terça-feira, 25 de julho de 2017

O MARANHÃO, SEUS AVESSOS E ANÁLISE CONJUNTURAL


Raimundo Palhano

(Trabalho publicado, originalmente, na Revista Imesc de 2008)


1 INTRODUÇÃO


        Decorrem do predomínio de explicações consagradas as dificuldades de sistematizar visões alternativas sobre o que foi, é e o que poderá ser o Maranhão. Muitos equívocos e alguns mitos, por essa razão, ainda permanecem vivos. A retomada dos estudos conjunturais pelo IMESC poderá contribuir para o processo de quebra dos paradigmas consagrados, normalmente despolitizadores, e alargar os horizontes interpretativos sobre a formação maranhense de um modo geral.

        O momento histórico vivido pelo Maranhão, com um governo democrático instalado nos Leões, e também pelo país, marcado por uma atmosfera otimista, apesar dos estragos da crise financeira norte-americana e dos seus impactos devastadores, não deixam dúvidas de que é preciso continuar passando a limpo a formação social maranhense e a sua dinâmica contemporânea. Dispor de estudos e pesquisas que se reportam aos movimentos conjunturais da economia e da sociedade representa subsídio importante para o planejamento das políticas públicas governamentais, como, igualmente, um bom pano de fundo para os empreendedores econômicos e para a sociedade civil organizada.
   
        Próximos do fim da primeira década do ano 2000, muitas incertezas ainda continuam desafiando agora, agravadas pela crise do mercado hipotecário dos Estados Unidos, vistos até ontem como superpotência absoluta. Velhas crenças e até mesmo as novas, como a ilusão do neoliberalismo, saem do mapa pela porta dos fundos e de forma sorrateira.

        A descrença na globalização tradicional, como expressão de um fenômeno econômico baseado na financeirização dos mercados, é o traço mais característico dessa nova realidade. Uma nova globalização pós-neoliberalismo deverá nascer o mais rápido possível, cuja característica básica será sua maior diversificação. Entre Bretton Woods de 1944 e os EUA de 2008 muitas águas rolaram em todos os continentes e tudo indica que os barcos do capitalismo financeiro hegemônico não chegarão a nenhum porto seguro. A ordem econômica mundial navega em águas agitadas e ondas de crise estão cada vez mais fortes, ameaçando o desenvolvimento sustentável, o estado provedor social, a dívida pública interna e externa, e, sobretudo, a evolução do trabalho e do emprego.

        Quais então as perspectivas de desenvolvimento para países como o Brasil e estados como o Maranhão, em contextos como estes, marcados por fortes instabilidades e desequilíbrios sistêmicos e pela financeirização e globalização dos mercados?

        O momento presente evidencia que não há a menor possibilidade, nem no presente e nem no futuro, de que a economia real e a do trabalho sejam dispensáveis na nova ordem mundial que certamente nascerá da atual crise global. Em lúcidas ponderações, Boaventura Santos  afirma que não se trata de desglobalização. Segundo o autor, o que está em curso são mudanças na atual forma de globalização, cuja conseqüência principal deverá ser o surgimento de modificações na globalização dos movimentos sociais. Um contexto altamente favorável ao surgimento de uma nova centralidade para as questões nacionais e regionais, implicando em novos padrões de governança que, concretamente, fortalecerão os papéis do regional, do nacional, do estado, dos partidos políticos e nas políticas de alianças entre as nações, com vistas a uma nova cooperação e a um novo relacionamento internacional.

        As lições aprendidas recentemente, a partir dos cenários já evidenciados, deixam claro que a valorização social do desenvolvimento econômico endógeno, hoje e no futuro imediato, dependerá muito mais de seus conteúdos éticos do que ganhos infinitos de uma minoria nos mercados financeiros globais. Não bastará, nesta nova sociedade, que certamente virá, apenas a flutuação das bolsas e pregões ou mesmo o domínio de técnicas e métodos avançados, se o desenvolvimento não estiver referenciado na equidade social, sobretudo nos compromissos com o desenvolvimento humano e sua sustentabilidade.

        Definitivamente, a globalização atual não é ou será um fenômeno mundial perene, que se aplica a diferentes realidades, portanto algo inexorável, não restando aos países outras alternativas, a não ser se inserirem nessa nova ordem mundial hegemônica.

        Os últimos acontecimentos atestam que a globalização é, sobretudo um fenômeno econômico decorrente de um sistema de poder que interessa, sobretudo às grandes potências mundiais e seus aliados dos setores hegemônicos, as quais, confirmando tudo isso, saem agora em socorro dos bancos de investimento, das grandes sociedades hipotecárias e das maiores seguradoras do mercado mundial, com isso buscando evitar a quebradeira geral, que seria fulminante para desorganizar o referido sistema de poder.

        Nesse sentido, local e global não devem ser vistos mais como a mesma coisa, embora nunca tenha havido global sem local e vice-versa. Ou seja, há também um imenso mercado de trabalho para o país, em suas regiões geográficas, em seus estados federados e nos seus milhares de municípios. O que se precisa fazer é lutar para que o desenvolvimento econômico do país se faça de dentro para fora, para que não fique dependente das circunstâncias e dos fluxos externos de capitais. Nesse novo contexto em construção, o desenvolvimento endógeno regional e nacional assume assim posição determinante.

        A valorização do desenvolvimento econômico real decorrerá também da capacidade que se tiver de desenvolver nas comunidades as potencialidades do conhecimento, fazendo surgir novas oportunidades de emprego e geração de novas tecnologias que aproveitem o potencial de recursos naturais disponíveis. A existência é sempre criadora, mesmo quando parece repetir-se ciclicamente. Pensar o desenvolvimento como algo que dependa exclusivamente da inserção nos mercados globais impedirá de criar novas alternativas de superação do atraso.

        Deve-se, mais do que nunca, ter o otimismo como bandeira, sem deixar, contudo, de prestar atenção nos sinais mais evidentes do mundo real que apontam para a desesperança e para o fim das utopias.

        Como brasileiros e maranhenses é preciso manter o compromisso histórico de lutar pelo desenvolvimento sustentável e pela soberania do país e do estado natal. Para as novas gerações e para os menos jovens, o leque de desafios continua muito grande. Não é hora de desistir. É hora de continuar, é hora de insistir em favor de um país mais justo e desenvolvido e de um Maranhão que lhe siga os passos.


2 UMA CARTOGRAFIA PARA O PENSAMENTO INQUIETO


        Em menos de cinqüenta anos os brasileiros construíram a economia de uma nação que deixou de ser o 48o PIB do mundo, um país periférico no cenário internacional, que exportava pouco mais de 1 bilhão de dólares, onde o café representava 50% do total, passando a figurar, nos dias de hoje, entre as 10 maiores economias do mundo. Um país que atingiu médias de crescimento anuais em todo o século XX só superáveis pela China. Um país que produziu economistas geniais como Caio Prado Junior, Octávio Gouveia de Bulhões, Eugênio Gudin, Ignacio de Mourão Rangel, Celso Furtado, Mário Henrique Simonsen, Conceição Tavares, e tantos outros de grande valor.

        Mas ainda há um lado nebuloso, sombrio, que impede uma comemoração plena. Trata-se do Brasil das desigualdades sociais e regionais, da concentração de renda, do desemprego, das dívidas interna e externa, dos problemas energéticos, das altas taxas de juros, e muitos outros problemas que colocam o país em permanente posição de alerta interna e externamente.

        Nos últimos cinqüenta anos de construção do desenvolvimento brasileiro passou-se da crença geral que a solução dos problemas brasileiros dependia da industrialização e da modernização das forças produtivas para uma outra, que durou até recentemente, de um alentado desencanto com o futuro do país. Por tudo isso, o maior desafio dos brasileiros, para os próximos anos, é, indubitavelmente, contribuir para a concretização de uma economia nacional próspera e sustentável. É com essa perspectiva que o planejamento do desenvolvimento do Maranhão deve trabalhar.

        Não dá mais para aceitar que a história do Brasil e do Maranhão é uma história de constantes esperas, de constantes adiamentos. Muitos ainda acreditam que nunca o país completa aquilo que começa a fazer. Oscila-se muito entre utopias e distopias. Há algo nascendo todo dia nesta terra e ainda são bem poucos os que conseguem perceber. Para a maioria tudo parece imóvel e resistente ao tempo.

        Quais as novas rotas para a utopia, que, segundo a pedagogia freireana, se caracteriza mais pela capacidade de anúncio e de denúncia do de negação da realidade? Mais do que em qualquer fase da história é urgente começar a montar a cartografia para o encantamento e para a transformação da realidade. O IMESC vem assumindo esse compromisso inadiável e se esforça para contribuir concretamente. Um dos seus papéis mais significativos será propor cartografias para o pensamento inquieto.


3 O IMESC COMO COMUNIDADE AMPLIADA DE ESTUDOS E PESQUISAS


        No Brasil vive-se o calor de uma nova valorização das pesquisas e estudos socioeconômicos aplicados que, independentemente das vontades e desejos presumíveis, afetarão os velhos paradigmas e estimularão a produção de novos.

     É cada vez mais consensual entre os gestores que as instituições de pesquisa aplicada, sejam quais forem suas formas de organização, deverão desenvolver uma pesquisa de qualidade, associada à produção científica e tecnológica, bem como à manutenção de vínculos sólidos com a comunidade, expressos em ações que demonstrem responsabilidades sociais.

        O IMESC poderá ser uma das respostas a esse desafio. É um projeto em construção e, como tal, fatalmente passará por estágios de legitimação técnica, além da verificação de sustentabilidade institucional. O recurso mais importante a ser captado agora, para torná-lo viável é o sonho, o desejo, o encantamento. Outros recursos são também indispensáveis, como equipamentos e infra-estrutura física, cada vez mais apropriados ao seu desenvolvimento.

      A proposta inicial para o IMESC é que se institua como comunidade ampliada de pesquisa, uma modalidade de pesquisa-intervenção que busca a construção do conhecimento a partir das experiências concretas dos pesquisadores em seus ambientes de trabalho e contextos maiores. Para começar não se dependerá fortemente de recursos externos, só da riqueza existencial que cada um possui e guarda como tesouros valiosos.

        Desde o início do processo de recriação vêm sendo discutidas e aprovadas as idéias centrais, objetivos, estratégias, metodologias, etc.; em segundo lugar, oficinas de futuro vêm sendo realizadas, voltadas à construção de projetos coletivos, culminando com o desenho de espécies de árvores dos sonhos, para, em seguida identificar as “pedras no caminho”, aquelas que dificultam atingir desejos coletivos; em terceiro lugar, são mantidos diálogos sobre as razões e fundamentos dos problemas e dificuldades que fazem com que as pedras entrem nos sapatos ou maltratem os pés dos caminhantes, sendo uma viagem em busca de informações e conhecimentos que auxiliem a conhecer a realidade; em quarto e último lugar, vem a necessidade de elaborar a cartografia das ações a serem realizadas e sobre o que é necessário para poder realizá-las e concretizá-las.
 
    Os tópicos mapeados são trabalhados sob diferentes enfoques e metodologias. O primeiro passo é organizar seminários de estudos em que os temas mais prioritários são examinados coletivamente e como os mesmos são tratados na literatura nacional e internacional. São indispensáveis também realizar oficinas de escrita compartilhada, onde os pesquisadores e analistas exercitem suas autorias e co-autorias. Tudo isso poderá levar o IMESC a um processo que Célia Linhares denomina de “sistematização aprendente de saberes, conhecimentos e fazeres.”

       As primeiras experiências de comunidades ampliadas de pesquisa ocorreram na Itália, nos anos 1960 e 1970, envolvendo representantes do movimento sindical e grupos de profissionais que buscavam transformar ambientes de trabalho nocivos em ambientes saudáveis. As comunidades procuram assim articular os saberes acadêmicos, formais, científicos e os saberes informais, buscando ir além da simples separação entre ambos. Todos os atores se tornam co-autores da pesquisa, portadores de saberes específicos. Suas raízes teóricas estão nos italianos Antonio Gramsci e Ivar Oddone e, no Brasil, em autores como Célia Linhares, Maria Elisabeth Barros de Barros e Victor Vincent Valla.

        A metodologia não separa, portanto, sujeitos e objetos de pesquisa. Pierre Lévy conceitua o método como “ecologia cognitiva”, pois reconhece como portadores de história, sonhos e projetos tanto os seres humanos como as coisas que os cercam, formando o que Célia Linhares denomina de “um coletivo misto e impuro, depositário de formas ampliadas de comunicação e pensamento”. Exemplifica com os versos de Chico Buarque: “Morena de Angola/que tem um chocalho/amarrado na canela/ninguém sabe se é ela/que mexe com o chocalho/ou é o chocalho que mexe com ela”.

        A pesquisa-intervenção, por outro lado, visa desenvolver questões e problematizações que levem ao entendimento das situações presentes no ambiente e das maneiras de como superá-las. Como implica na formação de comunidades ampliadas de pesquisa, a ação de investigar, pesquisar não se restringe a técnicos especializados em ações isoladas. Implica, pois a necessidade da pluridisciplinaridade e na pluriprofissionalidade, além da autonomia coletiva dos participantes. No IMESC, a convivência intelectual entre pesquisadores experientes, especialistas, técnicos recém formados e estagiários transcorre de modo promissor.

        As comunidades poderão ser a contribuição inicial do Instituto à luta pelo resgate das utopias, numa hora em que o mercado tem poderes dilapidadores do sentido da existência humana e da vida em sociedade. Pode ser também a fonte de energias para que a Instituição cresça e cumpra o seu papel de fomentador de viveiros onde serão fertilizados conhecimentos úteis e necessários ao enfrentamento dos desafios ligados à conquista da sustentabilidade do desenvolvimento maranhense.


4 A RETOMADA DOS ESTUDOS CONJUNTURAIS


         O economista Felipe de Holanda, colaborador destacado do IMESC, um dos mais brilhantes profissionais da área, vinculado à Diretoria de Pesquisa, sob a direção primorosa e competente de Hiroshi Matsumoto, mestre de várias gerações de economistas maranhenses, contando com o apoio do técnico Dionatan Carvalho e colaboração de Tibério Martins, Sadick Nahuz, Wallison Ferreira Lima e Ana Theresa Boueres, reinauguraram  os estudos conjunturais no âmbito institucional, herdeiro que é o IMESC do antigo Instituto de Pesquisas Econômico-Sociais  Informática – IPEI.

          Há o reconhecimento na literatura de que o conceito de conjuntura nasce ao redor da metade do século XIX, quando os estudiosos da economia descobrem que as crises econômicas mantinham regularidade e periodicidade.

        Ao longo dos anos os estudos técnicos sobre a matéria evoluíram muito, reforçados pela era dos computadores e dos bancos de dados públicos e corporativos.

        O que se espera hoje do analista conjuntural é que, no mínimo, tenha o domínio da teoria e da metodologia pertinente a essa área do conhecimento. Embora se saiba que a análise de conjuntura, mesmo largamente praticada, ainda não tenha conseguido, pelo menos no Brasil, se instituir como um campo diferenciado e claramente reconhecido nos ambientes acadêmicos da Ciência Econômica, da Ciência Política e também da Sociologia.
 
        No âmbito da economia, por seu turno, desde o início do século XX, a análise conjuntural já começava a dar os primeiros passos. O marco emblemático dessa afirmação está no ano de 1917, quando é criado o Comitê de Pesquisa Econômica da Universidade de Harvard, e são divulgados os resultados do seu pioneiro e reconhecido "barômetro econômico".

        No caso brasileiro, a análise de conjuntura foi um instrumental muito utilizado no final da década de 70 do século passado, quando da reestruturação dos movimentos sociais, por ocasião da saída do regime ditatorial, instalado em 1964. São várias as instituições e organizações da sociedade e organizações não-governamentais que passam a desenvolver este tipo de atividade. Um dos mais atuantes foi o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Socioeconômicas), sob a liderança de Herbeth de Souza, o Betinho. A crise que se instalou na década de 90 reduz os trabalhos de análise conjuntural no país, vindo a se intensificar novamente a partir dos anos iniciais do corrente século XXI, sobretudo com a subida ao poder do governo Lula e a retomada do desenvolvimento econômico e social em novas bases.
 
        O que entender, afinal, por conjuntura? Uma das mais comuns definições é a que associa conjuntura a um recorte temporal de prazo curto. Surgem dificuldades: em que consiste o curto prazo em política, em economia e em sociologia? O primeiro esforço é ter clareza sobre qual a concepção de tempo com que se deve operar. O tempo dos ciclos econômicos, como nos estudos inaugurais da conjuntura econômica, ou o tempo cumulativo e ascendente de Marx ou Weber e suas teorias macro-históricas? Lembrando ainda dos tempos contemporâneos, mais operacionais, nos quais o trabalho do analista econômico consiste em, dadas certas hipóteses, antecipar o que vai acontecer com elementos focais da macroeconomia, como inflação, câmbio, juros, emprego, renda, entre tantos outros, em um determinado ponto temporal, apoiando a tomada de decisões de agentes públicos, empresariais e sociais.

        Algumas correntes também definem a análise de conjuntura como um estudo sobre as possibilidades que existem na realidade, não se resumindo apenas a um estudo “sobre” a realidade. Está claro que para fazer a interpretação sobre a dinâmica conjuntural, muitos fatores atuam ao mesmo tempo, a começar pela própria intencionalidade de transformar a realidade por parte dos analistas, o que pressupõe não ser possível captar os fenômenos explicativos da conjuntura sem a recorrência a instrumentais analíticos consistentes. Outro aspecto é que análise conjuntural implica uma visão de mundo, logo está associada a uma análise que passa também pela dimensão estrutural, tornando-se muito difícil construir a análise sem procurar as articulações e os nexos entre o institucional e o estrutural, dentro de uma perspectiva sintetizadora.
 
        A análise conjuntural implica, portanto em várias escalas: pode ir dos domínios do poder local e atingir o estadual, o regional, o nacional e o internacional. Isso é importante porque quanto maior a escala de tempo escolhida, maior a dificuldade de análise dos fatos e acontecimentos.
 
        Além do mais, os estudos e análises conjunturais articulam o hoje, o ontem e o amanhã com a intenção de abrir a projeção de cenários esperados e possíveis. A capacidade intuitiva e a criatividade do analista conjuntural contam muito, portanto. Sem uma análise que abra novas projeções sobre a realidade, perde-se o valor político para a práxis.
 
        Vê-se, assim, que o trabalho do analista envolve atividades relacionadas à análise de conjuntura e à construção de cenários prospectivos. Para tanto, exige preparo profissional para interpretar e formular diagnósticos sobre a situação conjuntural, bem como para a elaboração de análises prospectivas e aplicação às estratégias de desenvolvimento das políticas públicas, empresariais e societais.

        É também quase impossível elaborar estudos e análises sobre a conjuntura, onde se inclui a dimensão econômica, sem levar em consideração a questão política, requerendo dos analistas uma base mínima, conceitual e teórica, conjugada a uma experiência, ainda que mínima, em análise de conjuntura e cenarização. Sem esquecer os instrumentais básicos, vinculados aos fundamentos teóricos, metodológicos e conhecimento institucional, sem os quais o profissional da área terá muita dificuldade para identificar as variáveis e informações relevantes, lado a lado com a prática de utilização destas informações.

                Para o bom desempenho do seu trabalho, especialmente aqueles que fazem a análise da conjuntura econômica, devem aperfeiçoar-se sobretudo nos seguintes campos de estudo:

a)     Nos fundamentos macroeconômicos para a análise conjuntural, com o objetivo de conhecer os elementos de teoria macroeconômica que permitem: a) compreender a dinâmica cíclica de economias de mercado, a ação da política econômica e o funcionamento do sistema financeiro; b) nos instrumentos teóricos necessários para a definição de métodos de previsão de curto, médio e longo prazo;

b)     na análise de conjuntura econômica brasileira (e maranhense, em especial ), procurando relacionar os fundamentos estruturantes da realidade econômica com a dinâmica das decisões tomadas nos vários contextos, sempre procurando identificar as repercussões e impactos na sociedade e na economia sob análise;

c)     na análise da conjuntura econômica internacional, objetivando conhecer o quadro geral das principais instituições e regras que regem as relações econômicas internacionais, bem como os atores e variáveis determinantes a serem acompanhados para se ter condições de entender o movimento atual e as tendências da economia mundial;

d)     em métodos e práticas de construção de cenários macroeconômicos, com a finalidade de introduzir as principais técnicas de análise prospectiva e suas aplicações à construção de cenários macroeconômicos, com ênfase central na  integração entre a ferramenta de cenarização e a elaboração de modelos econômicos. Vindo em seguida a apresentação das relações entre a geração de visões qualitativas sobre o futuro - a partir das quais são fixadas as variáveis exógenas – e sua aplicação a modelos de consistência macroeconômica;

e)     em métodos quantitativos com o objetivo de conhecer os principais conceitos estatísticos relacionados a  compreensão e a crítica de fatos conjunturais de natureza econômica. Seu foco será voltado para a construção e interpretação de indicadores econômicos e a análise de séries econômicas. Realce especial deverá ser dado ao emprego de matrizes de insumo-produto para a realização de simulações.

      Dois outros campos de investigação são importantes para o desenvolvimento dos estudos conjunturais. O primeiro está ligado ao conhecimento e estudo das estratégias corporativas empresariais, no qual foca-se a questão da estratégia empresarial desde uma perspectiva associada à gestão das organizações, buscando apresentar abordagens contemporâneas de análise e de gerência estratégicas.

        O segundo campo é o associado à análise da conjuntura política, como já destacado anteriormente, com o objetivo de focar alguns conceitos e informações que contribuam para a incorporação da dimensão política na análise da conjuntura. É quando são examinados aspectos que, embora não tratados especificamente no âmbito da economia, interferem sobre as decisões de política econômica e sobre os próprios rumos dessas atividades.

        Além dos aspectos mais teóricos e metodológicos vistos anteriormente, outros de natureza mais organizativa devem ser considerados para o desenvolvimento da área de análise conjuntural. A começar pela necessidade de um marco teórico, como também já referido, ou seja, de um campo de conhecimento abordando teorias sobre a sociedade, sobre a história e a política, por exemplo. Conhecimentos sobre a formação social, cultural e político econômica do Brasil (e do Maranhão) e a história de luta dos movimentos sociais são indispensáveis.

        Outra providência a considerar, na linha da organização da área de estudos conjunturais é a que se refere à informação. A análise de conjuntura depende de um grau avançado de informações sobre vários campos da realidade. Neste sentido, é importante se ter fontes de informação, sobre pessoas, dados, fatos e contextos.

        Nunca perder a preocupação com a definição de escalas de tempo e espaço nas análises conjunturais, como já tratado também anteriormente. O corte temporal pode variar do marco zero ao infinito. O problema é que, quanto maiores as escalas de tempo e espaço, mais complexas tornam-se as análises.

        O analista da conjuntura econômica, embora focado apenas em uma dimensão do fenômeno, não pode perder a noção da totalidade. Além de não perder essa referência maior, a análise da conjuntura será sempre processual. O fenômeno analisado se insere em um contexto mais amplo e o seu movimento obedece a um determinado ritmo processual.

        Pelo que se viu, de modo muito sintético, a análise conjuntural é uma análise de fatos e acontecimentos. Há um cenário no qual os acontecimentos se processam. Decorre daí a importância de qualificar os cenários em um tempo e espaço. Desde simples espaços de rua a outros mais complexos, como os espaços e tempos institucionais.

        Espaços fechados ou abertos, de elite ou de massa, ativos ou passivos. Atuam também atores individuais e coletivos. Os principais atores serão sempre os coletivos, os grupais, e outros. Sem deixar de reconhecer que existem atores individuais que têm ou poderão ter importância histórica. Não esquecer jamais a análise da relação de força – qual força tem esses atores numa perspectiva mais política? Que capacidade operativa possui a sociedade para desenvolver determinadas ações, com poder de modificar a relação de forças dominante?

        Por fim é preciso construir a síntese – requer clarividência, conhecimento e experiência no sentido de articular uma visão de estrutura com a conjuntura. A práxis política se baseia na capacidade de antecipação, não esquecer disso.


5 ANÁLISE CONJUNTURAL E CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DESMISTIFICADOR


        O objetivo maior de áreas de estudos conjunturais em institutos de pesquisas socioeconômicas aplicadas, vinculados ao planejamento do desenvolvimento é contribuir para a construção de conhecimentos sobre a realidade na qual atuam, dentro de uma perspectiva de aplicabilidade às políticas públicas.

        Além disso, em lugares como o Maranhão, nos quais ideologias e dogmas possuem muita força, produzir conhecimentos mais consistentes e apoiados em bases científicas, assume um papel relevante e estratégico.

        Foi dentro desse prisma que o IMESC foi gestado por seus idealizadores e fundadores: um lugar especial, com idoneidade ética para herdar o legado de seus institutos antecessores (IPEI, Fipes e IPES) e com capacidade intelectual suficiente para passar a limpo a formação social maranhense, despindo-a dos mitos e assombrações.

        Não será obra que se concretizará em pouco tempo. A pauta a ser enfrentada é das mais complexas, pois suas raízes mais profundas estão sob pedras que se misturam nos labirintos escuros de mentalidades extraviadas no tempo. Mas não é impossível encontrar a rota que levará à saída dessas cavernas sombrias. As duas grandes universidades públicas do Maranhão – UFMA e UEMA – apesar das dificuldades, nunca deixaram de trabalhar e contribuir nessa missão heróica. Não há como desconhecer que a produção intelectual mais expressiva sobre o Maranhão passou sempre por seus departamentos acadêmicos e por seus pesquisadores e estudiosos de um modo geral.

        Assim como, desde quando começou a atuar, mais precisamente nos primeiros anos da década de 70 do século passado, o complexo IPEI/FIPES/IPES foi responsável por uma das mais relevantes produções sobre os problemas e desafios do desenvolvimento maranhense, produção esta que se manteve viva até meados dos anos 80 do referido século, quando se inicia a derrocada do aludido complexo institucional, fazendo com que sua produção entrasse em franco declínio.

        Os tempos são outros. Todos amadureceram: a própria viagem e os viajantes. O Maranhão não tem mais o rosto que tinha há 50 anos atrás e aqueles que naquela época mal sabiam caminhar, hoje já têm pernas gastas e mãos calejadas de tantas idas e vindas em jornadas incessantes vida à fora.

        A lição maior aprendida nesse balançar sem fim do relógio do tempo impassível é fazer com que a criação do IMESC, a sua missão cívica e o seu compromisso político-institucional, se materializem para a consecução do objetivo comum de transformar os estudos conjunturais em instrumentos capazes de colaborar para a modernização e democratização desse Estado, no bojo das quais novas interpretações, plenas de veracidade e criatividade, desconstruam os mitos e assombrações e o Maranhão possa, finalmente e definitivamente,  ingressar no século XXI.

        Para isso é preciso mente inquieta e coração de estudante. Um dos maiores desafios para a análise da conjuntura maranhense é compreender as inter-relações das partes com o todo. O que só será possível de obter se houver um mapa que possibilite viajar na realidade circundante e nas outras mais distantes e muito mais impenetráveis.

        O caminhante precisa ser metódico. Jamais deverá se deixar fascinar pelo reducionismo maniqueísta e muito menos pelo dualismo simplista, ou ainda, se apaixonar pelos trejeitos da ideologia da decadência maranhense, tão poderosa que foi capaz de enlaçar inúmeras gerações de conterrâneos.

        Na mesma direção, não se tornar prisioneiro de análises simplistas, aparentemente mais fáceis de fazer e até mesmo de convencer, mas muito difíceis de merecer atenção nos círculos mais exigentes ligados à produção do conhecimento. O simplismo não consegue captar a essencialidade dos fenômenos sob foco, sejam eles econômicos, sociais ou políticos.

        O resumo de tudo, é que análise de conjuntura é muito mais análise de conjunto do que uma análise de corte temporal curto. É sobretudo a intensidade e profundidade do olhar sobre o conjunto do que a preocupação com a perspectiva temporal da análise, que sempre será importante, mas jamais será o essencial.


        O engenho e a arte do analista da conjuntura se manifesta toda vez em que for capaz de reger, de forma harmônica, um grande número de variáveis econômicas, sociais ou políticas, que se encontram em relações complexas e múltiplas, produzindo uma peça consistente de argumentos capazes de explicar o comportamento dinâmico dos fenômenos sob investigação. Quando isso acontece os mitos e as assombrações não farão mais sentido e desaparecerão no horizonte que se vai abrindo. E uma nova melodia inquietará os espíritos, estimulando-os a prosseguir, sempre.

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