Raimundo Palhano
(Trabalho publicado, originalmente, na Revista Imesc de 2008)
1
INTRODUÇÃO
Decorrem
do predomínio de explicações consagradas as dificuldades de sistematizar visões
alternativas sobre o que foi, é e o que poderá ser o Maranhão. Muitos equívocos
e alguns mitos, por essa razão, ainda permanecem vivos. A retomada dos estudos
conjunturais pelo IMESC poderá contribuir para o processo de quebra dos
paradigmas consagrados, normalmente despolitizadores, e alargar os horizontes
interpretativos sobre a formação maranhense de um modo geral.
O
momento histórico vivido pelo Maranhão, com um governo democrático instalado
nos Leões, e também pelo país, marcado por uma atmosfera otimista, apesar dos
estragos da crise financeira norte-americana e dos seus impactos devastadores,
não deixam dúvidas de que é preciso continuar passando a limpo a formação
social maranhense e a sua dinâmica contemporânea. Dispor de estudos e pesquisas
que se reportam aos movimentos conjunturais da economia e da sociedade
representa subsídio importante para o planejamento das políticas públicas
governamentais, como, igualmente, um bom pano de fundo para os empreendedores
econômicos e para a sociedade civil organizada.
Próximos
do fim da primeira década do ano 2000, muitas incertezas ainda continuam
desafiando agora, agravadas pela crise do mercado hipotecário dos Estados
Unidos, vistos até ontem como superpotência absoluta. Velhas crenças e até
mesmo as novas, como a ilusão do neoliberalismo, saem do mapa pela porta dos
fundos e de forma sorrateira.
A
descrença na globalização tradicional, como expressão de um fenômeno econômico
baseado na financeirização dos mercados, é o traço mais característico dessa
nova realidade. Uma nova globalização pós-neoliberalismo deverá nascer o mais
rápido possível, cuja característica básica será sua maior diversificação.
Entre Bretton Woods de 1944 e os EUA de 2008 muitas águas rolaram em todos os
continentes e tudo indica que os barcos do capitalismo financeiro hegemônico
não chegarão a nenhum porto seguro. A ordem econômica mundial navega em águas
agitadas e ondas de crise estão cada vez mais fortes, ameaçando o
desenvolvimento sustentável, o estado provedor social, a dívida pública interna
e externa, e, sobretudo, a evolução do trabalho e do emprego.
Quais
então as perspectivas de desenvolvimento para países como o Brasil e estados
como o Maranhão, em contextos como estes, marcados por fortes instabilidades e
desequilíbrios sistêmicos e pela financeirização e globalização dos mercados?
O
momento presente evidencia que não há a menor possibilidade, nem no presente e
nem no futuro, de que a economia real e a do trabalho sejam dispensáveis na
nova ordem mundial que certamente nascerá da atual crise global. Em lúcidas
ponderações, Boaventura Santos afirma
que não se trata de desglobalização. Segundo o autor, o que está em curso são
mudanças na atual forma de globalização, cuja conseqüência principal deverá ser
o surgimento de modificações na globalização dos movimentos sociais. Um
contexto altamente favorável ao surgimento de uma nova centralidade para as
questões nacionais e regionais, implicando em novos padrões de governança que,
concretamente, fortalecerão os papéis do regional, do nacional, do estado, dos
partidos políticos e nas políticas de alianças entre as nações, com vistas a
uma nova cooperação e a um novo relacionamento internacional.
As
lições aprendidas recentemente, a partir dos cenários já evidenciados, deixam
claro que a valorização social do desenvolvimento econômico endógeno, hoje e no
futuro imediato, dependerá muito mais de seus conteúdos éticos do que ganhos infinitos
de uma minoria nos mercados financeiros globais. Não bastará, nesta nova
sociedade, que certamente virá, apenas a flutuação das bolsas e pregões ou
mesmo o domínio de técnicas e métodos avançados, se o desenvolvimento não
estiver referenciado na equidade social, sobretudo nos compromissos com o
desenvolvimento humano e sua sustentabilidade.
Definitivamente,
a globalização atual não é ou será um fenômeno mundial perene, que se aplica a
diferentes realidades, portanto algo inexorável, não restando aos países outras
alternativas, a não ser se inserirem nessa nova ordem mundial hegemônica.
Os
últimos acontecimentos atestam que a globalização é, sobretudo um fenômeno
econômico decorrente de um sistema de poder que interessa, sobretudo às grandes
potências mundiais e seus aliados dos setores hegemônicos, as quais,
confirmando tudo isso, saem agora em socorro dos bancos de investimento, das
grandes sociedades hipotecárias e das maiores seguradoras do mercado mundial,
com isso buscando evitar a quebradeira geral, que seria fulminante para
desorganizar o referido sistema de poder.
Nesse
sentido, local e global não devem ser vistos mais como a mesma coisa, embora
nunca tenha havido global sem local e vice-versa. Ou seja, há também um imenso
mercado de trabalho para o país, em suas regiões geográficas, em seus estados
federados e nos seus milhares de municípios. O que se precisa fazer é lutar
para que o desenvolvimento econômico do país se faça de dentro para fora, para
que não fique dependente das circunstâncias e dos fluxos externos de capitais.
Nesse novo contexto em construção, o desenvolvimento endógeno regional e
nacional assume assim posição determinante.
A
valorização do desenvolvimento econômico real decorrerá também da capacidade
que se tiver de desenvolver nas comunidades as potencialidades do conhecimento,
fazendo surgir novas oportunidades de emprego e geração de novas tecnologias
que aproveitem o potencial de recursos naturais disponíveis. A existência é
sempre criadora, mesmo quando parece repetir-se ciclicamente. Pensar o
desenvolvimento como algo que dependa exclusivamente da inserção nos mercados
globais impedirá de criar novas alternativas de superação do atraso.
Deve-se,
mais do que nunca, ter o otimismo como bandeira, sem deixar, contudo, de
prestar atenção nos sinais mais evidentes do mundo real que apontam para a
desesperança e para o fim das utopias.
Como
brasileiros e maranhenses é preciso manter o compromisso histórico de lutar
pelo desenvolvimento sustentável e pela soberania do país e do estado natal.
Para as novas gerações e para os menos jovens, o leque de desafios continua
muito grande. Não é hora de desistir. É hora de continuar, é hora de insistir
em favor de um país mais justo e desenvolvido e de um Maranhão que lhe siga os
passos.
2
UMA CARTOGRAFIA PARA O PENSAMENTO INQUIETO
Em
menos de cinqüenta anos os brasileiros construíram a economia de uma nação que
deixou de ser o 48o PIB do mundo, um país periférico no cenário internacional,
que exportava pouco mais de 1 bilhão de dólares, onde o café representava 50%
do total, passando a figurar, nos dias de hoje, entre as 10 maiores economias
do mundo. Um país que atingiu médias de crescimento anuais em todo o século XX
só superáveis pela China. Um país que produziu economistas geniais como Caio
Prado Junior, Octávio Gouveia de Bulhões, Eugênio Gudin, Ignacio de Mourão
Rangel, Celso Furtado, Mário Henrique Simonsen, Conceição Tavares, e tantos
outros de grande valor.
Mas
ainda há um lado nebuloso, sombrio, que impede uma comemoração plena. Trata-se
do Brasil das desigualdades sociais e regionais, da concentração de renda, do
desemprego, das dívidas interna e externa, dos problemas energéticos, das altas
taxas de juros, e muitos outros problemas que colocam o país em permanente
posição de alerta interna e externamente.
Nos
últimos cinqüenta anos de construção do desenvolvimento brasileiro passou-se da
crença geral que a solução dos problemas brasileiros dependia da
industrialização e da modernização das forças produtivas para uma outra, que
durou até recentemente, de um alentado desencanto com o futuro do país. Por
tudo isso, o maior desafio dos brasileiros, para os próximos anos, é,
indubitavelmente, contribuir para a concretização de uma economia nacional
próspera e sustentável. É com essa perspectiva que o planejamento do
desenvolvimento do Maranhão deve trabalhar.
Não
dá mais para aceitar que a história do Brasil e do Maranhão é uma história de
constantes esperas, de constantes adiamentos. Muitos ainda acreditam que nunca
o país completa aquilo que começa a fazer. Oscila-se muito entre utopias e
distopias. Há algo nascendo todo dia nesta terra e ainda são bem poucos os que
conseguem perceber. Para a maioria tudo parece imóvel e resistente ao tempo.
Quais
as novas rotas para a utopia, que, segundo a pedagogia freireana, se
caracteriza mais pela capacidade de anúncio e de denúncia do de negação da
realidade? Mais do que em qualquer fase da história é urgente começar a montar
a cartografia para o encantamento e para a transformação da realidade. O IMESC
vem assumindo esse compromisso inadiável e se esforça para contribuir
concretamente. Um dos seus papéis mais significativos será propor cartografias
para o pensamento inquieto.
3
O IMESC COMO COMUNIDADE AMPLIADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
No
Brasil vive-se o calor de uma nova valorização das pesquisas e estudos socioeconômicos
aplicados que, independentemente das vontades e desejos presumíveis, afetarão
os velhos paradigmas e estimularão a produção de novos.
É
cada vez mais consensual entre os gestores que as instituições de pesquisa
aplicada, sejam quais forem suas formas de organização, deverão desenvolver uma
pesquisa de qualidade, associada à produção científica e tecnológica, bem como
à manutenção de vínculos sólidos com a comunidade, expressos em ações que
demonstrem responsabilidades sociais.
O
IMESC poderá ser uma das respostas a esse desafio. É um projeto em construção
e, como tal, fatalmente passará por estágios de legitimação técnica, além da
verificação de sustentabilidade institucional. O recurso mais importante a ser
captado agora, para torná-lo viável é o sonho, o desejo, o encantamento. Outros
recursos são também indispensáveis, como equipamentos e infra-estrutura física,
cada vez mais apropriados ao seu desenvolvimento.
A
proposta inicial para o IMESC é que se institua como comunidade ampliada de pesquisa,
uma modalidade de pesquisa-intervenção que busca a construção do conhecimento a
partir das experiências concretas dos pesquisadores em seus ambientes de
trabalho e contextos maiores. Para começar não se dependerá fortemente de
recursos externos, só da riqueza existencial que cada um possui e guarda como
tesouros valiosos.
Desde
o início do processo de recriação vêm sendo discutidas e aprovadas as idéias
centrais, objetivos, estratégias, metodologias, etc.; em segundo lugar,
oficinas de futuro vêm sendo realizadas, voltadas à construção de projetos
coletivos, culminando com o desenho de espécies de árvores dos sonhos, para, em
seguida identificar as “pedras no caminho”, aquelas que dificultam atingir
desejos coletivos; em terceiro lugar, são mantidos diálogos sobre as razões e
fundamentos dos problemas e dificuldades que fazem com que as pedras entrem nos
sapatos ou maltratem os pés dos caminhantes, sendo uma viagem em busca de
informações e conhecimentos que auxiliem a conhecer a realidade; em quarto e
último lugar, vem a necessidade de elaborar a cartografia das ações a serem
realizadas e sobre o que é necessário para poder realizá-las e
concretizá-las.
Os
tópicos mapeados são trabalhados sob diferentes enfoques e metodologias. O
primeiro passo é organizar seminários de estudos em que os temas mais
prioritários são examinados coletivamente e como os mesmos são tratados na
literatura nacional e internacional. São indispensáveis também realizar
oficinas de escrita compartilhada, onde os pesquisadores e analistas exercitem
suas autorias e co-autorias. Tudo isso poderá levar o IMESC a um processo que
Célia Linhares denomina de “sistematização aprendente de saberes, conhecimentos
e fazeres.”
As
primeiras experiências de comunidades ampliadas de pesquisa ocorreram na
Itália, nos anos 1960 e 1970, envolvendo representantes do movimento sindical e
grupos de profissionais que buscavam transformar ambientes de trabalho nocivos
em ambientes saudáveis. As comunidades procuram assim articular os saberes acadêmicos,
formais, científicos e os saberes informais, buscando ir além da simples
separação entre ambos. Todos os atores se tornam co-autores da pesquisa,
portadores de saberes específicos. Suas raízes teóricas estão nos italianos
Antonio Gramsci e Ivar Oddone e, no Brasil, em autores como Célia Linhares,
Maria Elisabeth Barros de Barros e Victor Vincent Valla.
A
metodologia não separa, portanto, sujeitos e objetos de pesquisa. Pierre Lévy
conceitua o método como “ecologia cognitiva”, pois reconhece como portadores de
história, sonhos e projetos tanto os seres humanos como as coisas que os
cercam, formando o que Célia Linhares denomina de “um coletivo misto e impuro,
depositário de formas ampliadas de comunicação e pensamento”. Exemplifica com
os versos de Chico Buarque: “Morena de Angola/que tem um chocalho/amarrado na
canela/ninguém sabe se é ela/que mexe com o chocalho/ou é o chocalho que mexe
com ela”.
A
pesquisa-intervenção, por outro lado, visa desenvolver questões e
problematizações que levem ao entendimento das situações presentes no ambiente
e das maneiras de como superá-las. Como implica na formação de comunidades
ampliadas de pesquisa, a ação de investigar, pesquisar não se restringe a
técnicos especializados em ações isoladas. Implica, pois a necessidade da
pluridisciplinaridade e na pluriprofissionalidade, além da autonomia coletiva
dos participantes. No IMESC, a convivência intelectual entre pesquisadores
experientes, especialistas, técnicos recém formados e estagiários transcorre de
modo promissor.
As
comunidades poderão ser a contribuição inicial do Instituto à luta pelo resgate
das utopias, numa hora em que o mercado tem poderes dilapidadores do sentido da
existência humana e da vida em sociedade. Pode ser também a fonte de energias
para que a Instituição cresça e cumpra o seu papel de fomentador de viveiros
onde serão fertilizados conhecimentos úteis e necessários ao enfrentamento dos
desafios ligados à conquista da sustentabilidade do desenvolvimento maranhense.
4
A RETOMADA DOS ESTUDOS CONJUNTURAIS
O
economista Felipe de Holanda, colaborador destacado do IMESC, um dos mais
brilhantes profissionais da área, vinculado à Diretoria de Pesquisa, sob a
direção primorosa e competente de Hiroshi Matsumoto, mestre de várias gerações
de economistas maranhenses, contando com o apoio do técnico Dionatan Carvalho e
colaboração de Tibério Martins, Sadick Nahuz, Wallison Ferreira Lima e Ana
Theresa Boueres, reinauguraram os
estudos conjunturais no âmbito institucional, herdeiro que é o IMESC do antigo
Instituto de Pesquisas Econômico-Sociais
Informática – IPEI.
Há
o reconhecimento na literatura de que o conceito de conjuntura nasce ao redor
da metade do século XIX, quando os estudiosos da economia descobrem que as
crises econômicas mantinham regularidade e periodicidade.
Ao
longo dos anos os estudos técnicos sobre a matéria evoluíram muito, reforçados
pela era dos computadores e dos bancos de dados públicos e corporativos.
O
que se espera hoje do analista conjuntural é que, no mínimo, tenha o domínio da
teoria e da metodologia pertinente a essa área do conhecimento. Embora se saiba
que a análise de conjuntura, mesmo largamente praticada, ainda não tenha
conseguido, pelo menos no Brasil, se instituir como um campo diferenciado e
claramente reconhecido nos ambientes acadêmicos da Ciência Econômica, da
Ciência Política e também da Sociologia.
No
âmbito da economia, por seu turno, desde o início do século XX, a análise
conjuntural já começava a dar os primeiros passos. O marco emblemático dessa
afirmação está no ano de 1917, quando é criado o Comitê de Pesquisa Econômica
da Universidade de Harvard, e são divulgados os resultados do seu pioneiro e
reconhecido "barômetro econômico".
No
caso brasileiro, a análise de conjuntura foi um instrumental muito utilizado no
final da década de 70 do século passado, quando da reestruturação dos
movimentos sociais, por ocasião da saída do regime ditatorial, instalado em
1964. São várias as instituições e organizações da sociedade e organizações
não-governamentais que passam a desenvolver este tipo de atividade. Um dos mais
atuantes foi o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Socioeconômicas), sob a
liderança de Herbeth de Souza, o Betinho. A crise que se instalou na década de
90 reduz os trabalhos de análise conjuntural no país, vindo a se intensificar
novamente a partir dos anos iniciais do corrente século XXI, sobretudo com a
subida ao poder do governo Lula e a retomada do desenvolvimento econômico e
social em novas bases.
O
que entender, afinal, por conjuntura? Uma das mais comuns definições é a que
associa conjuntura a um recorte temporal de prazo curto. Surgem dificuldades:
em que consiste o curto prazo em política, em economia e em sociologia? O
primeiro esforço é ter clareza sobre qual a concepção de tempo com que se deve
operar. O tempo dos ciclos econômicos, como nos estudos inaugurais da
conjuntura econômica, ou o tempo cumulativo e ascendente de Marx ou Weber e
suas teorias macro-históricas? Lembrando ainda dos tempos contemporâneos, mais
operacionais, nos quais o trabalho do analista econômico consiste em, dadas
certas hipóteses, antecipar o que vai acontecer com elementos focais da
macroeconomia, como inflação, câmbio, juros, emprego, renda, entre tantos
outros, em um determinado ponto temporal, apoiando a tomada de decisões de
agentes públicos, empresariais e sociais.
Algumas
correntes também definem a análise de conjuntura como um estudo sobre as
possibilidades que existem na realidade, não se resumindo apenas a um estudo
“sobre” a realidade. Está claro que para fazer a interpretação sobre a dinâmica
conjuntural, muitos fatores atuam ao mesmo tempo, a começar pela própria
intencionalidade de transformar a realidade por parte dos analistas, o que
pressupõe não ser possível captar os fenômenos explicativos da conjuntura sem a
recorrência a instrumentais analíticos consistentes. Outro aspecto é que
análise conjuntural implica uma visão de mundo, logo está associada a uma
análise que passa também pela dimensão estrutural, tornando-se muito difícil
construir a análise sem procurar as articulações e os nexos entre o
institucional e o estrutural, dentro de uma perspectiva sintetizadora.
A
análise conjuntural implica, portanto em várias escalas: pode ir dos domínios
do poder local e atingir o estadual, o regional, o nacional e o internacional.
Isso é importante porque quanto maior a escala de tempo escolhida, maior a
dificuldade de análise dos fatos e acontecimentos.
Além
do mais, os estudos e análises conjunturais articulam o hoje, o ontem e o
amanhã com a intenção de abrir a projeção de cenários esperados e possíveis. A
capacidade intuitiva e a criatividade do analista conjuntural contam muito,
portanto. Sem uma análise que abra novas projeções sobre a realidade, perde-se
o valor político para a práxis.
Vê-se,
assim, que o trabalho do analista envolve atividades relacionadas à análise de
conjuntura e à construção de cenários prospectivos. Para tanto, exige preparo
profissional para interpretar e formular diagnósticos sobre a situação
conjuntural, bem como para a elaboração de análises prospectivas e aplicação às
estratégias de desenvolvimento das políticas públicas, empresariais e
societais.
É
também quase impossível elaborar estudos e análises sobre a conjuntura, onde se
inclui a dimensão econômica, sem levar em consideração a questão política,
requerendo dos analistas uma base mínima, conceitual e teórica, conjugada a uma
experiência, ainda que mínima, em análise de conjuntura e cenarização. Sem
esquecer os instrumentais básicos, vinculados aos fundamentos teóricos,
metodológicos e conhecimento institucional, sem os quais o profissional da área
terá muita dificuldade para identificar as variáveis e informações relevantes,
lado a lado com a prática de utilização destas informações.
Para
o bom desempenho do seu trabalho, especialmente aqueles que fazem a análise da
conjuntura econômica, devem aperfeiçoar-se sobretudo nos seguintes campos de
estudo:
a) Nos fundamentos macroeconômicos para a análise conjuntural, com
o objetivo de conhecer os elementos de teoria macroeconômica que permitem: a)
compreender a dinâmica cíclica de economias de mercado, a ação da política
econômica e o funcionamento do sistema financeiro; b) nos instrumentos teóricos
necessários para a definição de métodos de previsão de curto, médio e longo
prazo;
b) na análise de conjuntura econômica brasileira (e maranhense, em
especial ), procurando relacionar os fundamentos estruturantes da realidade
econômica com a dinâmica das decisões tomadas nos vários contextos, sempre
procurando identificar as repercussões e impactos na sociedade e na economia
sob análise;
c) na análise da conjuntura econômica internacional, objetivando
conhecer o quadro geral das principais instituições e regras que regem as
relações econômicas internacionais, bem como os atores e variáveis
determinantes a serem acompanhados para se ter condições de entender o
movimento atual e as tendências da economia mundial;
d) em métodos e práticas de construção de cenários macroeconômicos,
com a finalidade de introduzir as principais técnicas de análise prospectiva e
suas aplicações à construção de cenários macroeconômicos, com ênfase central
na integração entre a ferramenta de
cenarização e a elaboração de modelos econômicos. Vindo em seguida a
apresentação das relações entre a geração de visões qualitativas sobre o futuro
- a partir das quais são fixadas as variáveis exógenas – e sua aplicação a
modelos de consistência macroeconômica;
e) em métodos quantitativos com o objetivo de conhecer os
principais conceitos estatísticos relacionados a compreensão e a crítica de fatos conjunturais
de natureza econômica. Seu foco será voltado para a construção e interpretação
de indicadores econômicos e a análise de séries econômicas. Realce especial deverá
ser dado ao emprego de matrizes de insumo-produto para a realização de
simulações.
Dois
outros campos de investigação são importantes para o desenvolvimento dos
estudos conjunturais. O primeiro está ligado ao conhecimento e estudo das
estratégias corporativas empresariais, no qual foca-se a questão da estratégia
empresarial desde uma perspectiva associada à gestão das organizações, buscando
apresentar abordagens contemporâneas de análise e de gerência estratégicas.
O
segundo campo é o associado à análise da conjuntura política, como já destacado
anteriormente, com o objetivo de focar alguns conceitos e informações que
contribuam para a incorporação da dimensão política na análise da conjuntura. É
quando são examinados aspectos que, embora não tratados especificamente no
âmbito da economia, interferem sobre as decisões de política econômica e sobre
os próprios rumos dessas atividades.
Além
dos aspectos mais teóricos e metodológicos vistos anteriormente, outros de
natureza mais organizativa devem ser considerados para o desenvolvimento da
área de análise conjuntural. A começar pela necessidade de um marco teórico,
como também já referido, ou seja, de um campo de conhecimento abordando teorias
sobre a sociedade, sobre a história e a política, por exemplo. Conhecimentos
sobre a formação social, cultural e político econômica do Brasil (e do
Maranhão) e a história de luta dos movimentos sociais são indispensáveis.
Outra
providência a considerar, na linha da organização da área de estudos
conjunturais é a que se refere à informação. A análise de conjuntura depende de
um grau avançado de informações sobre vários campos da realidade. Neste
sentido, é importante se ter fontes de informação, sobre pessoas, dados, fatos
e contextos.
Nunca
perder a preocupação com a definição de escalas de tempo e espaço nas análises
conjunturais, como já tratado também anteriormente. O corte temporal pode
variar do marco zero ao infinito. O problema é que, quanto maiores as escalas
de tempo e espaço, mais complexas tornam-se as análises.
O
analista da conjuntura econômica, embora focado apenas em uma dimensão do
fenômeno, não pode perder a noção da totalidade. Além de não perder essa
referência maior, a análise da conjuntura será sempre processual. O fenômeno
analisado se insere em um contexto mais amplo e o seu movimento obedece a um
determinado ritmo processual.
Pelo
que se viu, de modo muito sintético, a análise conjuntural é uma análise de
fatos e acontecimentos. Há um cenário no qual os acontecimentos se processam.
Decorre daí a importância de qualificar os cenários em um tempo e espaço. Desde
simples espaços de rua a outros mais complexos, como os espaços e tempos
institucionais.
Espaços
fechados ou abertos, de elite ou de massa, ativos ou passivos. Atuam também
atores individuais e coletivos. Os principais atores serão sempre os coletivos,
os grupais, e outros. Sem deixar de reconhecer que existem atores individuais
que têm ou poderão ter importância histórica. Não esquecer jamais a análise da
relação de força – qual força tem esses atores numa perspectiva mais política?
Que capacidade operativa possui a sociedade para desenvolver determinadas
ações, com poder de modificar a relação de forças dominante?
Por
fim é preciso construir a síntese – requer clarividência, conhecimento e
experiência no sentido de articular uma visão de estrutura com a conjuntura. A
práxis política se baseia na capacidade de antecipação, não esquecer disso.
5
ANÁLISE CONJUNTURAL E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DESMISTIFICADOR
O
objetivo maior de áreas de estudos conjunturais em institutos de pesquisas
socioeconômicas aplicadas, vinculados ao planejamento do desenvolvimento é
contribuir para a construção de conhecimentos sobre a realidade na qual atuam,
dentro de uma perspectiva de aplicabilidade às políticas públicas.
Além
disso, em lugares como o Maranhão, nos quais ideologias e dogmas possuem muita
força, produzir conhecimentos mais consistentes e apoiados em bases
científicas, assume um papel relevante e estratégico.
Foi
dentro desse prisma que o IMESC foi gestado por seus idealizadores e
fundadores: um lugar especial, com idoneidade ética para herdar o legado de
seus institutos antecessores (IPEI, Fipes e IPES) e com capacidade intelectual
suficiente para passar a limpo a formação social maranhense, despindo-a dos mitos
e assombrações.
Não
será obra que se concretizará em pouco tempo. A pauta a ser enfrentada é das
mais complexas, pois suas raízes mais profundas estão sob pedras que se
misturam nos labirintos escuros de mentalidades extraviadas no tempo. Mas não é
impossível encontrar a rota que levará à saída dessas cavernas sombrias. As
duas grandes universidades públicas do Maranhão – UFMA e UEMA – apesar das
dificuldades, nunca deixaram de trabalhar e contribuir nessa missão heróica.
Não há como desconhecer que a produção intelectual mais expressiva sobre o
Maranhão passou sempre por seus departamentos acadêmicos e por seus
pesquisadores e estudiosos de um modo geral.
Assim
como, desde quando começou a atuar, mais precisamente nos primeiros anos da
década de 70 do século passado, o complexo IPEI/FIPES/IPES foi responsável por
uma das mais relevantes produções sobre os problemas e desafios do
desenvolvimento maranhense, produção esta que se manteve viva até meados dos
anos 80 do referido século, quando se inicia a derrocada do aludido complexo
institucional, fazendo com que sua produção entrasse em franco declínio.
Os
tempos são outros. Todos amadureceram: a própria viagem e os viajantes. O
Maranhão não tem mais o rosto que tinha há 50 anos atrás e aqueles que naquela
época mal sabiam caminhar, hoje já têm pernas gastas e mãos calejadas de tantas
idas e vindas em jornadas incessantes vida à fora.
A
lição maior aprendida nesse balançar sem fim do relógio do tempo impassível é
fazer com que a criação do IMESC, a sua missão cívica e o seu compromisso
político-institucional, se materializem para a consecução do objetivo comum de
transformar os estudos conjunturais em instrumentos capazes de colaborar para a
modernização e democratização desse Estado, no bojo das quais novas
interpretações, plenas de veracidade e criatividade, desconstruam os mitos e
assombrações e o Maranhão possa, finalmente e definitivamente, ingressar no século XXI.
Para
isso é preciso mente inquieta e coração de estudante. Um dos maiores desafios
para a análise da conjuntura maranhense é compreender as inter-relações das
partes com o todo. O que só será possível de obter se houver um mapa que
possibilite viajar na realidade circundante e nas outras mais distantes e muito
mais impenetráveis.
O
caminhante precisa ser metódico. Jamais deverá se deixar fascinar pelo
reducionismo maniqueísta e muito menos pelo dualismo simplista, ou ainda, se
apaixonar pelos trejeitos da ideologia da decadência maranhense, tão poderosa
que foi capaz de enlaçar inúmeras gerações de conterrâneos.
Na
mesma direção, não se tornar prisioneiro de análises simplistas, aparentemente
mais fáceis de fazer e até mesmo de convencer, mas muito difíceis de merecer
atenção nos círculos mais exigentes ligados à produção do conhecimento. O
simplismo não consegue captar a essencialidade dos fenômenos sob foco, sejam
eles econômicos, sociais ou políticos.
O
resumo de tudo, é que análise de conjuntura é muito mais análise de conjunto do
que uma análise de corte temporal curto. É sobretudo a intensidade e
profundidade do olhar sobre o conjunto do que a preocupação com a perspectiva
temporal da análise, que sempre será importante, mas jamais será o essencial.
O
engenho e a arte do analista da conjuntura se manifesta toda vez em que for
capaz de reger, de forma harmônica, um grande número de variáveis econômicas,
sociais ou políticas, que se encontram em relações complexas e múltiplas,
produzindo uma peça consistente de argumentos capazes de explicar o
comportamento dinâmico dos fenômenos sob investigação. Quando isso acontece os
mitos e as assombrações não farão mais sentido e desaparecerão no horizonte que
se vai abrindo. E uma nova melodia inquietará os espíritos, estimulando-os a
prosseguir, sempre.
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