está se passando verdadeiramente em sua volta.
A história do desenvolvimento do Maranhão, nos últimos cinqüenta anos, é demarcada por duas grandes variantes: de um lado, a progressiva inserção de sua economia na divisão nacional e internacional do trabalho, decorrência da expansão do capitalismo brasileiro e da globalização e, de outro, o predomínio e hipertrofização do poder público estadual, sob domínio absoluto de reduzidíssimos grupos de interesse, hegemonizados por um clã familiar.
A subordinação progressiva do Maranhão ao núcleo capitalista nacional e ao internacional em menor escala, produzindo uma nova especialização da sua economia, acelerou a ruptura da antiga base econômica, então dominada pelo capital mercantil e fundiário local, impondo um novo ordenamento ao aparelho produtivo, centrado na grande propriedade agrícola e pecuária, no setor minero-metalúrgico, no agronegócio e nos grandes projetos exportadores de “commodities”.
Isto fez com que as camadas dominantes locais passassem a reforçar alianças com estes setores hegemônicos do poder econômico e político, sobretudo o nacional, colocando o poder público estadual a serviço da reprodução ampliada desses novos ciclos de investimentos, recebendo em troca o apoio à ocupação intensiva e extensiva dos aparelhos de hegemonia do Estado, no que fortaleceram de modo desproporcional seus domínios sobre os demais segmentos da sociedade, camuflados por um poderoso sistema de comunicação midiática.
Decorre desse processo de conjugação de interesses entre elites políticas e econômicas a razão lógica que informa a concepção de desenvolvimento do Maranhão adotada pelas oligarquias que se apoderaram do setor público estadual nas últimas cinco décadas: um desenvolvimento elitista, focado e dependente dos grandes projetos, voltado para o mercado exterior de produtos primários e de “commodities”, responsável, em última instância, pela baixa capacidade do sistema econômico local em agregar valores aos produtos, gerar empregos e ampliar e distribuir rendas. A conseqüência material dessa estratégia de dominação é o fortalecimento da inoperância do poder público estadual e de suas políticas públicas de desenvolvimento no atendimento das preferências e necessidades da grande maioria da população maranhense.
A Frente de Libertação que governou o Estado, sob a liderança de Jackson Lago, entre 2007 e abril de 2009, teve como uma de suas muitas virtudes a iniciativa de superar essa concepção oligárquica e plutocrática de desenvolvimento. Propôs, no seu lugar, um conteúdo e uma prática capazes de libertar a sociedade e o povo maranhense dos grilhões do passado, baseando-se nos princípios da economia solidária, na democratização do estado, na busca da prosperidade, no respeito à vida e na dignidade humana. Entrava em cena, pela primeira vez, a construção de uma nova governança, na qual as diferenças não mais seriam resolvidas pela força bruta e pela exclusão. Uma nova subjetividade visceralmente fundada na democracia e na construção de uma sociedade livre de feitores, felinos insaciáveis e tubarões famintos, em que a diversidade e as diferenças sociais teriam seus direitos e prerrogativas reconhecidos e respeitados.
Com efeito, a concepção oligárquica e plutocrática de desenvolvimento, por seu elitismo, arrogância e centralismo, cultiva por décadas a falsa idéia de que só são viáveis, modernos e dinâmicos os empreendimentos densos de capital, vindos de fora, os denominados “grandes projetos”, no que se aproveitam para criar esperanças ilusórias de empregos e eldorados fictícios que, por isso mesmo, pouco impactam na economia local e muito menos atingem a vida cotidiana da população, a não ser pelo aumento da precarização dos serviços públicos de consumo coletivo.
O PPA 2008-2011 do governo interrompido é cristalino ao apontar o que precisava ser feito para a conquista do desenvolvimento libertador: modernização da gestão pública, elevação da produtividade sistêmica das políticas públicas, descentralização adminstrativa, regionalização do desenvolvimento, democratização e transparência do governo, densidade e disseminação de informações, tudo isso visando “deselitizar” o poder público e redefinir o seu papel como indutor do desenvolvimento.
Estava em construção também a idéia de um novo municipalismo, em substituição ao que vigora por décadas, que se caracteriza por um modelo de governança autoritário, no qual o poder público estadual deixa de ser um parceiro do desenvolvimento e assume o papel de principal neutralizador e inibidor dos municípios. O elitismo da política dominante jamais poderia admitir o município como parceiro horizontal, daí a costumeira recorrência ao clientelismo, coronelismo e assistencialismo, estratégias eficazes para cooptar vontades, que retornam com toda força sob a idéia de que “governar é cuidar das pessoas”.
Esta maneira com a qual os grupos de interesse dominantes engendram o desenvolvimento do Maranhão leva a uma situação paradoxal, em que os conhecimentos dos “experts”, e não a participação da sociedade, é que fundamentam e definem a essência das políticas públicas. A concepção do desenvolvimento libertador, por seu turno, chocava-se de frente com tais orientações doutrinárias e metodológicas, pois sua premissa básica era democratizar a sociedade e devolver o estado ao povo.
O que está na ordem do dia agora é encontrar a saída do labirinto maranhense. Ladislau Dowbor tem repetido sempre que não há possibilidade de desenvolvimento sem participação e muito menos participação sem informação farta e democraticamente acessível. São dois ingredientes insubstituíveis no processo de elaboração de concertações efetivas para políticas públicas concretas. Até quando o modelo oligárquico e plutocrático de desenvolvimento continuará se reproduzindo no Maranhão dependerá fatalmente da vitória da democracia sobre estas formas anacrônicas de monopolização do poder político e econômico.
Hanna Arendt afirma que não nascemos para morrer; nascemos para recomeçar. Significa dizer que precisamos elaborar centralidades no processo de reinvenção e reelaboração histórica do Maranhão. Não seremos mais pobres caricaturas das imposições de um sistema de dominação que envelheceu e perdeu as condições éticas de dirigir os destinos de um povo lutador como o maranhense.
As camadas dominantes deste Estado não querem direitos, buscam apenas o fortalecimento dos seus privilégios. Superar o estado de contemplação pelo estado de ação é vital para a vitória das concepções que entendem o desenvolvimento como meio de libertação do anacronismo. Mais do que em qualquer época da história recente do Maranhão é preciso que os setores mais intelectualizados e ilustrados da sociedade, despojadamente, ajudem a esclarecer o povo a respeito do que está se passando verdadeiramente em sua volta.
sábado, 15 de maio de 2010
O ELOGIO DA VIRTUDE
por Raimundo Palhano
Por que antigos aliados, militantes políticos, intelectuais e jornalistas, não satisfeitos com as ignomínias do golpe judiciário, ainda querem arrancar a cabeça do governo Jackson Lago, atribuindo-lhe pletora de erros, no afã de promover o seu desmonte, como fazem os donos do poder estadual, os artífices do golpe?
Observando-se a natureza profunda desse fenômeno é possível supor a existência de um paradoxo inusitado: estaria a verdade do governo Jackson sendo concretamente pautada pelo governo Sarney, uma vez que tais intérpretes aceitam e se fundamentam, em última análise, nas teses centrais dos grupos de interesse dominantes, segundo as quais a queda do governo se deveu aos seus próprios e inúmeros erros e incompetências?
Afinal, se os adversários figadais estão de fato traduzindo para a população qual é a verdade do governo cassado, o que se pode fazer, na condição de movimento político que tem o dever histórico de por fim à interrupção do mandato, para convencer os cidadãos eleitores de que existe um outro olhar sobre a realidade e uma contra-verdade a respeito do governo interrompido?
O objetivo não declarado dos atuais pregoeiros parece bem claro: demolir e apagar da memória o governo da antiga Frente de Libertação do Maranhão, liderada por Jackson Lago e José Reinaldo Tavares, demonstrando, de forma cabal e inquestionável, sua incompetência estrutural para gerir o governo do Estado e, ao mesmo tempo, apontar os supostos culpados pelo fracasso, extraídos do interior do próprio governo, com o intuito de execrá-los socialmente e expurgá-los da vida pública para sempre.
No Maranhão a mídia é Midas. Governando segundo o seu surrado evangelho e com seus tradicionais e caducos pastores, o governo que ascendeu ao poder pelo golpe, em pouco mais de um ano sentado confortavelmente no trono dos Leões, consegue, de modo eficiente, apelando à sua mediunidade comunicativa, transformar água em vinho, assistencialismo em políticas públicas, inércia em ação.
Enquanto isso, as vítimas da trama judiciária, certamente com seus juízos fora do lugar, também há um ano e pouco distantes da cassação, se encontram procurando à luz do dia fantasmas expiatórios e causas esotéricas para justificar a queda do governo, navegando na tese de que Jackson caiu por seus próprios erros e defeitos. Sem o couro cabeludo para proteger o cérebro e, mais ainda, sem a própria cabeça, o governo da libertação do Maranhão não teria passado de um sonho em noite insone. É o que se pode concluir das análises daqueles intérpretes que renunciaram à lucidez em favor da miopia e da cegueira.
Necessita-se urgentemente, por uma questão de imperativo ético e histórico, além das exigências do próprio calendário eleitoral, de leituras múltiplas para a opinião pública estadual a respeito da essência do governo Jackson Lago. Longe destas reflexões quaisquer veleidades míticas ou muito menos iconoclásticas. Não se trata de renúncia à razão crítica. Esconder erros e omissões, ambigüidades e contradições, eximir e blindar culpados também não se trata disso. O que se defende é o retorno à lucidez para que a verdade triunfe. Defeitos e muitos, sim, os houve em todos os níveis e modalidades da gestão. Virtudes também e muitas, certamente, a ponto, como tem afirmado Léo Costa, de terem sido as verdadeiras razões que deram causa à interrupção do mandato.
Houve sim um círculo virtuoso em franca gestação durante o meio período do governo Lago, antinômico aos padrões técnicos e políticos do então antigo regime oligárquico. Inaugurava-se uma nova governança com os grandes projetos, tidos como símbolos de um Maranhão moderno. Compreendia-se a importância de capacitar o Estado como forma de obter melhores benefícios econômicos e sociais a partir dos investimentos previstos para os próximos anos. A consciência de que era preciso garantir que a população se beneficiasse do crescimento econômico do novo ciclo de investimentos sempre se fez presente. Para isso era preciso reforçar a capacidade do setor público em atender às demandas da nova estrutura econômica em construção. Um estratégia fundamental para isso era fortalecer os municípios e descentralizar as responsabilidades governamentais.
A divisão do Maranhão em 32 regiões administrativas e de desenvolvimento foi a resposta ousada aos desafios de descentralizar a gestão pública estadual e colocá-la a serviço do desenvolvimento regional e local, aproximando o governo do povo de uma forma concreta. Os diagnósticos eram claros em favor da descentralização e da regionalização: crescimento econômico e social concentrado em poucos municípios, potencial econômico convivendo com pobreza absoluta, baixa capacidade institucional do poder público, principalmente do municipal, além das desfuncionalidades da própria máquina estadual.
O maior dos desafios era devolver o poder ao povo, dificílimo em um Estado como o Maranhão subordinado à hegemonia de um único grupo de interesse. Cogitava-se uma estratégia de desenvolvimento municipal e regional que articulava poder público, sociedade e arranjos institucionais. Tudo isso sob o binômio da dinamização da economia e fortalecimento da democracia, centrado no desenvolvimento do arranjo institucional e do capital social local. Houve sim uma carta de navegação, montada na idéia de que se tratava de um Estado anfíbio, que deveria aproveitar as oportunidades de ser Amazônia e Nordeste, ao mesmo tempo que deveria se inserir na ordem internacional a participar ativamente de uma paradiplomacia pautada em relações intermediárias federativas com países vizinhos e parceiros.
Voltar ao governo é possível, sim. O povo informado saberá escolher e decretará o fim das oligarquias políticas, da desorganização das economias locais e do atraso social.
Voltar à união das forças democráticas é sim viável. Quando o corpo adoece a alma vem em socorro, dizem profetas. Passar de mentes turvas para clarões inquietantes não é impossível. Atingiremos sim o diálogo significativo que integre os nossos sonhos desencontrados. O que esta em pauta é o que se pode fazer juntos para mudar a estrutura arcaica do Maranhão nas dimensões política, econômica, educacional e institucional.
Isto significa retomar pelo voto livre o governo interrompido e atribuir qualidade ao desenvolvimento, traduzido na capacidade das políticas públicas de satisfazerem as preferências dos cidadãos maranhenses.
Por que antigos aliados, militantes políticos, intelectuais e jornalistas, não satisfeitos com as ignomínias do golpe judiciário, ainda querem arrancar a cabeça do governo Jackson Lago, atribuindo-lhe pletora de erros, no afã de promover o seu desmonte, como fazem os donos do poder estadual, os artífices do golpe?
Observando-se a natureza profunda desse fenômeno é possível supor a existência de um paradoxo inusitado: estaria a verdade do governo Jackson sendo concretamente pautada pelo governo Sarney, uma vez que tais intérpretes aceitam e se fundamentam, em última análise, nas teses centrais dos grupos de interesse dominantes, segundo as quais a queda do governo se deveu aos seus próprios e inúmeros erros e incompetências?
Afinal, se os adversários figadais estão de fato traduzindo para a população qual é a verdade do governo cassado, o que se pode fazer, na condição de movimento político que tem o dever histórico de por fim à interrupção do mandato, para convencer os cidadãos eleitores de que existe um outro olhar sobre a realidade e uma contra-verdade a respeito do governo interrompido?
O objetivo não declarado dos atuais pregoeiros parece bem claro: demolir e apagar da memória o governo da antiga Frente de Libertação do Maranhão, liderada por Jackson Lago e José Reinaldo Tavares, demonstrando, de forma cabal e inquestionável, sua incompetência estrutural para gerir o governo do Estado e, ao mesmo tempo, apontar os supostos culpados pelo fracasso, extraídos do interior do próprio governo, com o intuito de execrá-los socialmente e expurgá-los da vida pública para sempre.
No Maranhão a mídia é Midas. Governando segundo o seu surrado evangelho e com seus tradicionais e caducos pastores, o governo que ascendeu ao poder pelo golpe, em pouco mais de um ano sentado confortavelmente no trono dos Leões, consegue, de modo eficiente, apelando à sua mediunidade comunicativa, transformar água em vinho, assistencialismo em políticas públicas, inércia em ação.
Enquanto isso, as vítimas da trama judiciária, certamente com seus juízos fora do lugar, também há um ano e pouco distantes da cassação, se encontram procurando à luz do dia fantasmas expiatórios e causas esotéricas para justificar a queda do governo, navegando na tese de que Jackson caiu por seus próprios erros e defeitos. Sem o couro cabeludo para proteger o cérebro e, mais ainda, sem a própria cabeça, o governo da libertação do Maranhão não teria passado de um sonho em noite insone. É o que se pode concluir das análises daqueles intérpretes que renunciaram à lucidez em favor da miopia e da cegueira.
Necessita-se urgentemente, por uma questão de imperativo ético e histórico, além das exigências do próprio calendário eleitoral, de leituras múltiplas para a opinião pública estadual a respeito da essência do governo Jackson Lago. Longe destas reflexões quaisquer veleidades míticas ou muito menos iconoclásticas. Não se trata de renúncia à razão crítica. Esconder erros e omissões, ambigüidades e contradições, eximir e blindar culpados também não se trata disso. O que se defende é o retorno à lucidez para que a verdade triunfe. Defeitos e muitos, sim, os houve em todos os níveis e modalidades da gestão. Virtudes também e muitas, certamente, a ponto, como tem afirmado Léo Costa, de terem sido as verdadeiras razões que deram causa à interrupção do mandato.
Houve sim um círculo virtuoso em franca gestação durante o meio período do governo Lago, antinômico aos padrões técnicos e políticos do então antigo regime oligárquico. Inaugurava-se uma nova governança com os grandes projetos, tidos como símbolos de um Maranhão moderno. Compreendia-se a importância de capacitar o Estado como forma de obter melhores benefícios econômicos e sociais a partir dos investimentos previstos para os próximos anos. A consciência de que era preciso garantir que a população se beneficiasse do crescimento econômico do novo ciclo de investimentos sempre se fez presente. Para isso era preciso reforçar a capacidade do setor público em atender às demandas da nova estrutura econômica em construção. Um estratégia fundamental para isso era fortalecer os municípios e descentralizar as responsabilidades governamentais.
A divisão do Maranhão em 32 regiões administrativas e de desenvolvimento foi a resposta ousada aos desafios de descentralizar a gestão pública estadual e colocá-la a serviço do desenvolvimento regional e local, aproximando o governo do povo de uma forma concreta. Os diagnósticos eram claros em favor da descentralização e da regionalização: crescimento econômico e social concentrado em poucos municípios, potencial econômico convivendo com pobreza absoluta, baixa capacidade institucional do poder público, principalmente do municipal, além das desfuncionalidades da própria máquina estadual.
O maior dos desafios era devolver o poder ao povo, dificílimo em um Estado como o Maranhão subordinado à hegemonia de um único grupo de interesse. Cogitava-se uma estratégia de desenvolvimento municipal e regional que articulava poder público, sociedade e arranjos institucionais. Tudo isso sob o binômio da dinamização da economia e fortalecimento da democracia, centrado no desenvolvimento do arranjo institucional e do capital social local. Houve sim uma carta de navegação, montada na idéia de que se tratava de um Estado anfíbio, que deveria aproveitar as oportunidades de ser Amazônia e Nordeste, ao mesmo tempo que deveria se inserir na ordem internacional a participar ativamente de uma paradiplomacia pautada em relações intermediárias federativas com países vizinhos e parceiros.
Voltar ao governo é possível, sim. O povo informado saberá escolher e decretará o fim das oligarquias políticas, da desorganização das economias locais e do atraso social.
Voltar à união das forças democráticas é sim viável. Quando o corpo adoece a alma vem em socorro, dizem profetas. Passar de mentes turvas para clarões inquietantes não é impossível. Atingiremos sim o diálogo significativo que integre os nossos sonhos desencontrados. O que esta em pauta é o que se pode fazer juntos para mudar a estrutura arcaica do Maranhão nas dimensões política, econômica, educacional e institucional.
Isto significa retomar pelo voto livre o governo interrompido e atribuir qualidade ao desenvolvimento, traduzido na capacidade das políticas públicas de satisfazerem as preferências dos cidadãos maranhenses.
terça-feira, 4 de maio de 2010
O GRITO DE JHONATAN
Raimundo Palhano
Que lúcido texto este seu sobre a volta do planejamento público autoritário no Maranhão. Além da proeza de buscar no denso universo literário de Camões a transversal inspiração, realiza a façanha de gritar fundo a tantos ouvidos moucos que nos rodeiam, alertando que houve sim unidade na diversidade durante o governo interrompido de Jackson Lago.
A capacidade dos grupos de interesse, liderados pelos hegemônicos Sarney, que controlam a política e a economia do Maranhão de produzir inverdades sobre a razão da queda do governo Lago é de tal forma poderosa que chega ao cúmulo de nascer no interior destes mencionados grupos as pautas utilizadas pela mídia para explicar as causas da queda.
O absurdo dos absurdos, presente nessa vergonhosa deturpação da história é quando importantes intelectuais, jornalistas e lideranças públicas, e até mesmo antigos aliados do governo deposto, assimilam tais pautas e elaboram análises exaustivas, supostamente verossímeis, sobre os "erros" cometidos, erros estes, todos eles, pautados pelos que arquitetaram o golpe judiciário e político. Uma engenharia fantástica que não se contenta apenas em mencionar os erros, mas em apontar também os supostos reponsáveis pela tragédia anunciada.
O mais dramático de tudo ocorreu no dia seguinte à evocação do primeiro ano da deposição. Em entrevista ao Jornal O Imparcial o nosso governador Jackson, talvez sob a pressão de análises falaciosas sobre a queda do seu governo, admite publicamente um "mea culpa", utilizada como título da matéria.
O também lúcido e inspirado sociólogo Leo Costa costuma dizer que Jackson não caiu por eventuais erros cometidos em seu governo, que certamente foram muitos, como querem fazer parecer os grupos dominantes da política maranhense. O governo Jackson caiu por suas virtudes, pelo que estava realizando e que iria fatalmente romper os paradígmas da dominação oligárquica tradicional.
Parabéns por ter escancarado a sua garganta, caro companheiro.
Que lúcido texto este seu sobre a volta do planejamento público autoritário no Maranhão. Além da proeza de buscar no denso universo literário de Camões a transversal inspiração, realiza a façanha de gritar fundo a tantos ouvidos moucos que nos rodeiam, alertando que houve sim unidade na diversidade durante o governo interrompido de Jackson Lago.
A capacidade dos grupos de interesse, liderados pelos hegemônicos Sarney, que controlam a política e a economia do Maranhão de produzir inverdades sobre a razão da queda do governo Lago é de tal forma poderosa que chega ao cúmulo de nascer no interior destes mencionados grupos as pautas utilizadas pela mídia para explicar as causas da queda.
O absurdo dos absurdos, presente nessa vergonhosa deturpação da história é quando importantes intelectuais, jornalistas e lideranças públicas, e até mesmo antigos aliados do governo deposto, assimilam tais pautas e elaboram análises exaustivas, supostamente verossímeis, sobre os "erros" cometidos, erros estes, todos eles, pautados pelos que arquitetaram o golpe judiciário e político. Uma engenharia fantástica que não se contenta apenas em mencionar os erros, mas em apontar também os supostos reponsáveis pela tragédia anunciada.
O mais dramático de tudo ocorreu no dia seguinte à evocação do primeiro ano da deposição. Em entrevista ao Jornal O Imparcial o nosso governador Jackson, talvez sob a pressão de análises falaciosas sobre a queda do seu governo, admite publicamente um "mea culpa", utilizada como título da matéria.
O também lúcido e inspirado sociólogo Leo Costa costuma dizer que Jackson não caiu por eventuais erros cometidos em seu governo, que certamente foram muitos, como querem fazer parecer os grupos dominantes da política maranhense. O governo Jackson caiu por suas virtudes, pelo que estava realizando e que iria fatalmente romper os paradígmas da dominação oligárquica tradicional.
Parabéns por ter escancarado a sua garganta, caro companheiro.
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