sexta-feira, 11 de agosto de 2017
EDUCAÇÃO É UM ECOSSISTEMA CULTURAL
terça-feira, 25 de julho de 2017
O MARANHÃO, SEUS AVESSOS E ANÁLISE CONJUNTURAL
Raimundo Palhano
(Trabalho publicado, originalmente, na Revista Imesc de 2008)
1
INTRODUÇÃO
Decorrem
do predomínio de explicações consagradas as dificuldades de sistematizar visões
alternativas sobre o que foi, é e o que poderá ser o Maranhão. Muitos equívocos
e alguns mitos, por essa razão, ainda permanecem vivos. A retomada dos estudos
conjunturais pelo IMESC poderá contribuir para o processo de quebra dos
paradigmas consagrados, normalmente despolitizadores, e alargar os horizontes
interpretativos sobre a formação maranhense de um modo geral.
O
momento histórico vivido pelo Maranhão, com um governo democrático instalado
nos Leões, e também pelo país, marcado por uma atmosfera otimista, apesar dos
estragos da crise financeira norte-americana e dos seus impactos devastadores,
não deixam dúvidas de que é preciso continuar passando a limpo a formação
social maranhense e a sua dinâmica contemporânea. Dispor de estudos e pesquisas
que se reportam aos movimentos conjunturais da economia e da sociedade
representa subsídio importante para o planejamento das políticas públicas
governamentais, como, igualmente, um bom pano de fundo para os empreendedores
econômicos e para a sociedade civil organizada.
Próximos
do fim da primeira década do ano 2000, muitas incertezas ainda continuam
desafiando agora, agravadas pela crise do mercado hipotecário dos Estados
Unidos, vistos até ontem como superpotência absoluta. Velhas crenças e até
mesmo as novas, como a ilusão do neoliberalismo, saem do mapa pela porta dos
fundos e de forma sorrateira.
A
descrença na globalização tradicional, como expressão de um fenômeno econômico
baseado na financeirização dos mercados, é o traço mais característico dessa
nova realidade. Uma nova globalização pós-neoliberalismo deverá nascer o mais
rápido possível, cuja característica básica será sua maior diversificação.
Entre Bretton Woods de 1944 e os EUA de 2008 muitas águas rolaram em todos os
continentes e tudo indica que os barcos do capitalismo financeiro hegemônico
não chegarão a nenhum porto seguro. A ordem econômica mundial navega em águas
agitadas e ondas de crise estão cada vez mais fortes, ameaçando o
desenvolvimento sustentável, o estado provedor social, a dívida pública interna
e externa, e, sobretudo, a evolução do trabalho e do emprego.
Quais
então as perspectivas de desenvolvimento para países como o Brasil e estados
como o Maranhão, em contextos como estes, marcados por fortes instabilidades e
desequilíbrios sistêmicos e pela financeirização e globalização dos mercados?
O
momento presente evidencia que não há a menor possibilidade, nem no presente e
nem no futuro, de que a economia real e a do trabalho sejam dispensáveis na
nova ordem mundial que certamente nascerá da atual crise global. Em lúcidas
ponderações, Boaventura Santos afirma
que não se trata de desglobalização. Segundo o autor, o que está em curso são
mudanças na atual forma de globalização, cuja conseqüência principal deverá ser
o surgimento de modificações na globalização dos movimentos sociais. Um
contexto altamente favorável ao surgimento de uma nova centralidade para as
questões nacionais e regionais, implicando em novos padrões de governança que,
concretamente, fortalecerão os papéis do regional, do nacional, do estado, dos
partidos políticos e nas políticas de alianças entre as nações, com vistas a
uma nova cooperação e a um novo relacionamento internacional.
As
lições aprendidas recentemente, a partir dos cenários já evidenciados, deixam
claro que a valorização social do desenvolvimento econômico endógeno, hoje e no
futuro imediato, dependerá muito mais de seus conteúdos éticos do que ganhos infinitos
de uma minoria nos mercados financeiros globais. Não bastará, nesta nova
sociedade, que certamente virá, apenas a flutuação das bolsas e pregões ou
mesmo o domínio de técnicas e métodos avançados, se o desenvolvimento não
estiver referenciado na equidade social, sobretudo nos compromissos com o
desenvolvimento humano e sua sustentabilidade.
Definitivamente,
a globalização atual não é ou será um fenômeno mundial perene, que se aplica a
diferentes realidades, portanto algo inexorável, não restando aos países outras
alternativas, a não ser se inserirem nessa nova ordem mundial hegemônica.
Os
últimos acontecimentos atestam que a globalização é, sobretudo um fenômeno
econômico decorrente de um sistema de poder que interessa, sobretudo às grandes
potências mundiais e seus aliados dos setores hegemônicos, as quais,
confirmando tudo isso, saem agora em socorro dos bancos de investimento, das
grandes sociedades hipotecárias e das maiores seguradoras do mercado mundial,
com isso buscando evitar a quebradeira geral, que seria fulminante para
desorganizar o referido sistema de poder.
Nesse
sentido, local e global não devem ser vistos mais como a mesma coisa, embora
nunca tenha havido global sem local e vice-versa. Ou seja, há também um imenso
mercado de trabalho para o país, em suas regiões geográficas, em seus estados
federados e nos seus milhares de municípios. O que se precisa fazer é lutar
para que o desenvolvimento econômico do país se faça de dentro para fora, para
que não fique dependente das circunstâncias e dos fluxos externos de capitais.
Nesse novo contexto em construção, o desenvolvimento endógeno regional e
nacional assume assim posição determinante.
A
valorização do desenvolvimento econômico real decorrerá também da capacidade
que se tiver de desenvolver nas comunidades as potencialidades do conhecimento,
fazendo surgir novas oportunidades de emprego e geração de novas tecnologias
que aproveitem o potencial de recursos naturais disponíveis. A existência é
sempre criadora, mesmo quando parece repetir-se ciclicamente. Pensar o
desenvolvimento como algo que dependa exclusivamente da inserção nos mercados
globais impedirá de criar novas alternativas de superação do atraso.
Deve-se,
mais do que nunca, ter o otimismo como bandeira, sem deixar, contudo, de
prestar atenção nos sinais mais evidentes do mundo real que apontam para a
desesperança e para o fim das utopias.
Como
brasileiros e maranhenses é preciso manter o compromisso histórico de lutar
pelo desenvolvimento sustentável e pela soberania do país e do estado natal.
Para as novas gerações e para os menos jovens, o leque de desafios continua
muito grande. Não é hora de desistir. É hora de continuar, é hora de insistir
em favor de um país mais justo e desenvolvido e de um Maranhão que lhe siga os
passos.
2
UMA CARTOGRAFIA PARA O PENSAMENTO INQUIETO
Em
menos de cinqüenta anos os brasileiros construíram a economia de uma nação que
deixou de ser o 48o PIB do mundo, um país periférico no cenário internacional,
que exportava pouco mais de 1 bilhão de dólares, onde o café representava 50%
do total, passando a figurar, nos dias de hoje, entre as 10 maiores economias
do mundo. Um país que atingiu médias de crescimento anuais em todo o século XX
só superáveis pela China. Um país que produziu economistas geniais como Caio
Prado Junior, Octávio Gouveia de Bulhões, Eugênio Gudin, Ignacio de Mourão
Rangel, Celso Furtado, Mário Henrique Simonsen, Conceição Tavares, e tantos
outros de grande valor.
Mas
ainda há um lado nebuloso, sombrio, que impede uma comemoração plena. Trata-se
do Brasil das desigualdades sociais e regionais, da concentração de renda, do
desemprego, das dívidas interna e externa, dos problemas energéticos, das altas
taxas de juros, e muitos outros problemas que colocam o país em permanente
posição de alerta interna e externamente.
Nos
últimos cinqüenta anos de construção do desenvolvimento brasileiro passou-se da
crença geral que a solução dos problemas brasileiros dependia da
industrialização e da modernização das forças produtivas para uma outra, que
durou até recentemente, de um alentado desencanto com o futuro do país. Por
tudo isso, o maior desafio dos brasileiros, para os próximos anos, é,
indubitavelmente, contribuir para a concretização de uma economia nacional
próspera e sustentável. É com essa perspectiva que o planejamento do
desenvolvimento do Maranhão deve trabalhar.
Não
dá mais para aceitar que a história do Brasil e do Maranhão é uma história de
constantes esperas, de constantes adiamentos. Muitos ainda acreditam que nunca
o país completa aquilo que começa a fazer. Oscila-se muito entre utopias e
distopias. Há algo nascendo todo dia nesta terra e ainda são bem poucos os que
conseguem perceber. Para a maioria tudo parece imóvel e resistente ao tempo.
Quais
as novas rotas para a utopia, que, segundo a pedagogia freireana, se
caracteriza mais pela capacidade de anúncio e de denúncia do de negação da
realidade? Mais do que em qualquer fase da história é urgente começar a montar
a cartografia para o encantamento e para a transformação da realidade. O IMESC
vem assumindo esse compromisso inadiável e se esforça para contribuir
concretamente. Um dos seus papéis mais significativos será propor cartografias
para o pensamento inquieto.
3
O IMESC COMO COMUNIDADE AMPLIADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
No
Brasil vive-se o calor de uma nova valorização das pesquisas e estudos socioeconômicos
aplicados que, independentemente das vontades e desejos presumíveis, afetarão
os velhos paradigmas e estimularão a produção de novos.
É
cada vez mais consensual entre os gestores que as instituições de pesquisa
aplicada, sejam quais forem suas formas de organização, deverão desenvolver uma
pesquisa de qualidade, associada à produção científica e tecnológica, bem como
à manutenção de vínculos sólidos com a comunidade, expressos em ações que
demonstrem responsabilidades sociais.
O
IMESC poderá ser uma das respostas a esse desafio. É um projeto em construção
e, como tal, fatalmente passará por estágios de legitimação técnica, além da
verificação de sustentabilidade institucional. O recurso mais importante a ser
captado agora, para torná-lo viável é o sonho, o desejo, o encantamento. Outros
recursos são também indispensáveis, como equipamentos e infra-estrutura física,
cada vez mais apropriados ao seu desenvolvimento.
A
proposta inicial para o IMESC é que se institua como comunidade ampliada de pesquisa,
uma modalidade de pesquisa-intervenção que busca a construção do conhecimento a
partir das experiências concretas dos pesquisadores em seus ambientes de
trabalho e contextos maiores. Para começar não se dependerá fortemente de
recursos externos, só da riqueza existencial que cada um possui e guarda como
tesouros valiosos.
Desde
o início do processo de recriação vêm sendo discutidas e aprovadas as idéias
centrais, objetivos, estratégias, metodologias, etc.; em segundo lugar,
oficinas de futuro vêm sendo realizadas, voltadas à construção de projetos
coletivos, culminando com o desenho de espécies de árvores dos sonhos, para, em
seguida identificar as “pedras no caminho”, aquelas que dificultam atingir
desejos coletivos; em terceiro lugar, são mantidos diálogos sobre as razões e
fundamentos dos problemas e dificuldades que fazem com que as pedras entrem nos
sapatos ou maltratem os pés dos caminhantes, sendo uma viagem em busca de
informações e conhecimentos que auxiliem a conhecer a realidade; em quarto e
último lugar, vem a necessidade de elaborar a cartografia das ações a serem
realizadas e sobre o que é necessário para poder realizá-las e
concretizá-las.
Os
tópicos mapeados são trabalhados sob diferentes enfoques e metodologias. O
primeiro passo é organizar seminários de estudos em que os temas mais
prioritários são examinados coletivamente e como os mesmos são tratados na
literatura nacional e internacional. São indispensáveis também realizar
oficinas de escrita compartilhada, onde os pesquisadores e analistas exercitem
suas autorias e co-autorias. Tudo isso poderá levar o IMESC a um processo que
Célia Linhares denomina de “sistematização aprendente de saberes, conhecimentos
e fazeres.”
As
primeiras experiências de comunidades ampliadas de pesquisa ocorreram na
Itália, nos anos 1960 e 1970, envolvendo representantes do movimento sindical e
grupos de profissionais que buscavam transformar ambientes de trabalho nocivos
em ambientes saudáveis. As comunidades procuram assim articular os saberes acadêmicos,
formais, científicos e os saberes informais, buscando ir além da simples
separação entre ambos. Todos os atores se tornam co-autores da pesquisa,
portadores de saberes específicos. Suas raízes teóricas estão nos italianos
Antonio Gramsci e Ivar Oddone e, no Brasil, em autores como Célia Linhares,
Maria Elisabeth Barros de Barros e Victor Vincent Valla.
A
metodologia não separa, portanto, sujeitos e objetos de pesquisa. Pierre Lévy
conceitua o método como “ecologia cognitiva”, pois reconhece como portadores de
história, sonhos e projetos tanto os seres humanos como as coisas que os
cercam, formando o que Célia Linhares denomina de “um coletivo misto e impuro,
depositário de formas ampliadas de comunicação e pensamento”. Exemplifica com
os versos de Chico Buarque: “Morena de Angola/que tem um chocalho/amarrado na
canela/ninguém sabe se é ela/que mexe com o chocalho/ou é o chocalho que mexe
com ela”.
A
pesquisa-intervenção, por outro lado, visa desenvolver questões e
problematizações que levem ao entendimento das situações presentes no ambiente
e das maneiras de como superá-las. Como implica na formação de comunidades
ampliadas de pesquisa, a ação de investigar, pesquisar não se restringe a
técnicos especializados em ações isoladas. Implica, pois a necessidade da
pluridisciplinaridade e na pluriprofissionalidade, além da autonomia coletiva
dos participantes. No IMESC, a convivência intelectual entre pesquisadores
experientes, especialistas, técnicos recém formados e estagiários transcorre de
modo promissor.
As
comunidades poderão ser a contribuição inicial do Instituto à luta pelo resgate
das utopias, numa hora em que o mercado tem poderes dilapidadores do sentido da
existência humana e da vida em sociedade. Pode ser também a fonte de energias
para que a Instituição cresça e cumpra o seu papel de fomentador de viveiros
onde serão fertilizados conhecimentos úteis e necessários ao enfrentamento dos
desafios ligados à conquista da sustentabilidade do desenvolvimento maranhense.
4
A RETOMADA DOS ESTUDOS CONJUNTURAIS
O
economista Felipe de Holanda, colaborador destacado do IMESC, um dos mais
brilhantes profissionais da área, vinculado à Diretoria de Pesquisa, sob a
direção primorosa e competente de Hiroshi Matsumoto, mestre de várias gerações
de economistas maranhenses, contando com o apoio do técnico Dionatan Carvalho e
colaboração de Tibério Martins, Sadick Nahuz, Wallison Ferreira Lima e Ana
Theresa Boueres, reinauguraram os
estudos conjunturais no âmbito institucional, herdeiro que é o IMESC do antigo
Instituto de Pesquisas Econômico-Sociais
Informática – IPEI.
Há
o reconhecimento na literatura de que o conceito de conjuntura nasce ao redor
da metade do século XIX, quando os estudiosos da economia descobrem que as
crises econômicas mantinham regularidade e periodicidade.
Ao
longo dos anos os estudos técnicos sobre a matéria evoluíram muito, reforçados
pela era dos computadores e dos bancos de dados públicos e corporativos.
O
que se espera hoje do analista conjuntural é que, no mínimo, tenha o domínio da
teoria e da metodologia pertinente a essa área do conhecimento. Embora se saiba
que a análise de conjuntura, mesmo largamente praticada, ainda não tenha
conseguido, pelo menos no Brasil, se instituir como um campo diferenciado e
claramente reconhecido nos ambientes acadêmicos da Ciência Econômica, da
Ciência Política e também da Sociologia.
No
âmbito da economia, por seu turno, desde o início do século XX, a análise
conjuntural já começava a dar os primeiros passos. O marco emblemático dessa
afirmação está no ano de 1917, quando é criado o Comitê de Pesquisa Econômica
da Universidade de Harvard, e são divulgados os resultados do seu pioneiro e
reconhecido "barômetro econômico".
No
caso brasileiro, a análise de conjuntura foi um instrumental muito utilizado no
final da década de 70 do século passado, quando da reestruturação dos
movimentos sociais, por ocasião da saída do regime ditatorial, instalado em
1964. São várias as instituições e organizações da sociedade e organizações
não-governamentais que passam a desenvolver este tipo de atividade. Um dos mais
atuantes foi o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Socioeconômicas), sob a
liderança de Herbeth de Souza, o Betinho. A crise que se instalou na década de
90 reduz os trabalhos de análise conjuntural no país, vindo a se intensificar
novamente a partir dos anos iniciais do corrente século XXI, sobretudo com a
subida ao poder do governo Lula e a retomada do desenvolvimento econômico e
social em novas bases.
O
que entender, afinal, por conjuntura? Uma das mais comuns definições é a que
associa conjuntura a um recorte temporal de prazo curto. Surgem dificuldades:
em que consiste o curto prazo em política, em economia e em sociologia? O
primeiro esforço é ter clareza sobre qual a concepção de tempo com que se deve
operar. O tempo dos ciclos econômicos, como nos estudos inaugurais da
conjuntura econômica, ou o tempo cumulativo e ascendente de Marx ou Weber e
suas teorias macro-históricas? Lembrando ainda dos tempos contemporâneos, mais
operacionais, nos quais o trabalho do analista econômico consiste em, dadas
certas hipóteses, antecipar o que vai acontecer com elementos focais da
macroeconomia, como inflação, câmbio, juros, emprego, renda, entre tantos
outros, em um determinado ponto temporal, apoiando a tomada de decisões de
agentes públicos, empresariais e sociais.
Algumas
correntes também definem a análise de conjuntura como um estudo sobre as
possibilidades que existem na realidade, não se resumindo apenas a um estudo
“sobre” a realidade. Está claro que para fazer a interpretação sobre a dinâmica
conjuntural, muitos fatores atuam ao mesmo tempo, a começar pela própria
intencionalidade de transformar a realidade por parte dos analistas, o que
pressupõe não ser possível captar os fenômenos explicativos da conjuntura sem a
recorrência a instrumentais analíticos consistentes. Outro aspecto é que
análise conjuntural implica uma visão de mundo, logo está associada a uma
análise que passa também pela dimensão estrutural, tornando-se muito difícil
construir a análise sem procurar as articulações e os nexos entre o
institucional e o estrutural, dentro de uma perspectiva sintetizadora.
A
análise conjuntural implica, portanto em várias escalas: pode ir dos domínios
do poder local e atingir o estadual, o regional, o nacional e o internacional.
Isso é importante porque quanto maior a escala de tempo escolhida, maior a
dificuldade de análise dos fatos e acontecimentos.
Além
do mais, os estudos e análises conjunturais articulam o hoje, o ontem e o
amanhã com a intenção de abrir a projeção de cenários esperados e possíveis. A
capacidade intuitiva e a criatividade do analista conjuntural contam muito,
portanto. Sem uma análise que abra novas projeções sobre a realidade, perde-se
o valor político para a práxis.
Vê-se,
assim, que o trabalho do analista envolve atividades relacionadas à análise de
conjuntura e à construção de cenários prospectivos. Para tanto, exige preparo
profissional para interpretar e formular diagnósticos sobre a situação
conjuntural, bem como para a elaboração de análises prospectivas e aplicação às
estratégias de desenvolvimento das políticas públicas, empresariais e
societais.
É
também quase impossível elaborar estudos e análises sobre a conjuntura, onde se
inclui a dimensão econômica, sem levar em consideração a questão política,
requerendo dos analistas uma base mínima, conceitual e teórica, conjugada a uma
experiência, ainda que mínima, em análise de conjuntura e cenarização. Sem
esquecer os instrumentais básicos, vinculados aos fundamentos teóricos,
metodológicos e conhecimento institucional, sem os quais o profissional da área
terá muita dificuldade para identificar as variáveis e informações relevantes,
lado a lado com a prática de utilização destas informações.
Para
o bom desempenho do seu trabalho, especialmente aqueles que fazem a análise da
conjuntura econômica, devem aperfeiçoar-se sobretudo nos seguintes campos de
estudo:
a) Nos fundamentos macroeconômicos para a análise conjuntural, com
o objetivo de conhecer os elementos de teoria macroeconômica que permitem: a)
compreender a dinâmica cíclica de economias de mercado, a ação da política
econômica e o funcionamento do sistema financeiro; b) nos instrumentos teóricos
necessários para a definição de métodos de previsão de curto, médio e longo
prazo;
b) na análise de conjuntura econômica brasileira (e maranhense, em
especial ), procurando relacionar os fundamentos estruturantes da realidade
econômica com a dinâmica das decisões tomadas nos vários contextos, sempre
procurando identificar as repercussões e impactos na sociedade e na economia
sob análise;
c) na análise da conjuntura econômica internacional, objetivando
conhecer o quadro geral das principais instituições e regras que regem as
relações econômicas internacionais, bem como os atores e variáveis
determinantes a serem acompanhados para se ter condições de entender o
movimento atual e as tendências da economia mundial;
d) em métodos e práticas de construção de cenários macroeconômicos,
com a finalidade de introduzir as principais técnicas de análise prospectiva e
suas aplicações à construção de cenários macroeconômicos, com ênfase central
na integração entre a ferramenta de
cenarização e a elaboração de modelos econômicos. Vindo em seguida a
apresentação das relações entre a geração de visões qualitativas sobre o futuro
- a partir das quais são fixadas as variáveis exógenas – e sua aplicação a
modelos de consistência macroeconômica;
e) em métodos quantitativos com o objetivo de conhecer os
principais conceitos estatísticos relacionados a compreensão e a crítica de fatos conjunturais
de natureza econômica. Seu foco será voltado para a construção e interpretação
de indicadores econômicos e a análise de séries econômicas. Realce especial deverá
ser dado ao emprego de matrizes de insumo-produto para a realização de
simulações.
Dois
outros campos de investigação são importantes para o desenvolvimento dos
estudos conjunturais. O primeiro está ligado ao conhecimento e estudo das
estratégias corporativas empresariais, no qual foca-se a questão da estratégia
empresarial desde uma perspectiva associada à gestão das organizações, buscando
apresentar abordagens contemporâneas de análise e de gerência estratégicas.
O
segundo campo é o associado à análise da conjuntura política, como já destacado
anteriormente, com o objetivo de focar alguns conceitos e informações que
contribuam para a incorporação da dimensão política na análise da conjuntura. É
quando são examinados aspectos que, embora não tratados especificamente no
âmbito da economia, interferem sobre as decisões de política econômica e sobre
os próprios rumos dessas atividades.
Além
dos aspectos mais teóricos e metodológicos vistos anteriormente, outros de
natureza mais organizativa devem ser considerados para o desenvolvimento da
área de análise conjuntural. A começar pela necessidade de um marco teórico,
como também já referido, ou seja, de um campo de conhecimento abordando teorias
sobre a sociedade, sobre a história e a política, por exemplo. Conhecimentos
sobre a formação social, cultural e político econômica do Brasil (e do
Maranhão) e a história de luta dos movimentos sociais são indispensáveis.
Outra
providência a considerar, na linha da organização da área de estudos
conjunturais é a que se refere à informação. A análise de conjuntura depende de
um grau avançado de informações sobre vários campos da realidade. Neste
sentido, é importante se ter fontes de informação, sobre pessoas, dados, fatos
e contextos.
Nunca
perder a preocupação com a definição de escalas de tempo e espaço nas análises
conjunturais, como já tratado também anteriormente. O corte temporal pode
variar do marco zero ao infinito. O problema é que, quanto maiores as escalas
de tempo e espaço, mais complexas tornam-se as análises.
O
analista da conjuntura econômica, embora focado apenas em uma dimensão do
fenômeno, não pode perder a noção da totalidade. Além de não perder essa
referência maior, a análise da conjuntura será sempre processual. O fenômeno
analisado se insere em um contexto mais amplo e o seu movimento obedece a um
determinado ritmo processual.
Pelo
que se viu, de modo muito sintético, a análise conjuntural é uma análise de
fatos e acontecimentos. Há um cenário no qual os acontecimentos se processam.
Decorre daí a importância de qualificar os cenários em um tempo e espaço. Desde
simples espaços de rua a outros mais complexos, como os espaços e tempos
institucionais.
Espaços
fechados ou abertos, de elite ou de massa, ativos ou passivos. Atuam também
atores individuais e coletivos. Os principais atores serão sempre os coletivos,
os grupais, e outros. Sem deixar de reconhecer que existem atores individuais
que têm ou poderão ter importância histórica. Não esquecer jamais a análise da
relação de força – qual força tem esses atores numa perspectiva mais política?
Que capacidade operativa possui a sociedade para desenvolver determinadas
ações, com poder de modificar a relação de forças dominante?
Por
fim é preciso construir a síntese – requer clarividência, conhecimento e
experiência no sentido de articular uma visão de estrutura com a conjuntura. A
práxis política se baseia na capacidade de antecipação, não esquecer disso.
5
ANÁLISE CONJUNTURAL E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DESMISTIFICADOR
O
objetivo maior de áreas de estudos conjunturais em institutos de pesquisas
socioeconômicas aplicadas, vinculados ao planejamento do desenvolvimento é
contribuir para a construção de conhecimentos sobre a realidade na qual atuam,
dentro de uma perspectiva de aplicabilidade às políticas públicas.
Além
disso, em lugares como o Maranhão, nos quais ideologias e dogmas possuem muita
força, produzir conhecimentos mais consistentes e apoiados em bases
científicas, assume um papel relevante e estratégico.
Foi
dentro desse prisma que o IMESC foi gestado por seus idealizadores e
fundadores: um lugar especial, com idoneidade ética para herdar o legado de
seus institutos antecessores (IPEI, Fipes e IPES) e com capacidade intelectual
suficiente para passar a limpo a formação social maranhense, despindo-a dos mitos
e assombrações.
Não
será obra que se concretizará em pouco tempo. A pauta a ser enfrentada é das
mais complexas, pois suas raízes mais profundas estão sob pedras que se
misturam nos labirintos escuros de mentalidades extraviadas no tempo. Mas não é
impossível encontrar a rota que levará à saída dessas cavernas sombrias. As
duas grandes universidades públicas do Maranhão – UFMA e UEMA – apesar das
dificuldades, nunca deixaram de trabalhar e contribuir nessa missão heróica.
Não há como desconhecer que a produção intelectual mais expressiva sobre o
Maranhão passou sempre por seus departamentos acadêmicos e por seus
pesquisadores e estudiosos de um modo geral.
Assim
como, desde quando começou a atuar, mais precisamente nos primeiros anos da
década de 70 do século passado, o complexo IPEI/FIPES/IPES foi responsável por
uma das mais relevantes produções sobre os problemas e desafios do
desenvolvimento maranhense, produção esta que se manteve viva até meados dos
anos 80 do referido século, quando se inicia a derrocada do aludido complexo
institucional, fazendo com que sua produção entrasse em franco declínio.
Os
tempos são outros. Todos amadureceram: a própria viagem e os viajantes. O
Maranhão não tem mais o rosto que tinha há 50 anos atrás e aqueles que naquela
época mal sabiam caminhar, hoje já têm pernas gastas e mãos calejadas de tantas
idas e vindas em jornadas incessantes vida à fora.
A
lição maior aprendida nesse balançar sem fim do relógio do tempo impassível é
fazer com que a criação do IMESC, a sua missão cívica e o seu compromisso
político-institucional, se materializem para a consecução do objetivo comum de
transformar os estudos conjunturais em instrumentos capazes de colaborar para a
modernização e democratização desse Estado, no bojo das quais novas
interpretações, plenas de veracidade e criatividade, desconstruam os mitos e
assombrações e o Maranhão possa, finalmente e definitivamente, ingressar no século XXI.
Para
isso é preciso mente inquieta e coração de estudante. Um dos maiores desafios
para a análise da conjuntura maranhense é compreender as inter-relações das
partes com o todo. O que só será possível de obter se houver um mapa que
possibilite viajar na realidade circundante e nas outras mais distantes e muito
mais impenetráveis.
O
caminhante precisa ser metódico. Jamais deverá se deixar fascinar pelo
reducionismo maniqueísta e muito menos pelo dualismo simplista, ou ainda, se
apaixonar pelos trejeitos da ideologia da decadência maranhense, tão poderosa
que foi capaz de enlaçar inúmeras gerações de conterrâneos.
Na
mesma direção, não se tornar prisioneiro de análises simplistas, aparentemente
mais fáceis de fazer e até mesmo de convencer, mas muito difíceis de merecer
atenção nos círculos mais exigentes ligados à produção do conhecimento. O
simplismo não consegue captar a essencialidade dos fenômenos sob foco, sejam
eles econômicos, sociais ou políticos.
O
resumo de tudo, é que análise de conjuntura é muito mais análise de conjunto do
que uma análise de corte temporal curto. É sobretudo a intensidade e
profundidade do olhar sobre o conjunto do que a preocupação com a perspectiva
temporal da análise, que sempre será importante, mas jamais será o essencial.
O
engenho e a arte do analista da conjuntura se manifesta toda vez em que for
capaz de reger, de forma harmônica, um grande número de variáveis econômicas,
sociais ou políticas, que se encontram em relações complexas e múltiplas,
produzindo uma peça consistente de argumentos capazes de explicar o
comportamento dinâmico dos fenômenos sob investigação. Quando isso acontece os
mitos e as assombrações não farão mais sentido e desaparecerão no horizonte que
se vai abrindo. E uma nova melodia inquietará os espíritos, estimulando-os a
prosseguir, sempre.
terça-feira, 28 de março de 2017
UMA ARQUEOLOGIA DO PLANEJAMENTO DO DESENVOLVIMENTO
por Raimundo Palhano
Acaba de sair das máquinas de fiar
livros, a edição impressa do primeiro volume da Biblioteca Básica Maranhense –
BBM, iniciativa das mais relevantes da atual gestão da Secretaria de Estado da
Ciência, Tecnologia e Inovação – SECTI, uma das joias da coroa do atual governo.
Trata-se da obra “Planejamento e Desenvolvimento do Maranhão: contexto
histórico, obstáculos e estratégias de superação”, de autoria do historiador e
educador Jhonatan Almada, atual dirigente da mencionada Secretaria. Valorizando
a obra, o estimulante e lúcido Prefácio do economista e professor da UERJ, Dr.
Elias Jabbour, intelectual respeitado nacionalmente e que tem uma admiração
comovente pela obra do genial maranhense Ignacio Rangel.
A
ideia de uma primeira biblioteca básica para o Maranhão contemporâneo, tanto em
cronologia, como em interpretação, nasceu da cabeça iluminada de Rossini
Corrêa, numa tentativa de reviver, com mais rigor e mais vigor, a tradição dos
antigos “Grupos Maranhenses”, formados por intelectuais fundadores da erudição cultural
e literária desta terra. A diferença entre a antiga biblioteca, que vem desde
meados do século XIX e a atual é o seu compromisso visceral em colocar o
Maranhão do avesso. A ideia não é continuar erigindo mitos, mas interpelar as
razões consagradas. Na perspectiva dos promotores, o objetivo é catalogar e
editar no mínimo 100 obras que ajudem a decifrar o Maranhão e seus enigmas
recorrentes, muitos deles assustadores.
Em
breve sairão mais 3 volumes, que, juntos ao primeiro, serão lançados ao
público, na ilha e no continente, em saraus concorridos, para atrair a
inteligência local e as novas gerações para mais esse importante desafio. Os
empolgados com a ideia da BBM a estão denominando de a nova enciclopédia maranhense, pois nascida da fusão das culturas
luso-afro-timbira, gestada em nosso meio faz tempo, abrindo espaço para novos cenários
e novos grupos maranhenses, dando continuidade inovadora a uma tradição
interrompida.
O volume I é um verdadeiro e inteligente
inventário sobre as origens e o processo de implementação do planejamento
governamental das políticas públicas, desde que começou no Brasil e neste Estado,
isto a partir de pouco antes da metade do século passado. O autor realiza, com
maestria, a difícil arte de sintetizar as características dos dois processos, o
nacional e o estadual, apoiado em bibliografia adequada e confiável e em fontes
primárias por ele sistematizadas.
Originalmente
um artigo técnico publicado pelo IPEA, que passou por um acabamento meticuloso,
veio a transformar-se em um conteúdo precioso e garantido sobre o papel do estado
e seus agentes na difícil e complexa arte de governar, de modo técnico e
racional, o processo de desenvolvimento nacional e de desenvolvimento estadual,
sujeitos que sempre foram a contextos marcados por disputas permanentes entre interesses
particulares e corporativos, em que as aspirações e necessidades coletivas têm
sido sobretudo tratadas como retórica.
Reconstrói
com muita lapidação os primeiros passos do planejamento estatal no Brasil e no
Maranhão, disponibilizando todos os instrumentos que foram utilizados para tal
fim, identificando falhas e razões, apontando também causas e consequências das
decisões tomadas pelos governos, indo desde a metade dos anos 1900, até o tempo
presente, traçando os contornos das iniciativas estratégicas do atual grupo
político que ascendeu ao trono em Brasília e em São Luís.
Não
há como negar que a principal ameaça à efetividade do planejamento
governamental, como estratégia para a promoção do desenvolvimento, se deve ao
fato do mesmo não dispor de um poder especial que lhe garanta autonomia para intervir
na implementação das políticas públicas. Esta circunstância acabou nivelando o planejamento
às outras estruturas da gestão pública, favorecendo a redução de sua
capacitação técnica para liderar as transformações econômicas e sociais.
Temos
afirmado, no que o autor não discorda em seu texto, que o modo como o Maranhão
tem se desenvolvido, marcado pela incapacidade dos governos oligárquicos de resolverem
os problemas sociais sob suas responsabilidades, configurou uma situação
macroeconômica em que a capacidade de investimento do estado é cada vez menor,
portanto insuficiente para provocar o crescimento sustentado das forças
produtivas e de seus arranjos.
Por não ter enfrentado com
a devida atenção o planejamento do desenvolvimento de médio e longo prazos,
sabe-se pouco sobre o que será o Maranhão quando for um estado grande. A
preocupação com o imediato, com o prazo curto, tem feito com que os governos
estaduais e municipais descuidassem dos termos de pactuação com os setores
produtivos e empresariais que se instalaram no território maranhense, sejam
multinacionais ou nacionais, levando a que pouco resultasse para a economia
local e para as finanças públicas as suas presenças físicas no estado.
As reflexões produzidas
pelo autor do livro deixam evidentes que é preciso que se supere a íntima
relação que tem havido entre o imediatismo dos governos e as formas inorgânicas
e centralizadas de gestão da administração pública. Um sistema de governo
altamente imediatista não precisa de planejamento global e permanente pois se
baseia em decisões pontuais e fechadas, sem a audiência da sociedade.
Temos afirmado que governos
que não governam para a sociedade podem se dar ao luxo de planejar o Maranhão
das suas coberturas, sem ter que ouvir as ruas, os bairros, os povoados, os
municípios ou as regiões. A consequência desse processo tem sido o atraso da
economia, da educação, da saúde, da cultura e da política maranhense, a ponto
do Maranhão, quando visto sob a ótica dos números, ostentar resultados
calamitosos, apesar de sinais da busca de superação pelos atuais governantes.
Trabalho
próximo a Jhonatan Almada faz 10 anos. Conheci-o antes disso. Acompanho o seu
desabrochar pessoal bem de perto desde então e muito me impressiona a sua
capacidade meteórica. Creio que este fato levou o Governador Dino, que também
roda na velocidade da luz, a escolhê-lo para integrar o seu projeto de
renovação e formação de uma nova camada dirigente neste Estado.
O livro que vai a lume, a
Biblioteca Básica Maranhense, a Rede Ciência Maranhão, o revolucionário IEMA, o
Centro Ignacio Rangel de Estudos do Desenvolvimento, para ficar nestas
iniciativas de grande impacto, confirmam o emergir de um dirigente sólido e de
um intelectual altamente promissor, maduro antes do tempo, que já deixa uma
marca indelével em nosso meio cultural e científico, encarando de frente os
desafios de ser reconhecido em uma era sob a influência determinante dos tempos
líquidos.
Os
sinais da surpreendência e do visionarismo do autor estão exarados em sua
festejada obra, que em breve se divulga. Com cerca de 16 anos de idade,
inquieto como seus ilustres conterrâneos caxienses do passado, o autor da obra
inaugural da coleção, elabora, e agora os publica, dois planos de
desenvolvimento, um para o Maranhão e outro para Caxias. Chegou ao requinte de
eleger os eixos temáticos, os planos, programas e projetos para cada um,
dando-se ao luxo de fixar os montantes financeiros para cada uma das políticas
a serem implantadas. O mais curioso de tudo: nos dois planos, o jovem
planejador atribui à ciência e à tecnologia um papel fulcral para o desenvolvimento
do torrão maranhense!
Em 2009 escrevi a Jhonatan
um bilhete, no qual lembrava que “Antonio Vieira reportava-se ao Maranhão como
uma cidadela (rochela) de Portugal, formada por campos de almas hereges que
precisam ser conquistadas e catequisadas. O tempo passou e o Maranhão enfrenta
uma luta tenaz para afastar o domínio dos catequéticos e administradores da
salvação. Basta ler a decantada Coluna de Domingo que ali encontramos,
cristalino, o discurso homilético na versão dos novos tempos. Pobres e resignados
maranhotos”.
Terminei o texto
aconselhando paciência e que fosse brincar o São João!
Ele não me ouviu e
continuou, sem dar tréguas, a perseguir, como um raio, o seu destino, escrito
nas estrelas: concretizar aqueles dois planos de desenvolvimento, escritos aos
16, só que agora, com muita serenidade e invejável determinação.
terça-feira, 21 de março de 2017
O PAPEL DA UNDIME NO CONTEXTO DA POLÍTICA DE MUNICIPALIZAÇÃO EDUCACIONAL MARANHENSE
por Raimundo Palhano
1-ORIGENS E PRINCIPAIS REALIZAÇÕES
A UNDIME-MA é uma
associação civil, sem fins lucrativos, dotada de autonomia financeira e
patrimonial, tendo como sede e foro a cidade de São Luís-MA. Vincula-se à União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME, entidade nacional, com
sede e foro em Brasília, que congrega os
Dirigentes Municipais de Educação-DME de todo o Brasil.
O objetivo básico
do movimento é articular formulações coletivas de políticas municipais de
educação e o desenvolvimento da gestão dos sistemas municipais de ensino. É,
pois, um órgão de representação, articulação e apoio aos interesses da educação
municipal, voltado a propiciar formação e suporte instrumental aos DME, na
busca de um padrão de educação pública que seja democrática e de qualidade,
comprometida com a expansão e o desenvolvimento da cidadania.
A formalização
institucional da entidade maranhense ocorreu em 04 de maio de 1987, data da
publicação, no Diário Oficial da Prefeitura Municipal de São Luís, do seu
primeiro Estatuto, com a denominação de União Maranhense dos Dirigentes
Municipais de Educação. Apesar dos mais de quatorze anos de existência, só
adquiriu personalidade jurídica em 03 de novembro de 1998, quando o atual
Estatuto, datado de 29 de maio daquele ano, foi registrado em Cartório de
Títulos e Documentos de São Luís.
Dentre as mais
importantes atividades e serviços prestados pela UNDIME-MA, visando atingir os
seus objetivos estratégicos, destacam-se:
a)
atividades
de formação e capacitação de Dirigentes Municipais de Educação, objetivando
contribuir para a melhoria do desempenho dos gestores municipais da educação,
tais como cursos, oficinas, treinamentos em serviço, etc.;
b)
realização
de eventos de mobilização e atualização coletivas, como campanhas, concursos, seminários,
encontros regionais e outros, abarcando os Secretários Municipais e os
principais parceiros;
c)
efetivação
de reuniões de planejamento, programação e análise, envolvendo a Diretoria
Executiva e as Coordenadorias Regionais da UNDIME-MA; interlocutores como a
GDH, o Escritório do UNICEF, o Ministério Público Estadual, o Conselho Estadual
de Educação, a Federação dos Municípios, entre outros, reforçando a
participação da entidade no acompanhamento de planos, programas e projetos
educacionais, em âmbito local e estadual;
d)
prestação
de assistência técnica, administrativa e informacional às Prefeituras
Municipais conveniadas, e demais, através da manutenção de um canal aberto às
demandas dos Secretários Municipais de Educação;
e)
manutenção
de uma linha editorial, composta pelo boletim UNDIME-MA Informa e pela série
Cadernos de Textos, os quais servem para ampliar a prestação de serviços do
órgão e divulgar suas principais atividades, circulando entre os 217 Municípios
e as principais organizações educacionais do Estado;
f)
desenvolvimento
de um padrão organizacional que assegure à instituição uma linha orgânica de
atuação, caracterizada pelo fortalecimento da Secretaria Executiva e das
Coordenadorias Regionais, como instâncias indispensáveis à geração de competências
técnicas necessárias à sua afirmação institucional.
Por tudo isso, a
UNDIME-MA vem cumprindo a sua missão social, legitimando-se como órgão de
representação da educação municipal maranhense, pelo papel que desempenha nas
instâncias de discussão, formulação e implementação das políticas municipais de
educação, bem como no seu gerenciamento, seja através de seus órgãos de direção
executiva e regional, seja por meio de seus representantes em colegiados
vinculados a entidades governamentais e da sociedade civil.
2- O
SENTIDO DA TRAJETÓRIA
Um dos maiores
desafios da sociedade brasileira neste início de milênio prende-se à
necessidade de imprimir qualidade aos seus sistemas públicos de ensino e à educação
nacional de um modo geral. Sem uma educação básica includente e de qualidade
para todos, o Brasil jamais será um país viável para a maioria de seu povo,
permanecendo nos limites de uma sociedade escandalosamente desigual.
Para que isso ocorra, uma das ações
inadiáveis vincula-se à importância que todos devemos dar ao desenvolvimento
sustentável da educação municipal, hoje responsável quase absoluta pela
educação infantil e detentora de um peso cada vez maior no atendimento do
ensino fundamental, chegando, em muitos Estados, incluindo-se o Maranhão, a
cobrir mais de 70% das matrículas nesse nível de ensino.
É inegável que
muitos avanços ocorreram nos últimos anos, graças, sobretudo, a iniciativas da
União, dos Estados, dos Municípios e da Sociedade Civil Organizada. A taxa de
escolarização do ensino fundamental atinge 96% dos jovens entre 7 e 14 anos, as
matrículas no ensino médio crescem expressivamente em âmbito nacional, além de
merecerem aplausos ações inovadoras e oportunas na área técnico-pedagógica,
como as vinculadas aos novos parâmetros curriculares nacionais, à avaliação do
desempenho acadêmico dos alunos, a planos de desenvolvimento da escola, além de
outras ligadas ao planejamento educacional, como o aprimoramento do sistema de
produção e distribuição de dados e informações estatísticas.
É nesse contexto
de inovações que se cria o FUNDEF, em fins de 1996, para implantação
compulsória em 1998. Saudado por muitos como uma fórmula quase mágica para
alavancar a combalida educação municipal, agora mais abastecida de novos e
pesados encargos, o referido mecanismo financeiro vem dando sinais de
fragilidade e de reversão de expectativas, sobretudo por uma crescente onda de
denuncismo, abrigada, com todas as letras, na grande e pequena mídia, pautada
em acusações gravíssimas de má gestão desses recursos pelos administradores
municipais, a quem se quer imputar a responsabilidade por um eventual fracasso
do programa.
Indo das mais
elementares desinteligências administrativas, às mais escandalosas práticas
gerenciais, incluindo-se suspeitas de apropriação indébita de recursos
públicos, as denúncias colocam em xeque a idoneidade dos gestores do Fundo e
motivaram, com justa razão, a instalação de Comissões Parlamentares de
Inquérito-CPI's nos quatro cantos do país, referendadas pela indignação da
opinião pública diante dos supostos descalabros administrativos.
Por outro lado,
pouca atenção vem sendo dada a problemas como diminuição da oferta de vagas e
falta de financiamento para educação infantil; reajuste médio do custo-aluno,
no âmbito do FUNDEF, aquém das necessidades reais da educação, e o
não-cumprimento da lei no que respeita à diferenciação do custo-aluno; recuo no
que se refere à instituição de um regime de colaboração entre Estados e
Municípios, em especial quanto à repartição de terços dos recursos do
salário-educação entre os municípios; redução crescente dos valores oferecidos
pelo FNDE nos PTA's relativos ao 1/3 do salário-educação, a ponto de em 1999 só
duas áreas de projetos terem sido conveniadas; e a necessidade de uma política
de financiamento que contemple a educação básica como um todo e não apenas o
ensino fundamental, como praticado atualmente. Além disso, é preciso defender e
apoiar, intransigentemente, todas as iniciativas da sociedade política e da
sociedade civil em defesa das verbas constitucionais da educação, sejam CPI's e
outras de iniciativa do controle social e do controle externo, e,
simultaneamente, repudiar todo e qualquer método de gerenciamento dos recursos
públicos que traduzam improbidade administrativa e firam a legalidade e os
princípios fundamentais da moral e da ética.
A
UNDIME-MA tem conclamado as autoridades estaduais e municipais, os integrantes
dos poderes legislativo e judiciário, a sociedade civil organizada, os
movimentos sociais, as comunidades escolares e a sociedade em geral a se
mobilizarem em favor do fortalecimento da educação pública municipal,
reivindicando políticas abrangentes de financiamento da educação básica como um
todo; cumprimento rigoroso da legislação do FUNDEF, através da revisão dos
valores atuais do custo-aluno e suas diferenciações, além da inclusão imediata
dos alunos jovens e adultos nos seus cálculos; regularidade nos repasses dos
recursos da merenda escolar, do Programa Dinheiro Direto na Escola e demais
convênios, sem o que a educação municipal não terá condições objetivas de
operacionalizar os seus encargos atuais e muito menos ainda os seus
compromissos futuros.
Por outro lado, os
desafios de construir uma educação pública de qualidade para todos neste país e
neste Estado vão muito além da superação dos atuais problemas com a gestão do
FUNDEF. Atribuir ao Fundo poderes messiânicos e punir de maneira arbitrária
gestores municipais da educação, em sua maioria despojados de recursos técnicos
e administrativos, por força de limitações estruturais do setor, longe de
representar um bem para a sociedade, pode levar ao cometimento de profundas
injustiças e à culpabilização da própria vítima, deixando ilesos outros
segmentos do poder público e da sociedade que também são formalmente
co-responsáveis pelo seu monitoramento e controle.
É nesse contexto que a UNDIME-MA define o seu compromisso social e passa
a ser uma força a serviço da mudança. Toma partido na luta pelo respeito à
autonomia da educação municipal e pela adoção de uma gestão democrática em
todos os níveis da política pública educacional. Aspira por um sistema de
ensino público capaz de mudar realmente o cenário social e cultural do
Maranhão. Por tais razões, o seu foco maior é o Dirigente Municipal de Educação.
Transformá-lo em um agente social efetivo a serviço da mudança é a sua
aspiração mais elevada. Para isso se propõe a trabalhar pela elevação do padrão
técnico e político do DME, tornando-o apto a exercer o seu papel de líder
consciente e competente para o exercício autônomo de seus encargos funcionais e sociais,
voltados prioritariamente para a construção de uma educação pública de
qualidade para todos.
3- PRINCIPAIS DESAFIOS
Segundo publicação
recente2, editada pela UNDIME Nacional, em
parceria com a UNESCO e Fundação Ford, são estes os principais desafios a serem
enfrentados pelo movimento dos Dirigentes Municipais de Educação:
a)Reduzir os desequilíbrios entre iniciativas de formação técnica e
de formação política. Os números deixaram bem nítido que os DME não
priorizam engajamentos em movimentos ou campanhas de cunho
político-institucional. É correta a estratégia da UNDIME de não ser confundida
como uma central sindical, sem o que já teria deixado de existir. No entanto,
sua condição de órgão de representação de interesses coletivos, exige uma arena
e uma agenda política para expandir-se;
b)Aprimorar o campo de atuação profissional do DME. É uma tarefa
das mais urgentes, embora de complexa implementação. A direção dos sistemas
municipais de ensino não pode ficar entregue a quadros despreparados técnica e
pedagogicamente. Urge que se dê um sentido orgânico aos papéis desempenhados
pelos Dirigentes Municipais de Educação enquanto condutores da política pública
educacional, neutralizando assim a forte inorganicidade ainda hoje presente no
cotidiano da grande maioria deles;
c)Adotar a gestão participativa como componente intrínseca do
processo de produção e implementação das políticas educacionais em âmbito municipal.
O modelo tradicional de gestão educacional tem se revelado ineficiente, caro e
inadequado, a ponto de colocar os indicadores educacionais do país em níveis
muito baixos em relação ao contexto internacional. O novo processo pode se
iniciar pela adoção generalizada de critérios técnicos, pedagógicos e
participativos para a escolha de dirigentes escolares, com o que se eliminaria
o predomínio do clientelismo e se asseguraria a escolha de profissionais
qualificados para a direção das escolas;
d)Organizar os DME para contribuírem na construção de uma nova
municipalização educacional que tenha como ponto de partida a autonomia dos
sistemas municipais de ensino. Começando pela defesa da descentralização do
poder decisório em todas as iniciativas de municipalização educacional, cujo
sentido e direção devem priorizar o
espaço escolar-pedagógico e não o complexo político-administrativo, como
normalmente ocorre. Sem autonomia municipal intrínseca não se completa o ciclo
necessário à existência efetiva de sistemas municipais de ensino e, sem isso,
não se rompe a cadeia que mantém a educação básica municipal em estágio inferior de desenvolvimento e em condições
permanentes de subordinação política. A nova municipalização da educação exige
pois a socialização do poder decisório e da gestão em todos os níveis, de tal
forma que as políticas públicas educacionais sejam ditadas pela maioria, ou por
consensos sociais legítimos, extraídos dos diversos setores que compõem o poder
local;
e)Ter sempre em conta que o problema educacional é uma questão
nacional, mesmo que o seu lugar de existência seja o município. Os
problemas que desafiam os DME só serão equacionados e superados se forem
assumidos e enfrentados pelos sistemas de ensino existentes no país. Sem regime
de colaboração entre eles, visando integrar políticas públicas e acabar com as
costumeiras ausências de articulação, os obstáculos não serão removidos. A
forma atual de concepção estrutural e organizacional do ensino público deixa
patente a necessidade de administração conjunta da educação básica. Sem um
regime de colaboração em que esse compromisso seja efetivado não se garante o
desenvolvimento dos sistemas de ensino tal como estão formalmente pensados;
f)Propugnar pelo aperfeiçoamento do atual modelo de financiamento da
educação fundamental e pela implantação de um novo que abranja a educação
básica em sua totalidade. Apesar do reconhecimento da importância do
FUNDEF, o atual modelo não supre as necessidades gerais do financiamento da
educação básica. A começar pelo reforço aos mecanismos de fiscalização
necessários ao cumprimento rigoroso do dispositivo constitucional de aplicação
exclusiva dos 25% das receitas de impostos e transferências em manutenção e
desenvolvimento do ensino. Além disso, é preciso maximizar as disponibilidades
existentes, destacando-se a incorporação do salário-educação e dos recursos de
convênios ao orçamento da área, descentralizar sua gestão, inclusive adotando a
gestão participativa do orçamento e das finanças, priorizando os gastos em
atividades-fim. Algo precisa ser feito urgentemente em favor de mais
disponibilidades de recursos para a educação infantil e para o ensino médio,
além das correções no atual modelo, o que implica dizer da conveniência e
necessidade de um novo padrão de financiamento para a educação básica como um
todo.
3.1- O Enfrentamento dos
Desafios
A UNIDIME-MA
cresceu não só quantitativamente, mas, o que é mais importante,
qualitativamente. Hoje é uma instituição reconhecida não só pelos Dirigentes
Municipais de Educação e pela sociedade, mas, igualmente pelas instituições
parceiras, onde se destacam: o Ministério Público Estadual, o Unicef, o
Conselho Estadual de Educação do Maranhão, a FUNAC, a FAMEM, o Instituto do Homem
e outras organizações governamentais e não-governamentais.
Uma UNDIME-MA cada
vez mais forte e necessária depende de duas coisas: primeiramente da
participação efetiva dos Dirigentes Municipais de Educação, do seu envolvimento
e de seu compromisso com os princípios e com a programação da Entidade e também
com as suas finalidades estatutárias;
depois, de sua vontade de colaborar para a sustentabilidade financeira e
material do Órgão.
Ainda é muito baixo o número de Convênios
assinados pelas Prefeituras com a UNDIME-MA. Urge que os Dirigentes Municipais
de Educação estimulem seus Prefeitos a colaborarem, pois estarão fazendo um
investimento altamente produtivo. São 217 Municípios no Maranhão e cerca de
5.600 no Brasil. Como seríamos mais fortes se todos firmassem Convênios com a
UNDIME, e como poderíamos ser muito mais eficientes do que somos hoje, se
tivéssemos mais recursos para implementar novos projetos e novas idéias!!
Mais do que nunca
se torna inadiável a consolidação da UNDIME-MA, seguindo uma tendência
nacional, como instância efetiva de articulação dos interesses da educação
municipal. Em uma conjuntura marcada por grandes exigências técnicas,
pedagógicas e administrativas postas aos municípios, em seu papel crescente de
gestores da política educacional, a existência de uma UNDIME-MA forte, técnica
e politicamente, representará um apoio indispensável ao sucesso das políticas
de municipalização da educação preconizadas pela Constituição Federal, pela LDB
e presentes nos programas do MEC.
Uma das formas de
afirmação institucional da Entidade, no seu papel de articuladora das políticas
municipais de educação, decorrerá de sua capacidade de gerar, produzir e
disseminar dados e informações que auxiliem o Dirigente Municipal a tomar
decisões e elaborar projetos de desenvolvimento. Nesse sentido, a manutenção e
desenvolvimento do banco de dados sobre educação municipal assumem peso
decisivo pois vem propiciando criação de mecanismos efetivos de atualização e
intercâmbio de informações entre as Secretarias Municipais de Educação e
subsidiando a elaboração de estudos, programas e projetos a cargo das redes
municipais de ensino. No estágio atual da sociedade, nenhuma instituição, seja
pública ou privada, governamental ou social, evoluirá, ou mesmo, se manterá
funcionando, se não dispuser de um eficaz sistema de informações. A existência
de informações técnicas representa uma ferramenta básica para remover
obstáculos a uma administração realmente eficiente, justamente aquela que busca
atingir níveis crescentes de recionalidade, com máximo grau de qualidade
social.
4- POLÍTICA DE ALIANÇAS
Em decorrência
desse seu papel de articulação e coordenação das ações educacionais no âmbito
municipal, a UNDIME Nacional e suas filiadas têm sido interlocutoras junto ao
MEC, aos governos estaduais e municipais,
a Agências Regionais, a instituições internacionais, como a UNESCO, o UNICEF, a Fundação
Ford, entre outras, além de diferenciadas instituições públicas e organizações
não-governamentais e da sociedade civil.
No caso específico
da UNDIME-MA, a sua malha de interlocução compreende o Escritório do UNICEF, as
Gerências de Desenvolvimento Humano-GDH e Desenvolvimento Social-GDS, a
Fundação de Apoio à Criança e ao Adolescente-FUNAC, o Ministério Público
Estadual, o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação
Comunitária- CENPEC, a Federação dos Municípios-FAMEM, o Conselho Estadual de
Educação, entre outros, além de órgãos não-governamentais e da sociedade civil,
como o Instituto do Homem, o Sindicato dos Professores do Maranhão, entre
outros.
Um parceria das
mais importantes para a UNDIME-MA é a que vem sedo feita com o Ministério
Público Estadual, através do Centro de
Apoio Operacional da Infância e da Juventude, a qual gira em torno da
implementação do Programa institucional “Educação: Direito da Criança, Dever de
Todos Nós”.
O Programa vem
realizando várias iniciativas marcantes,
as quais têm repercutido intensamente em todo o Estado do Maranhão, principalmente
pelo seu ineditismo e pelo seu conteúdo inovador, destacando-se os Encontros
Regionais de Educação e o programa das Teleconferências. Contando, ainda, com a
participação qualificada do Unicef, responsável pelo financiamento, e o apoio
de órgãos como a FAMEM, o Conselho Estadual de Educação, a FUNAC, o Sindicato
dos Professores, as Gerências Regionais, entre outros, o Programa do MPE visa
atingir todas as dezoito regiões administrativas do Estado. Os encontros
regionais têm o objetivo de materializar consensos sobre questões como
implantação de Sistemas Municipais de Ensino, Conselhos Municipais de Educação,
Fichas de Controle da Evasão Escolar,
Conselhos Tutelares e dos Direitos da Criança e do Adolescente, entre outros.
As Teleconferências, por seu turno, cobrem todo o Maranhão e podem ser
acompanhadas de qualquer parte do Brasil e mesmo do exterior.
4.1- A Parceria com
a ANPAE-MA
A tarefa histórica
voltada à construção de um poder
educacional local democrático e autônomo no Maranhão estimula uma efetiva aliança
institucional entre a UNDIME-MA e a recém instalada Seção Estadual da
Associação Nacional de Política e Administração da Educação-ANPAE, uma das mais
antigas e conceituadas associações científicas de administradores educacionais
do Brasil e mesmo da América Latina.
A responsabilidade
social da UNDIME-MA com a reinvenção da política pública educacional nos
municípios maranhenses exige da entidade vínculos permanentes e sólidos com o
meio acadêmico e com organizações promotoras do desenvolvimento científico e
tecnológico da educação.
Para que a
UNDIME-MA se afirme como portadora de mudanças é mais do que evidente a
necessidade de que se ultrapasse a luta meramente corporativa e que se
transforme numa instância capaz de formular e implementar projetos de direção
no campo das políticas públicas, passando a ser também uma instância produtora
de cultura na esfera das políticas públicas educacionais, tendo como referência
a construção e desenvolvimento sustentado do poder local democrático.
Estando ambas
localizadas na esfera da sociedade civil e fortemente identificadas e
comprometidas com o desenvolvimento da educação pública de qualidade social,
encontrarão grandes facilidades em estabelecerem pactos de ação e interlocução
pois estarão isentas de muitas amarras que dificultam e burocratizam as
articulações interinstitucionais, principalmente quando estabelecidas com
entidades do setor governamental.
Gozando ambas de
mais flexibilidade para agir e formular ações conjuntas em prol do
desenvolvimento da política, da gestão e da administração da educação, poderão
enriquecer e fortalecer a luta mais ampla da sociedade maranhense por um
sistema educacional público que não seja excludente e de segunda categoria pelo
fato de atender apenas às demandas das camadas mais pobres da sociedade.
Além do mais, a
aliança fortalece um dos eixos estratégicos da Seção Estadual da ANPAE, que é
aquele voltado à priorização da educação básica municipal como uma das linhas
mestras da programação da associação para o próximo biênio, considerando que os
municípios maranhenses são responsáveis diretos pelo atendimento de 80% das
vagas nesse nível de ensino.
5-O REGIME DE COLABORAÇÃO
Diante da
crescente complexidade dos problemas educacionais, não há como conseguir uma
verdadeira melhoria de qualidade se não houver, de fato, um regime de
colaboração entre a União, o Estado e os Municípios. Enquanto o diálogo entre
estas três esferas da política governamental de educação não for
verdadeiramente fecundo e produtivo, pouco conseguiremos na direção de um
sistema de ensino voltado ao desenvolvimento da sociedade.
O
regime de colaboração entre os sistemas está consagrado nas normas
constitucionais sobre universalização do ensino fundamental e sobre a garantia
da educação básica para os brasileiros. No §4o da Emenda
Constitucional 14 está consignado: “Na
organização dos sistemas de ensino, os Estados e os Municípios definirão formas
de colaboração, de modo a assegurar universalização do ensino ibrigatório”.
Tanto a Constituição, a Emenda 14 e, principalmente, a LDB em vigor,
contemplam um vasto número de novos dispositivos educacionais que enfatizam o
estabelecimento de regimes de colaboração intersistemas, sem o que não será
possível atingir-se os resultados colimados.
Pode-se, com efeito,
mencionar, a título de exemplo: a implementação e operacionalização do FUNDEF;
as definições sobre sistemáticas de aplicação dos recursos vinculados à
Educação e sobre a redistribuição da quota do salário-educação; a
institucionalização dos sistemas municipais de ensino e a consequente
implantação, nos de maior porte, de conselhos municipais de educação; a
política de gestão das redes de ensino em suas várias modalidades e níveis-
educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, educação de jovens e
adultos, etc., e outros mais urgentes, como planos de carreira e remuneração;
de capacitação profissional para o magistério; diretrizes curriculares para as
áreas urbanas e rurais frente aos novos parâmetros curriculares nacionais,
entre tantos outros que estão em evidência ou que entrarão em breve.
Os
problemas da educação básica brasileira, por seu turno, impõem que não se fique
mais pregando o que não se pratica, numa flagrante estratégia de empurrar para
frente uma bomba repleta de efeitos nocivos ao desenvolvimento da educação
pública. Não são poucos os estudos e pesquisas que comprovam a forte correlação
entre fracasso escolar e falta de efetividade no regime de colaboração entre os
sistemas.
Investir no regime de colaboração significa adotar o diálogo, a
negociação, com vistas à construção de consensos sobre as responsabilidades de
cada um dos sistemas na promoção da educação pública, tendo como base a
articulação dos interesses subjacentes em torno da repartição dos fundos
financeiros do setor público, dentre eles o salário-educação e o FUNDEF.
.
Significa a busca de uma engenharia política que crie um verdadeiro
sistema de vasos comunicantes, capaz de produzir equidade na divisão dos
recursos e complementaridade entre as partes na elaboração de um projeto
pedagógico que dinamize o papel da educação pública e assegure a sua qualidade
e efetividade social.
O Maranhão não mudará o perfil dos
seus indicadores educacionais se não aprofundar, ao extremo, a ligação orgânica
entre o sistema estadual e as ainda precárias e incipientes redes municipais de
ensino, onde muitas ainda se movem com baixíssimos índices de capacitação
técnica e recebem interferências diretas de outros interesses que não os
exclusivos da área educacional.
Uma
das primeiras gestões da
UNDIME-MA em favor da efetivação de um canal para viabilizar ações de
colaboração entre o Sistema Estadual de Ensino e os Municípios maranhenses,
refere-se à criação de um Comitê do Regime de Colaboração. Desde a realização do PRASEM II, no primeiro
semestre de 1999, onde foi elaborada uma substanciosa pauta de reivindicações pelos Dirigentes Municipais presentes, vem a UNDIME-MA
tentando viabilizar, junto aos gestores da educação estadual, a
institucionalização do referido Comitê. Não resta dúvida que este seria um marco histórico
em nosso Estado, pois a aspiração por uma instância como esta é antiga entre os
Secretários Municipais maranhenses. Além da UNDIME-MA e da GDH, a
proposta é que integrem o Comitê, o Conselho Estadual de Educação, a FAMEM e o
UNICEF, sem dúvida nenhuma, instituições estratégicas para a formulação e
acompanhamento das políticas públicas no campo educacional.
O PRASEM III
trouxe novamente à pauta a necessidade de mais avanços em termos da colaboração
Estado-Municípios. Continuamos, no entanto, sem grandes motivos para comemorar,
mesmo que se reconheça a predisposição dos dirigentes e a existência de apreços
pessoais entre os titulares das pastas envolvidas.
Um fato novo
recoloca a questão mais forte ainda: trata-se do cumprimento, pelos Municípios,
da exigência legal e já configurada em vários termos de ajustamento de conduta
assinados com o Ministério Público Estadual, segundo os quais eles terão até
janeiro de 2002 que elaborarem seus Planos Decenais de Educação. Para que essa
exigência seja cumprida fielmente, materializada em Planos Municipais de
Educação verdadeiramente consistentes, os Municípios precisam, no mínimo,
conhecer as diretrizes do sistema estadual para os próximos dez anos, sem o que
os Municípios não terão meios de cumprir os acordos firmados com o Ministério
Público.
Mesmo numa
conjuntura complexa como a atual, convém
que se leve a cabo um bom regime de colaboração. As lideranças educacionais do
Maranhão precisam convocar à ação os órgãos públicos, as instituições da
sociedade civil e as organizações empresariais com responsabilidade social para
um grande movimento pela educação maranhense, tendo a elaboração do Plano
Estadual de Educação como fator de aglutinação. Partindo-se dos Municípios, passando-se
pelas Regiões e chegando-se ao nível estadual, teríamos condições de formular e
implantar um Plano Educacional da mais absoluta importância para a sociedade
maranhense.
6-O TRABALHO EM REDE
Com toda certeza,
é de grande importância a mobilização social organizada em favor do
fortalecimento do processo de municipalização da educação básica no Maranhão,
um dos Estados onde a municipalização do setor mais cresceu e cresce. Basta ver
que quase 100% das matrículas da educação infantil são municipalizadas; do
ensino fundamental aproxima-se de 70%; e, mesmo no ensino médio, cuja
responsabilidade de atendimento é sobretudo estadual, os municípios mais de 20%
da demanda.
A educação das
crianças, jovens e adultos das zonas rurais é feita quase que inteiramente
pelas escolas municipais. Este nível expressivo de municipalização da educação
básica maranhense deixa claro que o foco das atenções, visando a superação das
deficiências e, principalmente, o resgate dos direitos que estão sendo negados
a crianças e jovens excluídos do processo educacional formal, deve ser dirigido
às redes municipais de ensino e ao fortalecimento e autonomia dos seus sistemas.
A forma de atuar
da UNDIME-MA, a partir dos apoios técnicos e financeiros recebidos do UNICEF,
tem sido sob a forma de uma rede interinstitucional de apoio às políticas de
municipalização educacional. Rede esta que articula contrapartes e parceiros do
UNICEF, representativos de OG’s e ONG’s, no sentido de contribuir para a
universalização e qualidade da educação pública municipal e a construção de sua
autonomia, visando garantir o acesso ao ensino fundamental de qualidade às crianças
e adolescentes excluídos, bem como garantir que as escolas formulem e
implementem, com participação da comunidade, projetos pedagógicos de educação
integral, apropriados às características de seu contexto sócio-econômico e
cultural. Objetiva apoiar a institucionalização de sistemas municipais de
ensino; capacitar dirigentes e profissionais da educação; fortalecer as escolas
e os órgãos da educação como entes autônomos; implantar projetos
político-pedagógicos instituintes; incrementar a elaboração de Planos
Municipais de Educação; implantar, apoiar e articular Conselhos Municipais de
Educação, de acompanhamento e controle social, tutelares e de direitos; apoiar
políticas de formação e valorização do magistério, fortalecer o regime de
colaboração entre Municípios-Estado-União e as parcerias com o terceiro setor e
com setores produtivos dotados de
responsabilidade social.
Os principais
resultados esperados, a partir dessa forma de atuar associada são: maior número
de sistemas municipais de ensino implantados e mais aparelhados para o
cumprimento de suas finalidades em termos de organização e gestão da rede
escolar e dos órgãos da educação; aumento da taxa de acesso e permanência dos
alunos na escola; introdução de novos métodos e novas pedagogias, projetos
educacionais instituintes e currículos adequados à realidade e necessidades
locais; Conselhos Municipais de Educação melhor preparados e demais conselhos
de representação social capacitados e aptos a exercerem suas autonomias; Planos
Municipais de Educação e Projetos Político-Pedagógicos concebidos e centrados
nas expectativas públicas e da comunidade escolar.
Os grupos-alvo
principais são Prefeitos, Secretários Municipais de Educação, Dirigentes
Escolares, Comunidades Escolares, Conselheiros Municipais de Educação, de
Direitos da Criança e do Adolescente, de Acompanhamento e Controle Social,
Vereadores, Juízes de Direito, Promotores de Justiça e Lideranças Comunitárias.
O principal beneficiário da implementação da rede é a população estudantil
matriculada nas escolas públicas municipais. A rede está apta a atuar nas 18
Regiões Administrativas do Estado, envolvendo a participação dos municípios que
as integram.
7- AUTONOMIA, QUALIDADE SOCIAL E PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA
Sem dúvida,
educação de qualidade e clientelismo são incompatíveis. Administrar a educação
sob critérios atrasados, como o empreguismo, compromete visceralmente qualquer
expectativa de eficiência e qualidade pedagógica.
Uma das
pré-condições para o sucesso de qualquer política educacional é a existência de
recursos humanos qualificados e capacitados para o pleno exercício de suas
funções técnicas e educativas. Se os sistemas de recrutamento e seleção desses
recursos não se pautarem nessas premissas e estiverem subordinados a critérios
“empreguistas”, a política educacional estará condenada ao fracasso.
Sabemos muito bem
que em nosso Estado e em outros de nosso país, a instituição do “cabide de
emprego” ainda é muito forte e caracteriza muitas administrações públicas. A
longa permanência desse fenômeno em nossa sociedade, principalmente nos
municípios do interior, acarreta prejuízos inestimáveis ao nosso
desenvolvimento social e cultural e mesmo do Brasil, pois é um fator de negação
da cidadania e de concentração de poderes e privilégios nas mãos de poucos.
Devemos, mais do
que nunca, permanecer atentos e vigilantes no sentido de que possamos derrotar,
para sempre, essas formas tão nefastas de administrar a coisa pública no
Brasil. Temos hoje uma Lei de Responsabilidade Fiscal, os Tribunais de Contas
mais atuantes e um melhor controle social sobre as administrações públicas.
Até que ponto a
autonomia municipal conduzirá a uma ação prática em relação ao compromisso de
gestão pública?
A conquista de uma
gestão democrática e do planejamento participativo da educação em solo
maranhense, ou mesmo em qualquer parte do mundo, não pode ser vista como mera
“opção”.
O emergir de uma
sociedade democrática deve ser encarado como uma meta superior da sociabilidade
humana.
Nossa trajetória
nesse mundo, por milhares de anos, tem sido a afirmação de uma sociedade
totalitária, onde a grande maioria dos seres humanos nunca teve acesso pleno
aos bens produzidos coletivamente. Nossa marca tem sido a escravidão, o
servilismo, a opressão e exclusões de toda sorte. Até mesmo neste nosso
maravilhoso mundo novo, que, por mais civilizado assim o julguemos, ainda
estamos longe de atingir uma sociabilidade mais justa e igualitária.
Chegar a uma sociedade democrática, a um
planejamento participativo das políticas públicas, para nós brasileiros,
campeões mundiais da desigualdade, jamais pode ser entendido com retórica
demagógica, dentre os milhares que temos por aí: atingir uma sociedade
democrática e o planejamento participativo da administração pública deve ser
visto como uma espécie de imperativo para nossa realização como povo e como
civilização.
Como poderemos
gerir a política educacional de uma forma eficiente e democrática, se
continuarmos renunciando ao nosso direito à autonomia, conquistado desde 1988,
pela Carta Magna e reafirmado em 1996, pela nova LDB?
Será que somos
realmente incompetentes e incapazes para assumir nossa autodeterminação?
Vamos continuar
eternamente tutelados pelas políticas emanadas da União e do Estado?
A conquista da
autonomia jamais ocorrerá por qualquer fórmula dadivosa. Se quisermos ser
autônomos, cabe a nós conquistarmos esse direito. Ninguém, em nenhuma parte do
Brasil e do mundo, sabe mais do que nós o que precisamos fazer para superar
nossos obstáculos e definir nossos projetos. Se abdicarmos dessa condição,
outros se sentirão encorajados a assumir o nosso lugar e tudo farão para não
perdê-lo mais. Este é um fenômeno político inerente ao nosso modelo de
organização da vida social.
Gostaria de
enfatizar o seguinte: se parece utópico o planejamento e a gestão pública
participativos, se estão distantes da realidade política de nosso Estado, se o
que prevalece ou prevaleceu mesmo foi a centralização e a política do favor e
do clientelismo, não devemos desanimar.
Se nós acreditarmos
que é possível chegar a uma sociedade mais democrática e mais justa, mesmo que
jamais a vejamos, ela algum dia nascerá. Se estivermos engajados pra valer
nesse bom combate, quem sabe se dela não iremos desfrutar? Um sistema municipal
de educação autônomo terá muito mais possibilidade de decidir sobre o que quer
e sobre qual a política educacional que mais lhe convém, do que um outro, sem
autonomia, que apenas segue as políticas que outros sistemas definem, muitas
delas inclusive elaboradas sem a sua participação.
Outras duas
questões importantes a serem respondidas pela UNDIME-MA. Qual a importância da
participação da comunidade na dinâmica das políticas educativas? Que tipos de
obstáculos persistem na elaboração e execução de planos e de políticas
educativas para os municípios?
A participação da
comunidade, não só nas políticas educativas, mas na política pública como um
todo é decisiva e mesmo insubstituível. Lamentavelmente, neste Estado e em nosso
país, ainda não atingimos esse padrão de governabilidade, onde a participação
comunitária e popular efetivamente influi na definição e na gestão das
políticas públicas. Nossa marca histórica é a centralização do poder decisório
e a subordinação da política pública aos interesses privados e da
infra-estrutura econômica nacional e estrangeira.
Victor Vincent
Valla3 e tantos outros estudiosos do Brasil
afirmam que a extrema concentração de riqueza que temos hoje no país e a vergonhosa
desigualdade social a que estamos sujeitos se devem a esse tipo de
gerenciamento da verba pública.
Pelo fato dos
interesses comunitários e populares nunca terem sido predominantes, os gestores
públicos brasileiros e suas elites privilegiaram a montagem de uma poderosa
base econômica, em detrimento das condições de vida e de reprodução da classe
trabalhadora.
No caso da
política educacional, tomando apenas o exemplo atual, o que se observa é o
revigoramento de um modelo de descentralização que transforma os municípios em
simples apoiadores das políticas educacionais originadas do alto.
Em nome do regime
de colaboração ou em razão do exercício de suas funções suplementares, as
políticas educacionais produzidas pelos Estados e pela União estão invadindo de
tal maneira o espaço decisório local que os municípios estão se transformando
em meros executores dessas políticas. Pior de tudo é que, em sua larga maioria,
pela flagrante desestruturação de seus sistemas educacionais, aceitam passiva e
pacificamente essa nova forma de controle do poder local, que, por isso mesmo,
permanece atrofiado e impedido de reagir em favor da preservação ou da
conquista de sua autonomia.
Pela nova LDB e
mesmo na conformidade constitucional, a comunidade detém uma parcela
significativa de responsabilidade na política educacional. Embora tendo como
lugar de referência a escola, a educação é um fenômeno comunitário e social, na
medida em que nos educamos para viver em comunidades humanas.
Uma educação
escolar que não estabeleça um diálogo fecundo com a comunidade está condenada
ao insucesso. A escola se oxigena na medida em que se abre para a comunidade e
com ela é capaz de estabelecer laços efetivos e afetivos de convivência. Se a
escola erguer muros muito altos e se isolar de seu meio corre o sério risco de
ficar para sempre confinada à solidão e ao esquecimento.
Os currículos escolares são os meios
mais diretos para estabelecer esse intercâmbio, essa ponte entre o mundo da
escola e o mundo que a cerca. O que a escola aprende e ensina sempre será
mediado pela comunidade e suas especificidades históricas e culturais. Se esta
mediação não ocorre, a escola permanece isolada de seu contexto e desvirtuada
de suas funções essenciais.
Tem sido muito
difícil construir esta ponte em nossa realidade em função de ainda termos uma
escola cheia de problemas e inconclusa, o que a torna limitada na tarefa de
dialogar positivamente com o seu meio ambiente, isto em decorrência de fatores
internos e externos. Precisamos trabalhar muito para superar essa deficiência.
Começando pela desmistificação dos problemas que impedem esse diálogo. Não
aceitar, em hipótese alguma, a idéia de que a população, por ser, em sua
maioria, pobre e iletrada, não tem o que contribuir para o desenvolvimento da
política educacional. Às vezes, a limitação não está na comunidade, mas na
própria comunidade escolar, no professor, no diretor ou no dirigente municipal
ou estadual que não sabe dialogar com o povo. No estágio atual da civilização,
a escola que não estiver aberta para o diálogo com os seus vizinhos e com os
vizinhos do outro lado do mundo será uma instituição natimorta.
Por quê é tão
difícil os municípios formularem e executarem seus planos educacionais? Que
obstáculos são esses que poucos conseguem removê-los?
Uma das explicações está no próprio
modelo de municipalização que se vem configurando no Brasil. De um lado,
conforme a lei maior, os municípios são entes federados autônomos, portanto
gozam de prerrogativas iguais às da União e dos Estados; de outro, a União e os
Estados pouco fazem no sentido de respeitarem essa prerrogativa, pois cada vez
mais interferem na vida municipal. Para que esse obstáculo seja superado é
preciso rever o pacto federativo e mudar radicalmente o modelo de planejamento
e gestão da administração e das políticas públicas como um todo, de modo que
essas contradições e os paradoxos que hoje existem sejam definitivamente
escoimados.
Um dos obstáculos
internos aos municípios diz respeito a limitações de ordem técnica,
administrativa e política, ainda comuns em muitos deles. Dos quase 5.600
municípios existentes no Brasil, é expressivo o número dos que se encontram
desaparelhados para assumirem plenamente suas políticas públicas e educacionais
em especial. Além da baixa viabilidade econômica, sofrem as conseqüências da
escassez de recursos humanos capacitados e qualificados para conduzirem
projetos educacionais instituintes, no que se inserem numa espécie de círculo
vicioso da insustentabilidade, quando as lideranças políticas e as forças
que dominam a administração pública são originárias de grupos atrasados e
representativos de oligarquias tradicionais, herdeiras da tradição brasileira
que há séculos privatiza a coisa pública.
Um outro obstáculo
poderoso está afeto à ideologia da dependência, fomentada pela não superação de
uma certa mentalidade de sujeição ao colonizador, ainda forte em boa parte do
Brasil, principalmente nas áreas menos urbanizadas.
Nos lugares onde a ideologia da dependência
prospera com facilidade, as pessoas em geral renunciam à cidadania e ao civismo
e passam a achar que são incapazes de construir uma sociedade sustentável. Aí
elencam dúzias de obstáculos, cada qual mais difícil de transpor, e assim se
omitem e acabam contribuindo para neutralizar ou mesmo dissolver, qualquer
espécie de movimento em favor da autonomia das políticas educacionais nos
municípios. Claro que não podemos deixar de reconhecer o despojamento de muitos
municípios e suas conseqüentes limitações.
Todavia, se
cruzarmos os braços, nós os filhos da terra, quem mais virá nos socorrer e
empunhar a bandeira do desenvolvimento sustentável? Mesmo que os obstáculos
sejam vários, saídas há. Mesmo que para isso seja preciso reinventar a
política, a escola e o governo.
Como
operacionalizar essas mudanças, se não temos tradição?
É verdade, não
temos tradição, mas temos certeza que precisamos mudar a forma de planejar
nossas políticas públicas. Não se trata de nenhum bicho de sete cabeças
ou de um modelo de tal modo complexo que só a poucos se torne acessível. Para
começar o planejamento participativo basta haver uma vontade política firme
nesse sentido. Essa vontade política decorre da mobilização social e da
existência de um espaço público em expansão. Tem a ver, portanto, com a ação da
cidadania em favor dos seus direitos.
Se governantes e
governados estabelecerem canais produtivos de interlocução, o planejamento
participativo será uma exigência inexorável. Uma coisa é certa: se não temos
tradição agora, nada impede que lutemos para conquistá-la amanhã.
O planejamento
participativo, por outro lado, não é uma fórmula mágica que resolve todos os
problemas da gestão pública ou que assegure a efetividade social das políticas
públicas. Ele deve ser visto, sobretudo, como um mecanismo de garantia dos
direitos do cidadão e de democratização da coisa pública. Por ter essa natureza
é um recurso da administração pública que está em permanente transformação e
jamais será um modelo acabado e definitivo. Sua eficácia decorre, sobretudo, do
grau de integração que mantém com a realidade e as necessidades da comunidade,
suas aspirações e desejos individuais e coletivos.
Por outro lado, se
há em nosso país algo que tem merecido respeitabilidade internacional, tal cabe
ao orçamento e ao planejamento participativos. O exemplo que alguns Estados e
Municípios que adotam o planejamento e o orçamento participativos estão dando
têm merecido de observadores estrangeiros os mais efusivos elogios pelo seu
caráter inovador, configurando uma nova maneira de gerir eficazmente a administração
pública, a ser seguida, inclusive, pelos países ditos desenvolvidos.
Devemos fazer tudo
para que essa idéia algum dia vingue e passe a ser referência na maneira de
planejar o desenvolvimento das políticas educacionais em nossas comunidades.
De que forma
envolver os pais no planejamento participativo, já que não demonstram interesse
nem em ir às reuniões de pais e mestres?
Com certeza não se
trata de tarefa fácil. Nesse caso, a dificuldade não se restringe apenas aos
pais refratários à escola. Nossas escolas, lamentavelmente, também ainda não
sabem como envolver os pais e a comunidade em seu dia-a-dia. Há muitos
preconceitos, de ambas as partes. Muitos professores não conseguem se comunicar
com mães e pais originários das camadas populares, ou porque são muito pobres,
ou porque são completamente iletrados. Sem falar na dificuldade que têm em
articular objetivos curriculares, que, em geral, não se relacionam bem com a
realidade circundante, com aspirações e necessidades objetivas que se encontram
ausentes dos conteúdos escolares.
Podemos afirmar,
por outro lado, que só terá sentido o planejamento participativo escolar na
realidade atual se for para a comunidade escolar, em conjunto com a comunidade
externa e a de pais em particular, reinventarem essa escola que está aí.
Talvez um dos
grandes obstáculos à participação dos pais dos alunos das camadas populares
seja o fato de que a escola que temos não se encontrar estruturada para essa
participação. Um certo viés elitista que começa na Universidade, no momento da
preparação do futuro professor, e vai até o modo como são planejadas as
políticas educacionais, marcadas pelo elitismo e pela centralização em nichos
privilegiados de poder.
Aparentemente,
quando o Presidente da República e o Ministro da Educação decretam o Dia
Nacional dos Pais na Escola parece tratar-se de algo prosaico ou, na melhor das
hipóteses, redundante, pois, pelas leis em vigor, a partir da maior de todas
elas, a educação não é monopólio do setor público. Sem falar nas modernas
pedagogias que são incansáveis em afirmar e reafirmar o valor e o papel
fundamental dos pais na vida escolar de seus filhos. Se, para levar a família à
escola pública, é preciso um decreto federal para isso, algo não vai bem com a
escola básica que temos hoje no Brasil.
Não podemos, por
outro lado, cair no equívoco de chamar os pais para dentro das escolas e não
termos o que dizer a eles e muito menos o que pedir quanto aos seus papéis na
educação dos seus filhos. Chamá-los ao chão da escola só para solicitar-lhes
ajuda e horas de trabalho voluntário é um erro fatal, pois acabaremos
legitimando o já limitado compromisso do Estado com o pleno financiamento das
políticas públicas de educação neste país.
Planejamento
participativo escolar sem a participação ativa dos pais dos alunos, dos próprios
alunos, do corpo docente e do quadro técnico e administrativo não pode ser
assim designado. A escola que temos está aberta a este tipo de gestão? Se não
está, o que podemos fazer para que tal ocorra? Sem dúvida, fica óbvio que para
avançar nessa direção precisamos reinventar o mundo da escola e desconstruir o
padrão de sociabilidade que nos levou a engendrar um modelo de planejamento
público, que opera sem a participação pública.
Outras questões
sempre presentes a balizar a atuação da UNDIME-MA: É bom ter a
municipalização? Que municipalização é essa em que outros municipalizam os
municípios? É bom adotar a municipalização nessas circunstâncias? Quem ganha e
quem perde com ela? Não corremos o risco de diminuir o nível educacional se os
gestores e administradores não seguirem essas orientações? Existe, por parte do
Estado, algum mecanismo que permita avaliar essa nova maneira de conceber a
educação?
Cremos que
precisamos de um novo modelo de municipalização em nosso país, onde o município
possa ser respeitado em suas prerrogativas de autonomia e autodeterminação.
Achamos bom, sim, termos a municipalização. É o meio mais eficaz para
construirmos um poder local comprometido com a qualidade de vida e com equidade
social. Agora, pensar que vamos conseguir tudo isso sem mudar o modelo atual é
uma santa ingenuidade. Como, na história política do nosso país, o município
acabou transformando-se no elo mais fraco da corrente, não será fácil a luta
por um novo pacto federativo que realmente opere em níveis de equilíbrio
institucional.
Com certeza, o
risco de diminuir a qualidade educacional caso os gestores municipais não sigam
as orientações do planejamento participativo é grande. Muitos críticos da
municipalização acham que ela é uma espécie de estratégia da classe dominante
para reduzir os investimentos públicos em políticas de equidade social. Ao
transferirem essa responsabilidade a um poder local debilitado e em geral despreparado,
garantem mais recursos para setores produtivos rentáveis economicamente e
preservam o status quo geral da sociedade, uma vez que as políticas públicas
conduzidas pelos municípios tendem a ser menos eficientes e até mesmo
retroativas, pelas razões estruturais já apontadas.
O volume de
encargos que os municípios têm hoje em dia não permite improvisos. Mesmo que no
curto prazo não implantem o planejamento participativo, de algum modo terão que
buscar racionalidade técnica em suas gestões, pois, além da vigilância
crescente da sociedade civil, terão que demonstrar alguma eficiência para
pleitearem recursos federais e externos de um modo geral.
Reinventar a
escola não é apenas uma bela metáfora pedagógica. Trata-se de um projeto
instituinte que nasce das aspirações de cada sistema de educação. Reinventar a
escola significa nossa mobilização em favor de uma nova escola pública que seja
socialmente necessária e consiga elevar as expectativas e as esperanças do povo
brasileiro e maranhense em especial.
Temos dúvidas se
as elites que dominam o Estado brasileiro estão realmente comprometidas com
projetos dessa natureza ou, muito menos, se dispõem de mecanismos de avaliação
dessas experiências. Achamos mesmo que a reinvenção da escola será tarefa da
sociedade civil organizada em íntima aliança com o mundo escolar e suas
vizinhanças e não de governos que se orientam em direção oposta ao
desenvolvimento sustentável da sociedade.
A politicagem
atrapalha a educação?
A politicagem
atrapalha a vida como um todo, não só a educação. Onde a forma do político
assume tais contornos, estaremos condenando gerações ao servilismo e mesmo à
exclusão social irreversível.
A UNDIME-MA
cumprirá o seu papel histórico e honrará o seu mandato institucional se
continuar sabendo posicionar-se como verdadeiro agente de transformação social.
Para isso, é mais do que urgente, que os Dirigentes Municipais de Educação de
todo o país, e do Maranhão, especialmente, não deixem de apóia-la na luta pela
autosustentabilidade.
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