sábado, 3 de setembro de 2016

MARANHÃO E O LABIRINTO DO MUNDO



Por Raimundo Palhano


Extraio em Comenius, educador checo (1592-1670), a inspiração para o título deste comentário, a respeito do lançamento do livro intitulado MARANHÃO: ENIGMAS, DESAFIOS E URGÊNCIAS, integrante da linha editorial do Instituto Jackson Lago – IJL, fruto de parceria técnica entre aquele Instituto e a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação – SECTI, onde também se inclui na programação da bem-vinda Biblioteca Básica Maranhense, que se propõe a abrir caminhos para novas interpretações sobre o Maranhão e o seu desenvolvimento.

Na condição de um dos participantes do coletivo de elaboradores do livro, deixo aqui o meu reconhecimento pelos papéis decisivos que tiveram na sua  materialização a senhora Clay Lago, brava e determinada continuadora da obra do marido Jackson Lago, como presidente do Instituto que preserva a memória do ex-governador; e Jhonatan Almada, Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação do governo Flávio Dino, talentoso e competente profissional que, cada vez mais, se consolida como um dos melhores quadros representativos de uma nova geração de intelectuais e gestores públicos deste Estado.

À parte uma referência especial, completamente insuficiente em seu propósito, ao Prefácio de Rossini Corrêa, escritor, poeta, ensaísta, filósofo, jurista e ativista cultural, com toda certeza uma viga extremamente sólida a dar sustentação ao conteúdo do livro, pois emanada de um dos maiores que a cultura maranhense foi possível de produzir em todos os tempos.

“O Labirinto do Mundo e o Paraiso do Coração” é inspirador. Foi escrito em 1623, por Jan Amos Comenius satirizando, de forma magistral, a organização social da época.

Uma das suas conclusões mais duras sobre a condição humana neste mundo é quando demonstra que tudo que está debaixo do Sol se resume a vaidade e insatisfação.

A inspiração em Comenius se deve a dois eixos simbólicos, presentes em sua obra clássica: o labirinto e a viagem. No primeiro caso é o entrecruzamento de caminhos na busca do que deveria ser a centralidade da existência humana, que aplicamos ao caso maranhense, questão presente na história passada e na mais recente do Maranhão.

Quanto à viagem é simbolizada pelo desejo de mudar os descaminhos dos seres humanos, que transpostos para a realidade maranhense, exprimem os imperativos capazes de colocar o Maranhão do avesso, no afã de decifrar um enigma que até hoje não foi completamente compreendido.
  
A viagem é assim o esforço que se faz, em resgatando os sonhos do governo Jackson Lago, vítima da ira do mal, no sentido de confrontá-los às circunstâncias do momento atual da sociedade maranhense, como tentativa de retirar as vendas que turvam as possibilidades do desenvolvimento humano neste torrão.

Com essas duas imagens, Comenius entendia que, para viajar pelo labirinto escuro e não se deixar perder pelas múltiplas veredas e infindáveis desvios, só faria sentido se fosse para atingir a unidade essencial do ser humano, não por simples contemplação e fruição, mas para transformá-lo em um novo ser.

O mais importante de tudo, quando se viaja, segundo o educador checo, são os dois guias fundamentais ao viajante: a curiosidade, que descobre tudo que é oculto; e a opinião, que ensina a compreender as coisas segundo os costumes vigentes.

Foi este o roteiro metodológico e espiritual que me guiou na viagem que fiz, sem deixar de reconhecer os limites do meu fôlego pessoal, desfrutando da companhia sensível, competente e extremamente agradável de Jhonatan Almada, Aziz Santos, Léo Costa e Rossini Corrêa, combinação preciosa de gerações profundamente comprometidas com a política e a cultura do Maranhão, artífices e tecelões de uma nova memória interpretativa sobre a formação social maranhense, disposta ao diálogo firme e respeitoso com os panteões hegemônicos.  

Aziz Santos, responsável pela abordagem presente no capítulo dos Enigmas, argumenta enfaticamente que o conteúdo temático tratado por ele deixa claro que “é urgente revelar os avessos do padrão de desenvolvimento dominante, enfrentar a razão patrimonialista e, sobretudo, produzir uma cosmovisão que coloque o povo como principal beneficiário do crescimento econômico”.

Para o ex-Secretário de Planejamento e Gestão do governo Lago “é inadiável construir estratégias consistentes e capazes de fortalecer e dinamizar as economias locais e territoriais, como alternativas à superação do modelo histórico, que pouco dialoga e quase nada internaliza em termos macroeconômicos”. E conclui: “...espero demonstrar que é preciso superar radicalmente a visão mítica e enigmática a respeito do Maranhão e do seu desenvolvimento sustentável, escapando de uma vez por todas das armadilhas montadas pelas explicações oriundas dos grupos políticos e econômicos dominantes”.

Coube a Jhonatan Almada, o muito mais novo dentre os memorialistas, o desafio de abordar as Urgências maranhenses. O futuro que precisa nascer das urgências do presente. Passo-lhe a palavra para que fale:

“Sem dúvidas, boa parte do profissional em que me constituí, se erigiu dessa experiência e passagem pelo Governo Jackson. Enxugamos as lágrimas, recolhemos as lembranças, guardamos os sonhos e partimos. ...O mais relevante é que muitos daqueles sonhos guardados estão sendo postos à prova no atual Governo, testados e reconstruídos à luz das conjunturas e estruturas herdadas. Nada do que foi será de novo, tenho plena clareza disso. ...O fundamental é sabermos as lições aprendidas e derivadas daquela experiência, pondo-as altas e visíveis como mapas norteadores do agir. Considero como central a percepção de que as gerações no governo são diferentes, o programa de governo é diferente, mas o sonhar por um Maranhão justo e desenvolvido é o mesmo”. 

Como o autor destaca na apresentação do seu capítulo, a linha mestra que presidiu a sua interpretação foi compor análise que pontuasse de forma mais precisa possível, quais são as urgências do Maranhão em termos de um projeto amplo de desenvolvimento.

O sociólogo Léo Costa fecha as cortinas do livro deixando o perfume estimulante de sua sabedoria acumulada como político, dirigente municipal, Prefeito de Barreirinhas por dois mandatos, intelectual criativo e estrategista singular. Coube a ele tratar das prioridades para o desenvolvimento do Maranhão, tendo como pano de fundo sua participação ativa na construção da visão estratégica do governo Jackson Lago. Assim se expressa no capítulo final do livro:

“Abordo a regionalização, o princípio da subsidiariedade, o Fundo Maranhense de Combate à Pobreza (FUMACOP) e o projeto Águas Perenes, marcas indeléveis e distintivas do projeto do governo Jackson para o Maranhão, alicerçado no desenvolvimento, na inclusão social e na prosperidade para todos. Além disso, proponho a municipalização da agricultura como um dos eixos fundamentais de um projeto para o Maranhão, trazendo o campo e os campesinos para o centro das preocupações e das ações do Estado, em articulação com os municípios”.

Deixei por última a parte que me cabe no livro, no caso os Desafios ao desenvolvimento estadual. Escolhi dez desafios, que estão longe de esgotar a questão. A razão deriva do fato de terem sido, direta ou indiretamente, aqueles mais presentes na esfera do planejamento do desenvolvimento e nas políticas públicas a cargo do governo Lago.

É um texto que mescla, propositalmente, materialidades dos estudos técnicos, do planejamento público e da gestão, com as subjetividades derivadas dos sonhos presentes durante o período de governo, que durou pouco mais de dois anos de vida.

Estão presentes análises sobre os desafios de como colocar em prática princípios como o espírito republicano e o desenvolvimento humano efetivo; de como construir um novo modo de governar, em contextos fortemente marcados pelo poder das oligarquias; o desafio de implementar uma política de desenvolvimento socioeconômica baseada na descentralização do governo; a questão de como promover o desenvolvimento local em uma ordem internacional globalizada; o desafio de implementar e garantir a sustentabilidade do desenvolvimento; a capacidade de produzir e gerir a coisa pública; o desfio de despertar mentes quietas, acostumadas a vida toda a apenas obedecer; a cidadania restringida, consequência de um espaço público reservado aos privilégios; a reinvenção da educação pública, a partir dos sistemas municipais de ensino marcados por limitações estruturais profundas; e por último, o desafio de preservar o legado de Jackson Lago como patrimônio da política maranhense e do Brasil, sobretudo em razão das investidas das forças políticas tradicionais que sempre pretenderam apagá-la, pela destruição da reputação do Patrono.

Encerro este depoimento muito feliz com a possibilidade deste trabalho chegar ao conhecimento da juventude e das novas gerações de políticos e dirigentes sociais. Aqui está o registro impresso de uma das mais relevantes experiências de gestão pública neste Estado, sob o comando de um dos maiores e mais dignos políticos da História do Maranhão.

Jackson Lago foi o passe livre que permitiu aos resistentes, sobreviventes e inconformados se reunirem para formular projetos e utopias que poderiam tirar o Maranhão do labirinto sombrio e fazer pulsar o paraíso dos corações.  

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