EDUCAÇÃO É UM ECOSSISTEMA CULTURAL
NANOTESES
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Por Raimundo Palhano
Embora muitos saibam que a responsabilidade com o
desenvolvimento da educação na sociedade brasileira cabe a três segmentos
sociais estratégicos, no caso o governo, a escola e a família, volta e meia
estão culpando os governos pelo fracasso educacional e deixando incólumes os
outros corresponsáveis pelo processo.
Não é que estejamos atenuando ou mesmo eximindo e retirando as
responsabilidades e o peso do poder público com a efetividade das políticas
públicas educacionais. Começamos desse modo porque entendemos que ajuda a
compreender melhor que a educação é um ecossistema cultural intimamente ligado
com o desempenho dos governantes, dos educadores e, seguramente, com a atuação
dos pais ou responsáveis familiares.
Não se trata de frase pronta ou a recorrência a um senso
comum, que muitos entendidos verbalizam à exaustão. Trata-se de uma assertiva
que tem a ver, inexoravelmente, com uma estratégia pedagógica que possui
altíssimo grau de comprovação e eficiência operacional. Basta ver o resultado
em muitos países de educação desenvolvida, em que a base de tudo está no
aprofundamento das ligações orgânicas entre os três pilares acima referidos e dentro
de cada um deles, em especial.
Fugindo do eminentemente retórico, no Brasil e nos estados de
um modo geral, ainda não conseguimos integrar e harmonizar os vínculos que
enlaçariam a tríade pedagógica aludida, em um sentido único, pela assimilação da
ideia de que a educação é para a vida, fundamental para romper o estado de fracasso
que impera no país, em favor do emergir de um desejado estágio de aprendência,
sobretudo na educação básica e, mais ainda, na educação básica municipal.
Com efeito, a qualidade da educação depende de pelo menos
dois outros fatores: recursos financeiros e infraestrutura física e material.
Além da tríade descrita acima, esses outros componentes são insubstituíveis.
O principal problema não é disponibilidade de finanças. É
importante elevar o percentual de investimento em educação comparativamente ao
tamanho do PIB. Se, no entanto, o montante de dinheiro não for aplicado no
lugar certo, o maior volume de moeda só interessa às corporações mercantis que “cercam”
as verbas da educação e que, em geral, ficam com boa parte dos recursos
disponíveis. Defendemos que se reveja o modelo do Fundeb. A pulverização de
recursos é uma faca de dois gumes. Se o município for fraco e o sistema de
educação incapacitado, as corporações mercantis partem para controlar o Fundo,
que em muitos lugares e maior que o FPM e se encontram “privatizados”.
Creio que o maior desafio é instituir um sistema de educação
em que governos, escolas e famílias assumam papéis corretos e concretos no
planejamento e gestão da educação das crianças e jovens do Brasil inteiro. Para
isso acontecer, a desigualdade social representa uma ameaça poderosa.
É
essencial substituir a atual governança, em que o governo determina e domina de
forma vertical, por uma outra, horizontal, em que os três componentes
estratégicos do processo educacional desenvolvam competências para elevar a
qualidade educacional.
A
escola tem um papel primordial. É o lugar no qual se constrói a educação
formal, culta, técnica e versátil, capaz de promover competências e cidadanias.
A família é a comunidade de afetos, de respeito aos legados individuais e
familiais, o espaço das heranças históricas, de convivência pessoal e
fortalecimento de vínculos humanos.
O
que se vê hoje é um profundo despreparo das famílias, tanto das ancestrais,
como das provenientes das novas gerações, em geral extremamente incapacitadas
para o trabalho educacional dos filhos e filhas.
A influência do domínio vertical de muitos governos leva o
poder público a investir em projetos puramente midiáticos, sem a menor
capacidade de mudar a estrutura educacional vigente. Chegará um tempo em que
será proibido fazer propaganda de políticas públicas de estado, sob pena de
responsabilidade penal para que fizer propaganda enganosa.
Por outro lado, escolas faz-de-conta são muitas nesse mundo
afora e no Brasil horrorizam. Verdadeiros depósitos de crianças, esses são
lugares em que se oficializa o desperdício e se queimam dinheiros à vista de
todos. Escola é um mix envolvendo infraestrutura e projeto pedagógico. Um ou
outro sozinhos também não dão conta do problema. Não esquecer que educação é
sistema.
Síntese de tudo: a horizontalização na produção, circulação e
distribuição dos atributos e conteúdos educacionais, construídos e
desenvolvidos numa perspectiva ecossistêmica e cultural, é que, em última
análise, fornecerão as bases materiais e culturais para a superação das
estruturas educacionais atrasadas que inviabilizam o Brasil como uma
civilização bem sucedida no mundo, abrindo caminhos efetivos para o fim das
desigualdades sociais, as quais, até agora, permanecem invencíveis.
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