segunda-feira, 29 de junho de 2015

PLANOS DE EDUCAÇÃO: DAS GENERALIZAÇÕES À EFETIVIDADE


                                                                                                                                                                                                       por Raimundo Palhano


O Plano Nacional de Educação-PNE completou agora em junho de 2015 o seu primeiro ano de vida já em situação de inadimplência, o que não vale explorar agora. Ainda é cedo. Sugiro acessarem o portal da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e lerem a boa reflexão sobre o assunto.

O resultado sinaliza na direção da luz amarela. O PNE é um bom plano, não resta dúvida, melhor do que o primeiro, encerrado em 2011. Sua grande fragilidade é a falta de fundamentos e de paradigmas claros sobre a nova engenharia educacional a ser produzida para ficar no lugar da atual, falida e inviável.

Tão verdadeiro que o próprio governo convidou o enigmático Magabeira Unger para escrever os seus fundamentos gerais, dada a verve reconhecida do mencionado professor. Tarefa para um mágico: revestir um plano eminentemente operativo com as subjetividades de uma “pátria educadora” metafórica, sem inspiração, e ainda profundamente descreditada.

Uma das virtudes do PNE é mapear quase todas as questões que atormentam a educação brasileira contemporânea. Seu grande defeito: incapacidade de juntar as suas peças em um projeto uniforme de caráter instituidor. A maior das ameaças à sua credibilidade e exequibilidade: ser visto como uma profusão de metas e estratégias sem conexão alguma, seja pela falta de foco geral; seja pelas limitações de muitos gestores educacionais, que terão dificuldades para fazer a correta aplicação das estratégias, tanto por limitações técnicas, quanto por questões infraestruturais.

Ao se limitar em definir metas, muitas delas imprecisas e a definir mais de duas centenas de estratégias, deixa aos demais entes da federação, a começar pela própria União, de onde emana, ao Distrito Federal, aos Estados e aos Municípios o descomunal desafio de transformar o cardume de medidas presentes nos planos em realidades palpáveis.

Descomunal sobretudo pela impossibilidade de cumprir a sua principal finalidade, que é transformar o padrão de qualidade da educação nacional, sem que fique clara a configuração de um novo pacto federativo capaz de redistribuir os recursos financeiros, institucionais e pedagógicos de modo adequado às necessidades dos contextos e à garantia do direito de aprender das crianças, jovens, adultos e idosos deste país.

Uma boa política de educação para o Brasil e para o Maranhão especialmente não devem se fundamentar no vale quanto pesa, ou seja, em uma lista cada vez maior de medidas para combater os déficits estruturais que foram se acumulando anos a fio, por imperícia ou por omissão, sem debater com a sociedade e suas instituições credenciadas, e sem o conhecimento prévio dos limites e possibilidades reais de superação.

Edgar Morin, em sua última passagem pelo Brasil, em menos de dois anos atrás, afirmou, respaldado pela envergadura dos seus mais de noventa anos, que a crise da educação na ordem globalizada atual se deve à fragmentação dos saberes. Sua reflexão parte da ideia de que acumulamos cada vez mais saberes e as escolas não estão sendo capazes de organizá-los.

Creio que a involução educacional em nosso meio não se deveu somente a isso ou mesmo à falta de ideias, de propostas ou de iniciativas. Basta olhar o primeiro Plano Nacional e este último, de 2014, e os milhares de planos estaduais, municipais e do Distrito Federal. Um verdadeiro e enorme caleidoscópio, ou mesmo um gigantesco arco-íris, que continuam misturando, como na maior parte das iniciativas semelhantes, as mesmas cores de sempre, faltando precisão e sobrando generalidades.

O Plano Nacional de Educação e os decorrentes Planos Estaduais e Municipais estarão condenados ao insucesso se não forem capazes de organizar as ideias que os informam na direção de uma nova maneira de conceber, estruturar e gerir o sistema que substituirá o atual modelo, cada vez mais inadequado ao enfrentamento dos gravíssimos problemas que recortam e precarizam a educação brasileira, manifestos nos medíocres desempenhos das unidades da federação.

Cada vez mais me convenço da prioridade e da urgência que devem ser dadas a uma nova política educacional apta a tirar o Brasil dos últimos lugares e o Maranhão da lanterna dos rankings educacionais. A sensação que tenho, vendo o andar da carruagem, é que continuamos ainda às cegas, confusos em labirintos de vontades, de interesses corporativos, de paradigmas desconexos, de dissipação de recursos financeiros e de inteligências curtas.

O ponto de partida é a real valorização do universo municipal, invertendo-se a pirâmide de recursos. União e Estados precisam romper com as práticas tradicionais e com a lógica assistencialista da cooperação com os municípios. Introduzir o princípio da subsidiariedade é indispensável na futura governança. O que couber ao município deve ser assegurado e para isso as relações inadequadas de hoje, que incapacitam e muitas vezes envergonham o poder local, precisam ser superadas. Para que isso venha a ocorrer o eixo de interesses deve mudar radicalmente: sair dos privilégios e interesses corporativos contextualizados para atingir o estágio superior representado pelo direito de aprender das crianças e dos estudantes.

Grandes cabeças acreditam que os Planos Decenais de Educação estarão a salvos pelo simples fato de serem revestidos da condição de políticas de estado. Estariam, portanto, menos vulneráveis às conjunturas, aos humores dos governos de plantão e tudo mais que desperta apetites imediatos e arbitrariedades. Em países como o nosso, marcados por assimetrias sociais graves, acreditar apenas nessa condicionalidade é no mínimo temeroso. Não temos no Brasil e, muito menos no Maranhão, respeito às políticas de estado. Aliás, não seria exagero dizer que, ao longo do tempo, muitos grupos que assumiram o poder estatal, nem mesmo tiveram clareza do que se tratava, quanto menos praticá-las.

O atual Plano Estadual de Educação do Maranhão é exuberante na arte de ir fundo na escavação de sonhos díspares. Enquanto o PNE se atrapalha na tentativa de juntar as peças soltas de um sistema educacional extremamente pulverizado entre 4 entes federativos, que não sabem se articular na linha da efetividade, o Plano Estadual de Educação sonha para dentro e para fora e ainda quer mais: pretende chegar à estratosfera. Ao que parece, ações do governo estadual precisam chamar o PEE à razão.

Devemos festejar a iniciativa de muitos municípios maranhenses que se empenharam decisivamente na aprovação de seus Planos de Educação pelas Câmaras Municipais, procurando cumprir prazo determinado em Lei. Muitos chegaram a sacralizar a iniciativa, recheando seus planos com caracterizações socioeconômicas, geográficas e ambientais eivadas de solenidade. Em vários municípios a elaboração e aprovação do PME foi muito mais um ritual eclesiástico do que uma realização técnica voltada ao planejamento educacional. É o preço que se paga pela adoção de uma metodologia de elaboração pré-formatada, que encaminhou os planos municipais a uma matriz adotada por quase todos.

O que se precisa saber é que a hora de virar a página bate à porta.  A matriz de apoio produzida pela União e pelos Estados ajudou decididamente para a elaboração dos Planos, mesmo induzindo muitos municípios a seguirem a mesma trilha. Deve-se muito aos apoios recebidos do sistema federal e do sistema estadual. 

O que precisa ser feito agora é a minimização dessa influência, evitando que o fato não engesse a imaginação, a criatividade e as riquezas contextuais, permitindo que os educadores e gestores locais consigam transformar as metas e estratégias em programas, projetos e ações concretas e necessárias à reinvenção da educação pública municipal até o final da próxima década.

                                                                 

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